Capítulo 15

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Eram 23:19 quando acordei, a confusão mental ainda se fazia presente, entretanto, em baixa escala. O clima gélido fez-me despertar e com ele, as lembranças dos últimos dias e horas foram retomadas. Eu queria entender e até aceitar os motivos que levaram Arthur a me tratar com tanto desdém, atitudes misantropas não combinavam nada com ele, exceto em sua vida profissional.

A Ventania lá fora estava intensa, o tecido sarja da cortina balanceava conforme o vento forte, ao mesmo tempo em que a janela envidraçada chacoalhava, posto que a persiana estava semiaberta. Hipotermia? Nessa altura do campeonato seria uma forma nada inteligente de morrer, seria constrangedor carregar na certidão de óbito que a causa do meu falecimento foi excesso de preguiça. Caminhei em direção a sacada e em uma reação rápida, lancei-me para longe dela, a tempo de sair do quarto.

Havia alguém lá.

Minhas pernas tremiam, meu coração pulsava em taquicardia e os meus pulmões pareciam incapazes de realizar o seu trabalho corretamente, uma vez que o susto foi tão grande que acabei deixando meu celular para trás. Na tentativa de evitar um alarde, corri para o quarto da minha mãe e me tranquei. Com as mãos trêmulas e ainda ofegante, disquei os nove dígitos do único número que me veio à cabeça

— Atende, por favor, atende! – Murmurei impaciente, agitada.

— Sim?

— Arthur, sou eu, Alana! – Sussurrei baixinho, com a voz embargada. — Arthur, tem alguém na minha varanda, vem pra cá, por favor!

— Alana, você tomou altas doses de anticonvulsivantes e precisa descansar, cadê o seu irmão?

— Eu sei o que eu vi, tem alguém aqui! Meu irmão deve estar dormindo, estou trancada no quarto dos meus pais, estou usando o telefone deles. Por favor, Arthur. Estou com medo! – Supliquei com os olhos marejados em lágrimas, que por sorte ele não os veriam.

— Certo, invasores dependem da escuridão para agir! Preciso que você seja corajosa e saia do quarto, ilumine toda a área externa de sua casa e acenda todas as luzes. Não abra a porta para ninguém, até eu chegar.

Arthur parecia saber o que fazer, então segui suas orientações. A sensação de ter alguém à espreita era angustiante, mas eu precisava ir até o quadro de luz que ficava na cozinha. Uma onda de encorajamento atravessou meu corpo quando precisei convencer a mim mesma que tudo daria certo. Destravei a maçaneta, disparei em sentido às escadas com cautela para não tropeçar nos degraus e fui até a instalação elétrica.

O interior da casa estava escuro, as luzes estavam apagadas e somente a área externa foi iluminada, assim como o recomendado. A casa estava em silêncio absoluto, tanto que consegui ouvir o barulho de um galho ao quebrar-se do lado de fora. Voltei novamente ao quarto dos meus pais e fiquei lá até a chegada do único homem que seria capaz de me ajudar naquele momento, por mais que me evitasse.

Num barulho desconcertante o telefone tocou, como eu não queria que meu irmão acordasse, atendi na primeira chamada:

— Não adianta correr para o quarto da mamãe, não quando ela não está em casa! – Coloquei o telefone de volta em sua base e involuntariamente levei as mãos até a boca, na finalidade de abafar o breve grunhido de choro, que unido as lágrimas, inundavam toda a minha face.

Longos minutos se passaram, quando escutei ruídos que partiam do hall de entrada. Olhei de esguelha pela janela e vi que o carro do Arthur estava estacionado, ele vinha escorado pelas paredes, a procura de qualquer movimento estranho, estava armado.

Desci mais uma vez e abri a porta sem pensar em qualquer outra consequência. Ele gesticulou para que eu me afastasse e adentrou. Os nós em seus dedos estavam brancos, provavelmente por causa da pressão aplicada. Arthur verificou cada cômodo do piso inferior, mas não encontrou nada. Em sua mão direita ele sustentava uma pistola e na esquerda, uma lanterna.

— Onde fica o seu quarto?

— Porta branca no final do corredor, lá em cima! – Ele deixou a lanterna de lado e empunhou a arma com as duas mãos, mantendo seus polegares dianteiros na pistola e o indicador, no gatilho. Caminhando vagarosamente, ele foi até meu quarto, olhou para mim e em uma ação precisa, abriu a porta.

Direcionando para o nada, Arthur palmeou a parede até encontrar o interruptor, o cômodo estava vazio.

— Calma, não foi nada, não foi nada.. – Ele tentou me tranquilizar.

— Tinha alguém aqui, alguém estava me vigiando! – Enterrei meu rosto em seu peito e chorei como jamais havia chorado antes. Maldita hora que eu aceitei fazer aquele assaltado, maldita hora que eu descobri sobre os erros do Eric.

Estava abraçada a ele quando meu irmão apareceu, usando meias e pijama.

— O que aconteceu aqui? – Perguntou confuso ao se deparar com aquela cena.

Arthur vestia uma calça de moletom preta e uma blusa branca sem estampas, nos pés ele calçava um tênis esportivo e mesmo abraçado a mim, ainda sustentava a arma em uma de suas mãos.

— Alguém esteve aqui. – Explicou — Sua irmã me ligou chorando e eu vim o mais rápido que eu pude.

— E por que você não me acordou? Mas que merda! É sempre assim, eu sou sempre o último a saber das coisas! – Disparou enfurecido.

Conhecendo bem o meu irmão, sei que ele tentaria confrontar quem é que estivesse aqui e eu jamais me perdoaria se algo acontecesse a ele.

***

Os ânimos se acalmaram, Eduardo voltou para o seu quarto e depois de um chá, consegui voltar para cama. Pedi a Arthur que passasse a noite comigo.

— Tem espaço aqui pra você.. – Passei a mão no colchão indicando o local, contudo, ele rejeitou.

Tudo bem que uma pessoa desconhecida se passou pela minha amiga e o insultou em sua página do Facebook, apontando que ele fosse um pedófilo ou algo parecido. Ele continuou sentado na poltrona ao lado da minha cama e deitada, o fitei.

— Você não vai me contar o que está acontecendo? – Com a postura relaxada, ele inclinou o corpo para frente.

— Já imaginou cometer um erro tão grande e não conseguir consertá-lo? – Sorri em exaustão. — Se eu te contar será apenas mais um e além de perder o namorado e amigas, perderei você também.

— Não se pode perder aquilo que não tem.

— Esse é o problema! – Passei a mão em torno do pescoço e desprendi a gargantilha que ele havia me presenteado. — Eu nunca tenho nada! – Estendi a jóia para que ele a pegasse de volta, mas ele não o fez. — Será que eu sou tão desprezível assim, que nem você me quer mais?

— Alana, nada em você é esquisito, não consegue enxergar o quão única você é? Não posso te obrigar a falar a verdade, mas também não posso ficar com alguém que age pelas minhas costas e quando a corda arrebenta, pensa em mim apenas como um escape.

— Se você tiver um pouco mais de paciência, eu te prometo que um dia eu conto toda a verdade, mas esse dia não pode ser hoje.

— E como eu vou saber que não está inventando?

— Eu nunca mentiria pra você, até porque as pessoas dizem que eu não sei mentir, o que não é uma coisa tão ruim.

— Me conte uma mentira! – Num sorriso contundente, ele fez o pedido.

— Eu não gosto de você!

                                        *

Cyberstalking - Além do que se vêDonde viven las historias. Descúbrelo ahora