Capítulo 28

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Como imaginado, Manuela e eu tivemos que prestar depoimento ainda no hospital. A namorada do meu irmão ocupava a antiga sala de radiologia do prédio, que foi cedida e designada para a equipe policial, enquanto eu aguardava a minha vez. Minha consciência e percepção de realidade foram voltando aos poucos, eu não conseguia entender como uma pessoa podia ser tão oportunista assim. Sentada no chão frio ao lado de fora da sala de emergência, eu esperava pelo boletim médico. Eu diria que só, se não estivesse acompanhada por dois agentes. Levantei e fui até um deles, que conversava com o vigilante do andar.

— Moço, eu sei que todos estão agindo como se eu não existisse e até criando teorias absurdas sobre o que realmente aconteceu, mas eu preciso saber da minha amiga! – Não pude conter as lágrimas, desabei. — Por favor, eu estou implorando! – O policial alegou não poder fazer nada a respeito e em seguida, voltou a me ignorar. O clima ali estava completamente desfavorável, me julgavam como uma das responsáveis pelo acontecido, afinal, ninguém espera abrir a porta de casa e levar um tiro. Voltei ao buraco da minha insignificância e retornei à estaca zero, toda aquela sensação de desespero me invadiu outra vez. 

— Maldita, sua maldita!!! – Senti me puxarem bruscamente por trás, pelos cabelos e só depois do espanto, fui capaz de reconhecer a dona da voz. — Cadê a minha filha, para onde levaram a minha menina!!!! – Fernanda estava completamente fora de controle. Mesmo tentando me afastar, a mãe de Laura me segurava pela camiseta e desferia tapas e arranhões contra mim, eu nunca tinha apanhando assim de alguém. — Você é cruel, uma criança desalmada! Eu falei tanto pra ela se afastar de você, tanto! – A mulher caiu de joelhos no chão, aos prantos. Conhecida por sempre ter uma resposta na ponta da língua, naquele momento eu não soube o que dizer. Quando pensei em falar algo que pudesse amenizar a situação, minha mãe atravessou o corredor do hospital e correu ao meu encontro. 

— Mãe, Mãe! – Foi impossível não me sentir culpada, principalmente por saber que Fernanda corria o risco de nunca mais receber um abraço de sua filha. — Eu não fiz nada, mãe. Eu juro!!!! – Meu pai e Eduardo vieram em seguida e pela primeira vez, me senti em família. Me desvinculei de seu abraço e vesti o blazer que meu irmão entregou a mim, tendo em vista que minhas roupas estavam cobertas de sangue. Quando perguntou por Manuela, não foi preciso esperar por uma resposta minha. Conduzida por policiais, ela saiu do compartimento e logo após, anunciaram que seria a minha vez de apresentar a versão dos fatos. Mantive o silêncio durante o percurso e quase sempre recebia olhares. Pacientes e até mesmo funcionários cochichavam, me fitavam com pesar e outros, com hostilidade.

A antiga sala de radiologia dispunha de materiais velhos e aparelhos radiológicos, que com certeza não deveriam estar ali. A mesa que deduzi ser do profissional da área foi colocada no centro da dependência, e ao seu redor, cadeiras. As paredes do local eram beges, levemente café com leite.

— Alana! Eu quase não acreditei quando me informaram que tratava-se de você! – Dando espaço a um novo sentimento, um rubor me subiu ao rosto. — Lembro que da última vez que estivemos juntos no mesmo ambiente a situação foi um pouco, deixe-me ver… – Coçou o queixo. — Adversa! 

— Adversa? O senhor me insultou e me chamou de idiota na frente de pessoas que eu nunca tinha visto na vida! – O homem encarregado de apurar os depoimentos era ninguém mais, ninguém menos que o superior de Arthur, o babaca que eu tive o desprazer de conhecer na delegacia. 

— Queira me desculpar, mas você estava estragando o meu evento! – O velho era um desgraçado, o que explicava o motivo de ninguém gostar dele. — Eu até fiquei com peso na consciência e isso raramente acontece! – Puxou uma cadeira para que eu pudesse me sentar. — Chamei seu namorado para acompanhar o depoimento, não quero ter que ficar ouvindo as lamentações do Beaumont outra vez. 

Cyberstalking - Além do que se vêWhere stories live. Discover now