Capítulo Dezenove

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ELENA


Assim que Caleb e Alicia saíram, levei o meu celular para o banheiro, coloquei-o sobre o balcão de mármore e deixei que continuasse a tocar as músicas do John Mayer enquanto eu me preparava para ir tomar um banho quente. "Slow Dancing In A Burning Room" tornara-se uma das minhas favoritas e, coincidentemente, era a que estava tocando nesse exato momento. Abri o box, liguei o chuveiro e comecei a cantarolar enquanto a água escorria sobre o meu corpo.

A canção do John colidia diretamente com as minhas lembranças do Ben, com tudo o que vivi e senti antes de mudar para a Califórnia, trazendo à tona os poucos momentos de carícia, de aconchego, de paz e tranquilidade, que tivemos enquanto vivíamos nesse relacionamento tão errôneo e ao mesmo tempo tão real nas nossas cabeças. Será que estávamos fadados e destinados a um fim tão doloroso como esse? Ou será que, em meio a todo esse caos, ainda temos salvação?

"I was the one you always dreamed of, you were the one I tried to draw, how dare you say it's nothing to me; baby, you're the only light I ever saw..."

Pois é, John... você acertou em cheio ao escrever o trecho dessa música porque, ao mesmo tempo em que ele foi a pessoa que eu tentei desenhar, Ben Reed Parker também foi a única luz que eu já vi.

A única luz a qual estou disposta a lutar para conseguir acender novamente.

E dessa vez... pretendo mantê-la acesa o máximo de tempo que eu puder.

Após sair do banho, enrolei-me no roupão, peguei o celular, saí do banheiro e parei em frente ao espelho. Abruptamente, uma ideia um tanto maluca me veio à cabeça: "E se eu ligasse para ele?", pensei em voz alta. "Será que ele continua com o mesmo número de celular?", dei de ombros diante do meu reflexo. "Por quê não? Eu não tenho mais nada a perder, não é mesmo?", ergui uma das minhas sobrancelhas e sorri de lado. "Irei ligar!"

Desbloqueei o aparelho, busquei nos contatos o nome dele e cliquei na opção de "Ligar".

Primeira chamada.

Nada.

Segunda chamada.

Silêncio.

Terceira chamada.

Quarta chamada.

Quinta chamada...

Alô?

Na quinta chamada ele atendeu a ligação.

Alô? — Repetiu.

— Oi, Ben... — Falei timidamente.

Ele suspirou do outro lado da linha.

Elena.

— Você está ocupado? Podemos conversar?

Na verdade eu estou de saída. Olivia me pediu para ir à padaria e fechar o pedido do pacote para a festa dela. Podemos conversar em outro momento?

— Sendo assim, eu poderia acompanhá-lo? Posso te ajudar e... bom, logo após, podemos conversar.

Eu não acho que preci... — Hesitou um pouco — tá, tá. — Falou apressadamente. — Tudo bem, Elena. Você pode me acompanhar.

— Olha, se você não quiser, pode me f...

Não, tá tudo bem. — Disparou. — Eu quero... — Pude ouvir o som da sua respiração pesada — eu também quero conversar com você. — Fez uma momentânea pausa. — Passo aí em dez minutos?

— Combinado. Irei me trocar.

Então nos vemos daqui a pouco. Até mais.

— Até mais, Ben. — Ele murmurou "Até!" e em seguida desligou a ligação.

Uhhhh se alguém me visse dessa maneira, confiante e empolgada, embora com receio, jamais imaginaria que há pouco eu estava chorando feito bebê por causa dele!

Ai ai, hein Elena?!

Quanto mais eu tento desviar, mas eu permaneço entre uma linha tênue!


(...)


Pausei a música e troquei de roupa rapidamente. Vesti uma saia jeans, uma blusa de alça branca, coloquei um casaquinho longo e fino tom pastel, que papai comprara quando estávamos em Malibu, calcei uma sandália estilo gladiador, penteei os meus cabelos, deixando-os soltos, passei um perfuminho doce, enfiei o celular no bolso e saí do quarto, descendo as escadas.

Ao chegar no térreo, Olivia, que estava sentada no sofá, ainda de pijamas e lendo um livro, me fitou sutilmente e sorriu.

— Ui, tá bonita! Nem são nove horas da manhã e você já está toda arrumada. Vai sair para algum especial e encontrar alguém?

Cruzei os braços e entrecerrei o olhar.

— Não finja que não sabe. Até parece que ele já não te avisou.

— "Ele" quem? — Encolheu os ombros.

— Ora "quem"?! O Ben, ué!

— Você vai sair com o Ben? — Olivia arregalou os olhos e abriu um sorriso largo.

— Vo-você não sabia? — Sorri amarelo e senti o meu rosto ferver. — Ele vai à padaria para fechar o pedido e...

— Sim, eu sei, eu pedi para que ele fizesse isso por mim. Mas, não achei que ele ia te convidar para ir junto, porque... — Coçou a nuca — bom, aparentemente a noite anterior não terminou muito bem para vocês, né?

Balancei a cabeça negativamente.

— E mesmo assim ele te chamou? — Perguntou confusa. — Deus do céu, o Ben gosta de se torturar, viu?!

— Na verdade, eu meio que me ofereci. — Caminhei em direção ao sofá e me sentei ao seu lado. — Liguei há pouco para ele porque queria conversar. Ele me disse que ia sair e então... — Dei de ombros — tô aqui à espera dele.

— Puxa, você ainda tem o número dele salvo!

— Sim, tenho. Mas, ao que tudo indica, ele havia apagado o meu, porque, ao atender a ligação, foi como se não reconhecesse a minha voz.

— Leninha, isso era meio óbvio, né? — Olivia acariciou as minhas costas. — Mas, o que importa é que agora vai ficar tudo bem, de um jeito ou de outro... afinal, essa dor e esse rancor não vão perdurar para sempre. Se você não aguenta essa situação, ele tampouco.

— Acha mesmo que vai ficar tudo bem, Via?

A campainha tocou, e as batidas do meu coração aceleraram freneticamente.

— Dizem por aí que o tempo é o melhor remédio, não é mesmo? — Sorriu discretamente. — Tudo vai ficar bem. Tudo sempre fica.

Olivia me abraçou bem forte e beijou a minha testa.

— Agora vá. — Prosseguiu. — Vá e não tenha medo. Seja sincera e deixe tudo fluir conforme o ritmo da música.

Abracei-a mais uma vez e levantei-me, ansiosa, indo até à porta.

Ao girar a maçaneta, notei que ele estava de costas, distraído, enquanto meneava o seu corpo na ponta dos pés. A ventania fraca bagunçava alguns fios de cabelo, mas ele parecia não se importar.

Fechei a porta atrás de mim, delicadamente, e então disse:

— Perdido nos seus pensamentos?

Quando virou o tronco e o pescoço para trás, notei um semblante cansado no seu rosto. Ainda que ele sorrisse, um sorriso discreto, não dava para esconder.

— Você já comeu?

— Não tive tempo.

— Bom... — Enfiou as mãos no bolso da calça moletom preta — posso te levar para tomar café na padaria?

— Acho uma boa ideia.

FINE LINE: Do Outro Lado Da Linha | LIVRO #2Onde as histórias ganham vida. Descobre agora