Capítulo Vinte e Seis

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BENJAMIN


Às vezes, eu tenho aquela sensação boba de epifania. Ainda não consigo acreditar que é real, que estou em paz, que está tudo bem. No fundo, sinto como se a qualquer momento fôssemos sofrer um abalo muito forte e nos separar novamente. Sinto como se os nossos dias estivessem contados, e que a ideia de "duradouro" não passa de uma mera ilusão. Contudo, talvez seja apenas os meus medos irracionais e as minhas inseguranças querendo destruir todo o progresso que conquistei até aqui. Preciso ser forte. Agora eu sou livre para amar.

Elena e eu estávamos sentados sobre a grama, próximos um do outro, cada um com a sua taça de vinho, enquanto nos deliciávamos com a paz daquele momento. Atenuados, imersos em uma bolha invisível de conforto e segurança. Compartilhamos pensamentos, falamos sobre as nossas vidas, contamos histórias dos últimos meses, rimos em silêncio ao passo que, também, nos emocionamos. Um verdadeiro mix de emoções. As pequenas luzes laranjas que estavam entre os galhos e o tronco da árvore, serenas, ressaltavam a beleza singela que a Elena carregava nos seus traços; principalmente, é claro, no seu coração. E, céus... eu poderia admirá-la por horas, mesmo em meio à quietude, e não me cansaria! A maneira como fica sem graça e sorri ao abaixar a cabeça, colocando uma mecha de cabelo por trás da orelha; a forma como inclina-se para frente, apoia o seu corpo nos seus joelhos e desvia o seu olhar, imersa em seus pensamentos; ou, até mesmo, o jeito engraçado quando engole um pouco a mais de vinho e franze o nariz, porque a bebida desceu rápido demais e trouxe uma sensação de rasgar em sua garganta... e tantas outras pequenas coisas que a transformam nesse ser cativante e especial para mim.

Íamos para a terceira taça de vinho quando a Elena endireitou o seu tronco e sorriu de lado, espreguiçando-se. Apenas assenti, captando o recado. Recolhi as duas taças e a garrafa, e coloquei-as em cima de uma mesa branca de madeira que estava logo atrás de mim. Elena levou e logo pôs-se a deitar na rede, chamando-me. Não pude deixar de sorrir ao notar o seu semblante meio sonolento. Caminhei lentamente em sua direção, deitei cuidadosamente ao seu lado e, em seguida, a Elena me abraçou e se aninhou no meu peito. Acariciei os seus cabelos enquanto sentia a sua respiração sobre o meu pescoço. Ela estava de olhos fechados quando inclinou a cabeça e sorriu para mim. Com o meu polegar, acariciei o seu rosto... e os seus lábios. Macios. Convidativos, também. Admirei-a por alguns segundos, ainda em silêncio, memorizando cada traço e cada particularidade, porque queria deixar gravada a sua imagem na minha cabeça. E nos meus melhores sonhos, eu iria encontrá-la.

Então, subitamente, ela aproximou-se um pouco mais e me beijou. Não era um beijo avassalador, cheio de paixão, como estamos acostumados a ver nos filmes alheios da vida. Era um beijo diferente. Era como se a Elena pudesse ser capaz de ler a minha mente e estivesse (re)criando memórias para um futuro imprevisível. Não importa o que acontecesse, não importa onde estivéssemos: iríamos lembrar desse momento até o último dia das nossas vidas!

Ao passo que ela me beijava, enroscava alguns fios do meu cabelo na ponta de seus dedos e acariciava a minha nuca. Por um momento, senti arrepios e sorri em meio ao beijo, arrancando uma risada gostosa da minha garota. Beijei a sua testa e a ponta do seu nariz, e ela fez o mesmo comigo, acariciando a minha barba ralinha, que já estava querendo dar às caras, com o seu polegar.

O seu olhar intenso e penetrante fixou-se no meu. Transparente como o vidro, a minha alma estava exposta. As minhas defesas completamente abaixadas, e o meu coração entregue em disparate.

— Nós somos reais? — Sussurrei.

— Como assim? — Ela observou atentamente a minha feição.

— Nem nos meus mais maiores sonhos eu imaginei que isso poderia acontecer comigo. Sabe... — Ela se aninhou novamente no meu peito e eu abracei-a, trazendo-a mais para perto — você ter cruzado o meu caminho foi a melhor coisa que poderia ter me ocorrido. Tive muita sorte ao me apaixonar por você, Elena. Mas, poder amá-la? Uau... — Desviei o meu olhar, sorrindo abobalhado — ganhei na loteria!

Novamente, em silêncio, ela fixou o seu olhar intenso e penetrante em mim. Observou os meus traços e as minhas reações. Sorriu, pensativa, enquanto acariciava a minha mão.

— Ben... — Ergueu as nossas mãos, entrelaçando os nossos dedos firmemente — talvez eu fosse capaz de me apaixonar por outra pessoa. — Pausou, deixando-me com uma pontinha de apreensão. — Mas... — Ainda com os nossos dedos entrelaçados, Elena inclinou-se um pouco para frente e virou-se para mim, com os seus cabelos dançantes em meio à brisa — em hipótese alguma, eu poderia amar a outro alguém como eu amo você, e como eu tenho aprendido a amar um pouco mais a cada dia. — Ergui o meu corpo para cima e apoiei rapidamente os pés no chão para que a rede não virasse e levássemo-nos juntos. — Não sei quanto tempo iremos durar. Não sei até quando estaremos juntos. Eu simplesmente não sei de nada disso. — Encolheu os ombros. — No entanto, a única coisa que eu sei é que, enquanto tivermos um ao outro, eu iriei aproveitar cada instante. Cada abraço. Cada sorriso. Cada gesto. Cada beijo. Cada carícia. Tudo. Não quero limitar o meu amor a um tempo que não temos controle nem podemos manejá-lo. Não vale a pena viver assim, você não acha?

Ao ouvi-la falar, a única coisa que eu conseguia fazer era sorrir. Os seus pensamentos e as suas perspectivas eram simplesmente peculiares.

De fato, ela é a mais inteligente, sem sombra de dúvidas. Ela é mais inteligente do que eu, e não me importo com absolutamente nada disso. Muito pelo contrário: eu a amo ainda mais — também — por isso!

— Gostaria de poder viajar com você algum dia. — Interrompeu o silêncio e os meus pensamentos. — Malibu.

— Califórnia? Interessante.

— Tenho certeza de que iria adorar Malibu. É libertador. Pelo menos para mim.

— Estou acatando a ideia, senhorita. — Elena sorriu, amarrando o seu cabelo em um coque.

— Seria libertador para nós dois. E eu poderia amá-lo intensamente. Sem preocupações, sem responsabilidades que nos prendam. — Sorriu, sugestiva. — Consegue imaginar? Apenas eu, você e aquele mar maravilhoso, no noroeste californiano.

— Conhecendo algumas celebridades?

— Talvez... — Inclinou a cabeça para o lado, pensativa.

Aproximei-me um pouco mais.

— O que tanto se passa na sua cabecinha, miss?

— Você.

FINE LINE: Do Outro Lado Da Linha | LIVRO #2Onde as histórias ganham vida. Descobre agora