Estrelas

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Off Jumpol notou que Gun estava longe daquela realidade, com seu corpo presente e sua mente ausente, e ao perceber para onde ele olhava, Off ousou supor a razão pela qual Atthaphan entrou em transe.

- Gostou?

- Hnm? - O despertar de seu transe foi em conjunto com a surpresa. Jumpol sinalizou com a cabeça para seu próprio braço, onde estava cravado a imagem de um respectivo zodíaco.

- É bonita.

- Tão bonita que você escolheu tatuar a mesma coisa. - Um sorriso irônico, seguido por uma provocação impediu Gun de ter qualquer tipo de reação coerente.

Jumpol percebeu que não teria uma resposta que o rebate-se, então apenas continuou seu processo. Com o decalque já colado na pele de jade branca, Off deu início a tatuagem.

Atthaphan esboçou pouca dor, talvez porque sua mente já não estivesse mais ali, e sim no rosto concentrado de seu tatuador. Que aos poucos teve um de seus olhos cobertos por sua franja. Gun não pensou, apenas fez; e com os dedos tocou delicadamente os fios de Jumpol, jogando para trás o cabelo que bloqueava a visão dele. Mas ao fazer isso, escutou o som da máquina cessar.

O olhar confuso e surpreso encarou Phunsawat, que percebeu imediatamente o que tinha feito, mas não conseguiu falar antes que Jumpol o fizesse em seu lugar.

- Obrigado.

-... De nada. - Talvez fingir que aquilo não foi tão estranho assim, o ajudaria a lidar com essa memória mais tarde.

Off riu, curvando apenas o canto de seus lábios, fazendo um gesto de negação com a cabeça.

Era como se os vinte e dois arcanos maiores estivessem postos sob a mesa, com a sacerdotisa e a roda do destino alinhados como planetas. Tudo parecia claro como o sol, mas para Atthaphan, ainda não havia amanhecido.

- Como se sente? - A pergunta foi feita horas após a última conversa, quando o cheiro de sangue já se misturava com a tinta, sem nenhuma distinção.

- Bem, só é quente. Tão quente que sinto queimar.

Jumpol concordou com a cabeça:
- Isso é normal. Agora eu vou subir para a clavícula, pode doer ainda mais, então me avise se ficar insuportável.

- Pode ir sem pena. Quanto mais rápido acabarmos com isso, melhor.

A resposta aflita de Atthaphan fez Off achar graça. - Pelo menos havia sinceridade em sua fala penosa.

- Certo. Então, Gun... por que escolheu esse desenho? - Na intenção de desviar a atenção de seu cliente, o profissional iniciou um novo assunto.

- P'Tay me disse que eu deveria escolher algo que fosse importante para mim. já fazem anos que a simbologia do universo e as teorias que o envolvem movem a minha vida. Sempre foi uma fuga, principalmente porque eu nunca fui muito religioso, mas você não acha que uma existência sem crer em nada é solitária? Eu já estive sozinho por tempo o suficiente.

- Então, acreditar em astrologia faz você se sentir menos solitário?

- Acreditar que eu não estou a mercê em um mundo onde eu só existo para um dia morrer, sem nada que me guie e me de uma razão para estar aqui, faz com que eu não me sinta abandonado pela vida. Eu não tenho uma família para sentar comigo e me dizer para onde devo ir, ou me dar conselhos quando não sei que caminho seguir. - Gun levantou a cabeça e encarou Tay, que conversava sem parar com Arm. - Eu posso não ter encontrado isso nos vivos, mas eu encontrei nas estrelas. Então, sim.

Jumpol escutou com atenção, e deu um sorriso fechado em direção ao homem que estava a sua frente.

- Tão melancólico.

- Você realmente vai me julgar? - Perguntou, encarando tatuagem que Jumpol também tinha.

- Nem todas as tatuagens precisam ter um significado.

- Então você só fez por fazer?

- Eu fiz... - Jumpol traçou o astro e ouviu Gun choramingar; aquele era de fato um local sensível. - Porque sou uma pessoa solitária. Em busca de uma estrela.

- Eu espero que a encontre, P'Off.

- É tarde. Já amanheceu.

- Nenhuma manhã é eterna, para haver manhã, precisa haver noite. Nunca é tarde demais.

- Faz faculdade de filosofia?

- Antropologia.

- A diferença é a mesma que a de um suco de uva para um vinho.

- Eu sempre gostei mais do vinho.

- Tudo bem então, sommelier.

- Venha degustar comigo qualquer dia desses.

Off deixou escapar uma risada nasal, sem face nenhuma para encarar Atthaphan.

- Isso não seria nada profissional.

- Oh, certo. Então quando eu sair do estúdio me lembre de te convidar novamente. Não serei mais um cliente até lá.

- Sendo assim... - Off terminou sua última linha, limpando e se levantando para finalizar o processo e envolver com plástico filme. Em seguida tirou as luvas e higienizou o local, pegando um cartão e anotando algo atrás, se virando e entregando nas mãos de Gun. - Esse é o meu contato profissional, caso tenha dúvidas sobre a tatuagem. - Dito isso, ele virou o papel. - E esse é o número que você só pode adicionar quando estiver fora do estúdio.

Gun expôs novamente suas covinhas.
Depois de terminar tudo que precisava fazer dentro do local e ouvir as instruções dadas pelo profissional. Atthaphan saiu seguido de seu melhor amigo.

- E então, o que achou?

- Divertido.

- A tatuagem?

- A tatuagem... - Gun encarou seu braço com uma expressiva satisfação. - É muito bonita.

- Combina com você.

- Eu também acho.

Tay negou com a cabeça enquanto esboçava alegria, levando seu amigo até o carro. A partida para seus aposentos foi tácita, mas tudo que os envolvia era agradável. Mesmo que Atthaphan tivesse passado metade de seu dia sentindo agulhas perfurarem sua pele, ele nunca esteve tão feliz por não ter dado meia volta e recusado o presente de Tawan.

Afinal, além de uma linda obra cravada em seu corpo, ele também foi presenteado com a faísca de uma nova amizade.

Quando nos Vênus, te juro a Marte - Offgun Where stories live. Discover now