Capítulo Trinta e Três // What you don't see

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Terça-feira.

Senti em meus ombros as mãos que sempre me incentivaram a seguir em frente, ainda eram as mesmas: firmes, macias e com as unhas pintadas de vermelho sangue. Fito minha mãe e quando ela sorri, por mínimo que seja, consigo ver a idade chegando por trás de seus olhos e ao redor dele também. Aos trinta e oito anos, ela ainda era jovem, mas havia vividos tantas coisas que uma alma velha teria inveja.

E agora era a minha vez.

— Tenha cuidado. — ela disse em uma tentativa de tentar ser uma mãe segura, no entanto, sei que a sua vontade era de dizer “se alguém falar um ‘a’ torto pra você, eu derrubo aquele colégio, sendo ele do Walt Disney ou do Barack Obama!”

— Não fale com estranhos também. — minha avó pontuou do sofá, de onde estava assistindo sua novela da tarde.

— Não deixe as matérias se acumular! — tio Lennon gritou do segundo andar. Esse conselho eu seguiria com certeza.

— Não use drogas! — Miles contribuiu, mas logo começou a rir. — A quem eu quero enganar? Use drogas, Enola! A faculdade é insana!

Meu avô tossiu para poder chamar a atenção da minha avó para ele e não para o filho. Ele se levantou do sofá e rodeou meus ombros com seus braços.

— Pensei em te dar vários conselhos, meu amor, mas apenas um será o suficiente: se quiser voltar para casa, estaremos aqui. Todos nós, Enola.

Não chorei por ele confirmar que estaria vivo se eu quisesse voltar, chorei porque se esqueceu do meu apelido que me deu. Ele era único e havia se perdido em suas memórias.

Assim como o meu apelido, vovô também se esqueceu que minha mãe era alérgica a gatos, que Miles não morava mais na Carolina do Norte, que Lennon já havia terminado a faculdade e que a minha avó não ia mais as aulas de ioga. Todas essas coisas se perderam e, aos poucos, nós sabíamos, quem nós éramos iria se perder também.

Não havia nada a se fazer. Eu não tinha mais o que fazer, então o abracei com força.

Por favor, esteja aqui quando eu voltar.

— En, o motorista está esperando. — minha mãe passa as mãos nas minhas costas e abre a porta para que eu passe.

Quando o ensino médio acaba, há um pensamento de “e agora? O que eu vou fazer?”. As pessoas ao seu redor te darão respostas óbvias: “vá para a faculdade”, “arranje um emprego que com certeza você vai odiar e reclamará dele até que se veja infeliz ou exausta”, mas eu não queria essas opções. Eu só tenho dezessete anos, cacete. Deveria haver algo além disso.

Mas não havia. E era por isso que agora eu estava descendo do carro e andando em direção a CalArts.

Durante toda a minha vida, eu me acostumei com os olhares das pessoas em mim, porque... bem... eu comecei a atuar com sete anos e na minha primeira peça, a qual eu interpretei a princesa Aurora na infância, fui encarada por cem pessoas. Cem. Esse número triplicou nos próximos anos que se seguiram. E eu nunca vou esquecer de chegar feliz em minha casa e contar para a minha mãe que trezentas pessoas haviam ido lá assistir a peça. Nunca vou me esquecer do que ela me disse: “Isso é só o começo. E se estiver feliz agora, mal posso esperar para ver como ficará quando perceber que você é capaz de lotar um teatro inteiro.”

Mas agora era diferente.

Quando eu incentivei Cressida a subir no palco e dar o seu melhor, percebi que me senti mais feliz do que já estivesse ao ouvir os aplausos direcionados a mim. Eu senti orgulho de quem eu era.

E foi então que a ficha caiu: eu amava atuar, mas incentivar as pessoas a deram o seu melhor era muito mais gratificante.

As pessoas não se lembram dos aplausos, elas se lembram de quem te incentivou a ganha-los. Aplausos eram anônimos, mas a sua base para conseguir não era. Eu não seria uma anônima, eu seria a pessoa que ensinaria as outras que havia um mundo inteiro lá fora, muito além dos aplausos.

Enmity [Enemies to Lovers]Tahanan ng mga kuwento. Tumuklas ngayon