Lucky loser

Capítulo um

ZANE BRANDO

Gelo alivia a dor. Gelo dentro de um copo de uísque alivia até a alma. É nisso que penso ao levar aos meus lábios, o copo, enquanto vejo em cima da mesa o meu rosto na capa do Atlanta Times. Uma veia saliente toma conta da minha testa e em uma visão panorâmica, vejo a bola de tênis voando em direção à Cameron Wyatt, um senhor baixinho, com um corpo desproporcional ao seu tamanho e um bigode com as pontas viradas para dentro. O senhor que me encontrou em uma quadra de tênis da periferia de Atlanta e me fez chegar ao top 3 mundial antes dos 20 anos. Nesse momento, ainda deve ter um saco de gelo em seu rosto para aliviar não apenas a dor da bola, mas também a marca circular que ficou em sua bochecha.

– A ascensão da queda de Zane Brando – a voz grossa de York Potter toma conta do escritório do agente esportivo, localizado no último andar de um dos principais arranhas céus de Atlanta, penso como ele conseguiu isso sem nem ter atletas tão famosas sob seu controle.

– Não precisa ler o artigo em voz alta, sei cada palavra que Martha Sales escreveu – e cada palavra é mais cruel que a outra.

A jornalista esportiva relata não apenas os acontecimentos da minha última partida no aberto da Austrália, mas também toda a temporada desastrosa que protagonizei, desde a eliminação precoce em Wimbledon no último ano até o vexame de semanas atrás. E principalmente, ela relata detalhe por detalhe de como foi minha derrota para um menino que nem 18 anos completos tem e como uma bola de tênis foi parar no rosto do meu até então agente esportivo. Bufo em relembrar sobre a opinião de que Zane Brando não tem mais aquele talento que o levou ao auge e que talvez precisasse de tratamento para raiva ao invés de partidas mal disputadas.

– Martha Sales não escreve nada de bom sobre nenhum atleta – York pode até estar certo, porém ela jamais havia escrito para me criticar – é uma fase, Zane.

– Eu não curto esse tipo de fase – murmuro e jogo mais uísque para dentro do meu corpo.

York Potter concorda com a cabeça e entrelaça suas mãos atrás de seu pescoço. Ele foi jogador de basquete por um tempo, seu porte físico revela isso apenas ao encara-lo. Mas, além disso, todos os porta-retratos posicionados na bancada atrás de sua mesa são de um garotinho loiro com diversos modelos de camisas do Atlanta Hawks. Provavelmente é seu filho, mesmo que não sejam nem um pouco parecidos, visto que o meu agente é moreno com olhos verdes e o menino é loiro, com a pele muito branca e os olhos azulados.

– Não tem não curto, agora você tem que lidar com o que fez – ele é direto comigo, isso foi algo que gostei nele assim que assinamos o contrato de agenciamento – volta a jogar no aberto do México.

Uma risada forcada escapa dos meus lábios, York só pode estar maluco, não posso passar um mês inteiro fora das quadras, minha posição no ranking não está as melhores e passar praticamente um mês sem competir em nenhum torneiro apenas irá piorar tudo.

– Você entende sobre tênis? – pergunto colocando o copo em cima da mesa e penso o que tinha na cabeça quando vim atrás de um agente esportivo que claramente prefere basquete do que qualquer outro esporte.

– Pelo bem do nosso contrato, fingirei que você não perguntou isso – ele assume uma posição mais profissional agora, ops... – temos que limpar a sua imagem primeiro, antes de você voltar às quadras e ser bombardeado de perguntas sobre Cameron e o aberto da Austrália.

Nisso ele tem razão, pisei muito na bola e cansei de contar todas as revistas e jornais que estampei nos últimos dias e cada manchete me massacrando. Não era uma postura certa para um homem de 24 anos, mas Cameron me pressionou a jogar o aberto da Austrália, mesmo  falando que não estava preparado psicologicamente para isso, porque a lesão ainda não estava 100% bem e não sabia se aguentaria uma partida inteira. Então ao escuta-lo me xingar após perder a partida, o meu sangue ferveu como jamais havia fervido e fiz o que fiz. E, no fundo do meu coração, não me arrependo nem um pouco.