Capítulo sete

484 85 28
                                    

ZANE BRANDO

Observo Arizona levar a taça até seus lábios, tomando um pequeno gole do líquido vermelho-escuro. Faz poucos minutos que acabamos de desfrutar do prato principal, conversamos bastante sobre tudo, sobre sua vida, minha vida, sobre como agir com uma irmã de criação adolescente e dezenas de outras coisas. Ela é inteligente, possui um raciocínio e uma noção de vida muito grande para uma pessoa de 24 anos, porém, ela é diferente, teve um filho na adolescência e pelo que entendi, não teve nenhuma ajuda do progenitor. Não tive coragem para perguntar quem é o pai de Hunter, acredito que isso deve partir dela.

– Acho que Suíça – respondo sua pergunta sobre qual país gostaria de morar – mas também gosto do México, as melhores comidas do mundo são de lá.

– Nunca fui para nenhum dos dois – se não fosse pelo tênis, eu também nunca teria ido – eu escolheria a Austrália.

– Quero a Austrália muito longe de mim – murmuro e ela ri com sinceridade – brincadeira, o primeiro Slam que ganhei foi o aberto da Austrália.

– Você imagina que ganharia tudo que já ganhou? – tentas pessoas já me perguntaram isso e a resposta sempre será a mesma.

– Não, achei que seria preso antes dos 20 anos por tráfico – sou realista e seu rosto fica branco – para os meninos do lugar onde cresci, ter uma vida diferente é algo difícil de se imaginar.

– Foi duro? – sua voz saí com rouquidão, não é um assunto que as pessoas gostam de lidar, ainda mais se cresceram em condomínios fechados e em uma bolha social, como Arizona.

– Eu sou branco, foi duro sim, mas se fosse negro, teria sido muito mais duro – solto um suspiro – vou para o bairro onde cresci pelo menos uma vez por mês, tenho vários projetos sociais lá e espero que o esporte salve várias vidas, como salvou a minha.

Quando tinha 18 anos, com vários campeonatos importantes ganhos, fui lá pela primeira vez após ir embora. Vi um policial estourar os miolos de um vizinho meu, porque segundo a autoridade, ele portava cocaína. Se é verdade ou não, jamais vou saber, mas a cena, o sangue voando para todos os lados e o grito de sua mãe, nunca saíram da minha cabeça. Podia ter sido eu, podia ter sido minha mãe gritando em cima de um corpo morto. Fui privilegiado por nascer com um dom e mais privilegiado ainda por alguém ter me dado uma oportunidade.

– Não sabia disso, é lindo, Zane – Arizona me elogia e os seus olhos atingem uma cor brilhante.

– Tem coisas que a imprensa não precisa saber, eles irão etiquetar como caridade, mas não é, são vidas que podem ser mudadas, vidas que eu posso ajudar a ter um futuro diferente dos quais crescemos vendo – pego minha taça e balanço lentamente o líquido dentro – eu tinha tudo para ser mais uma estatística de periférico preso, cresci em uma casa compartilhada, nunca soube quem é o meu pai, minha mãe namorou os homens mais horrendos do mundo. E bem, hoje eu estou aqui, graças ao tênis.

– Isso é o mais importante, você nunca esquece sua origem e agora que tem como, muda vidas, tenho certeza que seu projeto mudou e irá mudar vários futuros – eu espero isso.

– Enfim, assunto pesou um pouco – forço um pequeno sorriso e a morena concorda.

– Gostaria de viver viajando o mundo igual você – ela me admite e algo dentro de mim se remexe, não pode ser verdade – claro que o fator Hunter é algo que impede isso, porém, deve ser incrível.

Lucky loserWhere stories live. Discover now