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|Capítulo 18|

2015

"Hum, porquê que os teus pulsos têm estas marcas ligeiramente brancas?" Ashton perguntou, já estando à espera da pior resposta.

Ultimamente, Ashton não tem ido ao café onde Scarlet trabalha, por isso eles aproveitam todo o tempo que estão juntos no bar, para conversarem e substituírem o tempo perdido. Ashton não podia andar na rua sozinho durante o dia, porque algumas fãs tinham descoberto que ele ia visitar Scarlet ao trabalho. Como ele não queria levar o seu segurança de um lado para o outro só para estar uns minutos durante o dia com a loira, eles combinaram encontrarem-se apenas no bar Grand Castell.

Desta vez, estavam apenas a observar as outras pessoas e a fumar. Haviam poucas mulheres, sendo Scarlet uma delas. O espaço não era muito grande, por isso não havia assim tantas pessoas. Alguns homens gritavam uns com os outros, mas o mais provável era que nem tivessem uma explicação para estarem a gritar, eles deviam estar apenas embriagados. 

Scarlet estava a divertir-se fazendo anéis de fumo. Ela inspirava a toxina e expelia-a pela boca, curvando os seus lábios de maneira a que o fumo saísse em forma de anel. A verdade é que, talvez, ela tivesse bebido um pouco mais do que o costume, e por isso estava a achar mais graça àquilo do que se estivesse sóbria.

Ashton brincava com as mãos dela e viu traços nos pulsos dela mais claros que o tom de pele dela. Ele sabia o que aquilo era, eram cicatrizes, mas esperava que ela não as tivesse obtido da maneira mais comum.

Ele bufou e perguntou de novo, "Como é que arranjaste estas marcas?" Ele apontou para o pulso dela.

Scarlet parou de gargalhar e olhou para onde ele apontava. De repente, parecia que todo o humor que ela tinha, tinha desaparecido. A rapariga olhou atentamente para o seu pulso e enxotou a mão de Ashton, para que pudesse ser ela a segurar no seu braço.

"Lembras-te de quando eu te disse que se me chamasses 'Scar' eu iria lembrar-me do meu passado?" Ele assentiu. "Bem, aqui está o meu passado." 

Depois de dizer essas palavras, ela sorriu. Obviamente, era um sorriso forçado, como os que ela andava a fazer a sua vida toda. No entanto, este sorriso forçado era diferente, porque qualquer pessoa conseguia perceber que ela não estava mesmo com vontade de sorrir. Ashton sabia que ela era ótima a fazer sorrisos falsos, nunca ninguém percebia que ela apenas queria chorar, por isso estranhou quando a dor dela estava tão mal mascarada.

Ele levou isso como uma pista do que devia fazer e abraçou-a. Scarlet enroscou a sua cabeça na camisola dele, enquanto o rapaz punha os braços à volta do corpo dela e fazia pequenas festas nas costas dela. A loira puxou o ranho e soluçou, dando a parecer que estava a verter lágrimas. Mas não, ela estava a chorar um daqueles choros que qualquer pessoa evita. Era um choro sem lágrimas. Era um daqueles choros onde tudo o que tu queres é livrar-te da dor deixando que água escorregue pelas tuas bochechas mas isso não acontece, e ficas com uma aflição por continuares a sentir dor.

Ashton apercebeu-se disso e sussurrou, "Podes chorar, está tudo bem."

"Mesmo que eu queria chorar, o que eu quero fazer, não consigo. O meu corpo está tão habituado a que eu evite chorar em frente de outras pessoas e a que eu apenas chore quando estou sozinha, que, mesmo que eu me esforce para chorar, nada acontece." Ela afastou-se do rapaz, apenas o suficiente para  conseguir olhar para os olhos dele. "Foram muitos anos de dor e eu nunca quis parecer fraca, por isso chorava sempre que estava sozinha no meu quarto. Por causa disso, já nem consigo que lágrimas caiam." Ela deu uma risada seca. "Mas sabes, até que foi bom. Foram as noites em que eu me enroscava nos cobertores o mais que podia e chorava até adormecer que me deram a oportunidade de me conhecer realmente. Enquanto eu chorava, pensava sempre na vida, e comecei a perceber-me e o porquê das minhas ações."

"E o que descobriste?" Ele beijou a testa dela para a fazer sentir de que não estava sozinha.

"Que é impossível eu vir a amar alguém e que é impossível que alguém me ama porque nem eu me amo a mim mesma. Descobri que eu apenas finjo os sorrisos porque não quero que saibam que atrás da minha figura feliz e às vezes rabugenta vive uma menina assustada e infeliz. Descobri que temo mais coisas do que alguma vez possa enumerar. Descobri que adoro ouvir bandas de rock pesado porque as suas músicas me animam e as suas baladas parecem falar da minha vida. Descobri que todos os cortes que eu alguma vez fiz demonstram que eu em tempos fui alguém corajoso e forte, mas que acabei por quebrar e usar a saída que estava mais perto. Descobri que, no meu caso, não dá para aproveitar a vida. Eu já estou há demasiado tempo a viver neste buraco de tristeza e, se alguma vez saísse dele, seria um choque e provavelmente tudo iria piorar. Descobri que sempre que eu sorrio estou a pedir silenciosamente à pessoa para olhar cm atenção para mim e reparar que há algo que não está completamente bem comigo. Descobri que o tabaco me traz a tranquilidade necessária para poder continuar a viver. Eu sei que é apenas tranquilidade temporária, mas dura tempo suficiente."

Ela suspirou e disse com um tom de voz nunca antes ouvido por Ashton, era um tom triste. "Eu apenas me cortava porque eu queria livrar-me da dor. Chorar deixou de ser suficiente e eu precisava de algo com maior efeito. Eu nunca quis cortar-me, achava que quem se cortava era fraco. Mas, assim que fiz o primeiro corte, tornou-se uma droga. Eu nunca quis morrer, eu tenho medo da morte, por isso queria arranjar algo que me desse o mesmo efeito. Ver o sangue a escorrer é algo que eu adorava fazer e às vezes ainda sinto saudades de ver os padrões que a substância vermelha fazia no chão da casa de banho."

"Não voltes a fazer isso." Ashton parecia preocupado com ela, e Scarlet sorriu.

"Eu não volto. Eu agora uso a droga e a bebida para susbituir os cortes.  Não sei se percebes, mas tipo, eu sei que a droga me pode matar e sei que se eu me cortasse vezes a mais num dia podia morrer. Por isso as duas coisas, embora diferentes, têm o mesmo efeito."

"Mesmo assim não devias andar a tomar substâncias que te fazem mal." Ele ralhou, mas a loira apenas gargalhou.

"Um pouco hipócrita, não achas. Fazes as mesmas coisas que eu e dizes-me que eu devia parar?"

"Eu preocupo-me contigo, e as pessoas tendem a proteger as pessoas com quem se preocupam."

"Eu também me preocupo contigo, e acho que também devias para de te matar aos poucos."

Ashton sorriu a Scarlet e ela fez o mesmo, ambos os sorrisos com pequenas covas, mostrando que sorriam genuinamente. 

Durante o resto daquela noite, nenhum deles voltou a fumar ou a consumir coisas que os matava. Eles não se queriam desiludir e, embora soubessem que no dia seguinte voltariam à rotina normal, Ashton e Scarlet tentaram parar. Apenas durou uma noite, mas tentaram.

++

eu cada vez gosto mais desta história, talvez porque me relacione com algumas coisas que eu escrevo.

alguém percebeu porquê que eu chamei Grand Castell ao bar e chamei Richard ao dono do bar?

ily, nunca te esqueças de sorrir :-)

Scar | a.i.Where stories live. Discover now