Some Enchanted Evening

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Entrar naquele carro me deixa um pouco nostálgica. Não é o carro do Liam, mas talvez eu tenha entrado naquele veículo muito mais vezes do que no carro dele. Não tem motorista e é o próprio John que dirige em silêncio. Mando uma mensagem pra Polly avisando que eu estou indo encontrar com o Liam e desligo o celular antes que ela me ligue pra perguntar se eu estou doida.

Mesmo depois de meses eu não havia aprendido a andar em Londres sem ser de metrô. Não sei chegar sozinha nos lugares de carro, mas depois de um tempo noto que não é para o prédio de Liam que estamos indo por que ele não é tão longe assim.

Só que eu deixo de prestar atenção em por onde estamos passando. Concentro-me em mim mesma por que meu pulso está acelerado e as pontas dos meus dedos geladas. Eu estou nervosa e irritada exatamente por estar nervosa. Passo a língua pelos lábios algumas vezes e toco a parte de trás da minha cabeça onde eu tinha prendido meu cabelo em um coque. Fico procurando coisas pra fazer e pensar que me distraiam.

Fico assim, agitada, até que volto a reparar na paisagem do lado de fora. Tudo tinha mudado bruscamente. Não há mais prédios gigantescos e modernos ou construções históricas, muito menos aquela quantidade de pessoas que andavam por Londres a qualquer horário do dia.

As pessoas na rua agora parecem com menos pressa, andando tranquilamente com suas famílias ou seus cachorros, apesar do horário. Os prédios são bem menores e mais antigos e as casinhas muito parecidas uma com as outras.

— John? — o chamo com um tremor na voz. — Por que você me trouxe aqui?

Eu estou em Notting Hill e quero chorar do mesmo jeito que eu quis quando estive pela primeira vez.

John me olha pelo retrovisor, mas não responde. Meu peito reclama e eu estou prestes a perguntar de novo, mas o carro para. Ele me diz que posso descer e eu não preciso que ele aponte em qual daquelas portas coloridas eu devo bater, eu já sei qual é.

Coloco a mão sorrateiramente sobre a madeira pintada de azul marinho quando me aproximo. Chego até a respirar com mais cuidado sentido a superfície gelada. Não sei quantas vezes eu tinha visto aquela mesma porta na minha televisão. Era a mesma quantidade de vezes que eu tinha visto aquele filme sem imaginar que a minha vida ia ficar tão parecida com a do personagem de Hugh Grant.

Perco a noção do tempo enquanto olho e sinto a textura daquela porta. Não sei como não tem ninguém ali por que até onde eu sei, aquele lugar é quase um ponto turístico na cidade. Ou talvez não existisse tanta gente assim tão apaixonada por aquele filme quanto eu.

Não sei direito o que fazer então eu toco a companhia e espero até que a porta se abre e eu vejo Liam.

— Não acredito que você veio — ele murmura com o cenho franzido.

— Nem eu.

Liam dá espaço para que eu entre e não deixo de reparar em como ele está perfeitamente impecável, diferente da última vez que o vi. O cabelo brilhoso, a barba rala e a camisa preta marcando seus braços.

Mas logo eu desvio a atenção para a casa. Do lado de dentro é tudo diferente, claro. É grande, apesar da entrada discreta e pequena, com uma decoração que eu tenho certeza que faria minha mãe chorar de amor.

— Então... — Dou mais uma olhada ao redor e Liam para perto de mim na sala. — Por que estamos aqui?

Consigo ver uma sala de jantar ao fundo e uma escada que leva ao andar de cima onde, imagino, estão os quartos.

— Por que eu não te trouxe aqui daquela vez. — Liam me olha quase que timidamente. — Achei que você fosse gostar de conhecer. — Ando devagar pelo cômodo, reparando nas paredes beges decoradas com quadros delicados. — Você gostou?

Paro de andar para encará-lo. É, eu tinha gostado, mas não ia dar o braço a torcer assim. Ainda não havia engolido o motivo que ele tinha me dado na outra noite.

— Mas o que a gente está fazendo do lado de dentro? — passo os olhos pela sala de novo. — Achei que isso fosse propriedade privada. A porta é bem conhecida, mas a casa é de alguém, não é?

Liam parece sem jeito, colocando as mãos nos bolsos quando me olha.

— É. — Ele torce os lábios e, como eu, varre o aposento com o olhar. — É minha.

Primeiro acho que ele está brincando comigo, mas Liam está sério e até um pouco resoluto.

— Quê? — Sinto minha testa enrugar em incredulidade. — Como assim é sua?

— Eu comprei. — Os ombros dele se levantam.

Solto uma risadinha involuntária pela normalidade com que ele diz aquilo como se comprar uma casa em Notting Hill fosse algo que qualquer um conseguisse. Aquela casa então... Não preciso pesquisar pra ter certeza que ela deve ser uma das mais caras. E eu também tenho certeza de que ele não precisava de uma casa nova.

Mas ele pode, ele tem dinheiro e pelo visto não tem com que gastar.

— Certo — eu digo com um som seco. — E por que você fez isso?

— É importante pra você. — Ouvir aquilo me faz abrir a boca pra contestar, mas Liam se aproxima um pouco e eu me calo. — E a partir de agora pra mim.

Não entendo por que ele tem que deixar sempre os primeiros botões da camisa abertos. Eu me distraio por um segundo com os olhos naquele pedaço de pele amostra e me pego querendo tocá-lo por que agora ele está bem na minha frente.

— A partir de agora — repito em um sussurro, sem entender. — O que tem de tão especifico nesse momento pra você?

Liam dá mais um passo e eu posso ver a pele do seu pescoço claramente, lisa e firme, apenas com aquela marquinha mais escura e eu penso em como gostava de beijá-lo ali. E em todos os outros lugares.

— É o momento que eu digo que eu amo você pela primeira vez.



De Lua, com amorOnde histórias criam vida. Descubra agora