Don't Do Sadness

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| 4 dias antes |

Meus dedos afundam na terra fofa e úmida, mas eu não tenho certeza do que estou fazendo. Dona Marlene, como uma boa botânica, tinha me ensinado a arte da jardinagem quando eu era ainda uma criança, mas aparentemente eu desaprendi tudo nos últimos meses. Provavelmente devo estar jogando essas sementes para a morte.

E minha mãe não está mais do meu lado para me guiar. Tinha se levantado para falar com a vizinha que veio nos cumprimentar, mas que na verdade queria dar uma olhada na "filha dos Martinez que tinha voltado de Londres". Coisa de cidade pequena.

E Itupeva nem era tão pequena assim.

— Lua, como foi a sua viagem? — Ouço a mulher perguntar atrás de mim com a voz esganiçada.

Levanto-me da grama limpando os dedos sujos em um pano velho que eu havia pendurado no meu macacão.

Não queria conversar, principalmente por que sei que tudo que eu falar vai ser repassado para todas as outras donas de casa do condomínio onde morávamos. Mas também não queria ser mal educada afinal conhecia aquela mulher baixinha e de bochechas fofas desde que eu nasci.

— Foi boa. — Sorrio para ela. — Ótima, na verdade.

— Aposto que você conheceu muita gente interessante — ela fala animada e eu olho para minha mãe pedindo ajuda em silêncio. — Você sabe a Mariana, né? Minha filha mais velha. Foi pra Suíça ano passado e não vai voltar tão cedo. Arranjou um namorado por lá.

É por essas e outras que eu não queria conversar com ninguém.

Minha mãe se mexe desconfortavelmente sobre as botas de jardineiro e me encara.

—Hum, nossa. — Forço meu tom pra que eu pareça compartilhar da animação dela. —É, eu conheci sim... Algumas pessoas.

— Algum paquerinha? - Ela dá aquele sorrisinho como se estivesse me perguntando algo indiscreto.

Passo os dedos nervosamente uns nos outros e tento sorrir, mas não consigo.

—Renata, você conseguiu dar um jeito naquele vazamento na sua cozinha? — Minha mãe interfere como se tivesse acabado de lembrar do assunto, mas ela está me salvando como sempre faz.

Não culpo a minha vizinha Solange. Coitada. Mal sabe ela.

Estar em casa já não parecia tão bom, apesar de gostar de estar com os meus pais depois de tanto tempo. Até a cidade me dava saudade e nostalgia porque antes de ir pra Londres eu não estava morando ali, mas sim em São Paulo que era pra onde eu tinha ido estudar.

Mas apesar de toda a atenção deles e de poder rever os meus amigos de adolescência eu me sinto estranha, como se eu não pertencesse mais àquele lugar.

Não estava completamente feliz e pelo jeito isso está estampado na minha testa já que vivo pegando meus pais me avaliando pelo canto de olho. Eles estão preocupados, mas quando me perguntam o motivo digo que estou nervosa com os testes de Nova Iorque mesmo que eles fossem acontecer apenas dali algumas semanas.

Eu estou nervosa com isso sim, mas meu estado era muito mais uma questão de tristeza e saudade. Já tinha se passado mais de um mês e meio e nada dentro de mim havia mudado. Na verdade, parecia que tinha piorado. Cada partícula do meu corpo sente falta dele.

E, sim, nós nos falávamos às vezes. No começo.

Mas eram conversas por mensagens, vagas e ocasionais que foram diminuindo gradativamente até sumirem por completo depois do natal. E eu tive que me conformar porque eu sabia que aquilo aconteceria. Sabia que alguma hora o fio ia arrebentar principalmente porque nós havíamos concordado que não tinha como aquilo dar certo. Nós não éramos mais nada um do outro.

De Lua, com amorWhere stories live. Discover now