Capítulo 20 - Preces

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Caitriona estava no apartamento de Sam, vestindo apenas uma das camisetas brancas dele, enroscada no sofá em posição fetal. Sua mãe estava sentada a seus pés, na outra ponta do sofá, ressonando levemente. Nesse momento, sentia apenas torpor.

O primeiro dia após o desaparecimento de Sam fora de desespero total. Todas as gravações foram canceladas até segunda ordem, a equipe abalada pelo acontecido. Enquanto isso as equipes de relações públicas e assessoria da Starz e do próprio Sam faziam de tudo para encobrir o fato, para afastar as notícias da imprensa, afinal seria um grande escândalo que o astro de Outlander tivesse desaparecido nas montanhas gélidas da Patagônia.

Caitriona nem lembrava como tinha chego em casa. Num momento estava com Maril no trailer, no outro estava em seu próprio sofá, com um xícara de chá nas mãos e o olhar de preocupação de sua mãe a encarando.

Tudo não passava de um borrão: ela tinha lembranças de pessoas chegando no flat. Maril, Ron, David, Mat, César, Lauren. Todos eles estiveram ali em algum momento. Ela também conseguia se lembrar de ter vomitado todas as vezes que alguém chegava perto dela com qualquer coisa minimamente comestível. E as lágrimas. Lágrimas e mais lágrimas, que assomavam através de seus olhos, molhavam seu rosto e encharcavam suas roupas.

Seu primeiro impulso foi o de ir atrás dele, de tomar o primeiro voo até a maldita Patagônia e procurar por ele. Mas não poderia, não poderia colocar o bebê em risco, e afinal, que diferença faria? Porque ela se achava mais capaz de encontrá-lo do que as dezenas de pessoas especializadas nisso que estavam percorrendo aquelas montanhas atrás dele? Não, o melhor a se fazer era esperar. Mas esperar era terrível. E se não o encontrassem? E se ele tivesse se ferido? Ou pior: e se o encontrassem morto?

O segundo dia fora de esperança. Ainda não era tarde demais para encontrá-lo, ele conhecia todas as técnicas para sobrevivência na neve, ele amava as montanhas, ele estaria bem. A nevasca ainda não tinha dado trégua e isso atrapalhava as equipes de buscas, mas logo o encontrariam. Logo o encontrariam, e ele estaria bem, e logo estaria em casa, com ela e com o bebê. Eles iriam todos ficar bem.

As lágrimas há muito já haviam secado, suas glândulas lacrimais aparentemente incapazes de produzir mais daquele líquido. Sua mãe insistia em tentar alimentá-la, e ela só conseguia sentir a bile subindo por sua garganta ante a simples menção de comida. Não, ela não conseguiria comer. Mal conseguia respirar, como iria conseguir comer?

Seu celular tocou insistentemente ao longo dos dois dias, mas ela também não conseguiria atender, então entregou-o para Tony. Ele lidaria com isso. Ela sempre pode confiar nele, como amigo, como assistente, como suposto namorado. Tony sempre a salvava.

Por mais que as equipes de PR estivessem conseguindo encobrir o acontecido, seu círculo mais próximo de amigos já estava sabendo, e como nenhum deles sequer desconfiava do relacionamento dos dois, não faziam ideia de como ela estava lidando com a situação, e a bombardeavam com perguntas, que Tony respondeu com todo o cuidado. Ele sim, sabia de tudo. Desde o dia em que Cait e Sam se conheceram no fatídico bar, até a noite em que finalmente se declararam. Ele sabia dos abortos, e da gestação atual, sabia do passado de Cait como modelo e acima de tudo, sabia que ela estava destruída.

Sabia que ela se culpava por não ter se despedido dele antes de ir, por não ter desejado sorte, por não ter dado um último beijo, por não ter pedido que ele não fosse. Sabia que ela se culpava por ter escondido sobre o bebê. Somente Tony e sua mãe, Annie, conseguiam entender a profundidade da dor que Cait estava sentindo, do desespero e de suas tentativas falhas de manter a esperança.

O terceiro dia trouxe o torpor. Ela não sentia mais nada. Não sentia fome, não sentia sede, não sentia dor, não sentia nada. Ela apenas existia. Uma casca vazia, isso que ela era.

Kiss meWhere stories live. Discover now