Capítulo 39 - 21 de janeiro de 2019

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Num momento eu estava naquele lugar escuro e quentinho que chamei de casa, no outro eu senti uma coisa estranha e depois, as mãos fortes do meu pai me tocando dentro da água, me segurando com carinho. Então eu senti ela, pela primeira vez, eu a senti. Senti seu cheiro, seu calor contra meu corpo e soube que aquela ali era minha mãe. Aproveitei o quentinho de seu colo por um tempo, sentindo o ar correndo por meus pulmões, cortando minha garganta num grito forte, alto, que logo controlei, transformando num chorinho baixo, e por fim, fiquei quietinho. Abri os olhinhos lentamente, e tudo que vi foi o sorriso dela, do tamanho do mundo, me olhando com tanto afeto, com tanto esmero, que eu soube que seria a criança mais amada desse mundo.


20 horas antes...

O relógio no criado-mudo marcava 02h52 quando a terceira contração passou. Ela tinha conseguido contar trinta segundos daquela cólica intensa, apenas quinze minutos entre uma e a outra. Respirou fundo, encarando a poça de líquido amniótico a seus pés e então fez a única coisa racional que qualquer mulher em trabalho de parto poderia fazer:

— SAM! — gritou, a voz rouca. Ele apenas se virou na cama, ressonando naquele sono despreocupado — Sam, acorda! — chamou novamente, se aproximando da cama e dando um cutucão na perna dele.

— O que foi? — ele perguntou, os olhos ainda fechados, mais dormindo do que acordado.

— Minha bolsa rompeu — ela disse, percebendo então que tinha acabado de molhar o quarto todo.

— A sua o quê? — ele abriu um dos olhos. O quarto estava escuro, fracamente iluminado pela luz acesa do banheiro.

— A minha bolsa — explicou, começando a ficar impaciente — Vamos Sam, acorde! O bebê vai nascer!

— O bebê... O bebê! — então ele arregalou os olhos e levantou num salto, quase escorregando no chão molhado — Está tudo bem? — perguntou, esticando o braço para tocá-la, mas abaixando em seguida. Ele tinha lido muito, perguntado para todos os amigos que já tinham filhos, conversado com a doula, mas nada nesse mundo poderia tê-lo preparado para aquele momento.

— Está tudo bem — ela afirmou, segurando a mão dele — só preciso de um banho, estou molhada e começando a ficar com frio...

— E o que precisa que eu faça? — perguntou, enquanto vestia uma calça folgada e uma camiseta puída.

Ela instruiu ele a ligar para a doula, para a parteira e também para a Dra Carina, enquanto ia para o banho. As contrações vinham a cada quinze minutos, e ela sabia que isso poderia ainda se estender por horas, então aproveitou o banho, sentindo a água quente escorrer por suas costas, relaxando seus músculos. Quando saiu do banho, percebeu que Sam estava parado à porta do banheiro, encostado no marco da porta, tentando parecer despreocupado.

— Elas estão vindo — ele disse, pegando a toalha e ajudando-a a secar as costas — Mas disseram que podem demorar um pouco, porque a neve está muito forte.

— Está nevando? — Cait perguntou, não tinha aberto nenhuma janela, nenhuma persiana desde que acordara, então não fazia ideia das condições climáticas atuais.

— Tudo branco lá fora — informou, indo até a janela e puxando a persiana, revelando o jardim congelado, a neve sendo carregada por lufadas de ar, começando a se amontoar no parapeito da janela. Ela observou boquiaberta.

— Que belíssimo timing, ein? — falou olhando para a barriga, enquanto Sam a abraçava por trás. Ficaram ali, observando a neve cair até a próxima contração. Mesma duração, mesma intensidade, mesmo intervalo. Pelo visto ainda teriam tempo.

Kiss meWhere stories live. Discover now