58| Queimaremos Juntos

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Liz relaxou. Sentiu o corpo flutuando sobre a superfície da água, apesar de uma parte sua ter consciência de que não havia líquido algum ao seu redor. Era uma sensação nova e incrivelmente boa. Foi envolvida por uma sensação de dormência. 

Um nevoeiro rondava sua mente, ofuscando qualquer vislumbre de raciocínio, no entanto, no fundo ela conseguia ouvir ruídos, soando desconexos, parecendo vozes. Derramem o sangue dela no cálice. Liz não tinha certeza se a voz vinha de algum lugar externo ou da própria cabeça. Não. Ouviu um timbre familiar. Não vão machucá-la.

— Mantenha-se calmo. Será apenas um corte em cada uma das palmas das mãos. — disse a primeira voz, soando mais clara e audível do que antes.

— Então deixe que eu mesmo faço, me dê o atame.

Uma risada forçada.

— Que garantia eu tenho que você não vai tentar algo?

— Está com meu irmão, qualquer tentativa minha e você pode matá-lo. Do que ainda tem medo? — A pergunta soara como um desafio.

— Afastem-se cinco passos da garota. — disse a voz. Liz ouviu passos. De repente sentiu seus braços leves, como se estivessem afundando. — Vitor, entregue-me o cálice e o atame.

Mais som de passos.

— Aqui estão, monsieur.

Liz pressionou as pálpebras. Uma força contrária impediu seus olhos de abrirem.

— Derrame sangue até encher...

— Você não me dá ordens. — cortou-o. — Eu sei o que fazer.

Liz ouviu alguém caminhar em sua direção. Um aperto firme em sua mão esquerda despertou uma onda de eletricidade por toda a extensão de seu braço, que logo se propagou para todo o corpo.

— Estou te fornecendo o pouco de energia que me sobrou. — disse a voz, sussurrando bem próximo ao seu ouvido, provocando-lhe arrepios.

Sentiu a própria consciência se manifestar como uma mão puxando-a de um abismo.

— Raffe.

Forçou-se a manter os olhos fechados, no entanto pôde sentir claramente uma plateia a observando. Apertou a mão de Rafael contra a sua. Sentiu a respiração dele contra seu pescoço, desregulada. Cheirava a queimado, terra e sangue.

— Não diga nada. Faça de conta que ainda está drogada e aguarde meu sinal. O anjo aí dentro vai saber o que fazer, acredito em você. Pense como eu pensaria.

O quê? Sua parte consciente protestou. Parecia perdida em um sonho. Ela apertou a mão dele com mais força, sentindo os ossos de suas juntas.

— E você? — sussurrou movendo os lábios o mínimo possível.

— Confia em mim não confia?

Ela não disse nada. Não precisava dizer.

— Vamos logo com isso. — disse outra voz, cortante como vidro.

— Desculpe por isso, Lizzy.

Então Liz sentiu um metal deslizando pela palma da sua mão esquerda acompanhado de um ardor. Uma queimação se calcorreou toda a área, sentiu os dedos palpitarem. Se deu conta do quão profundo fora o corte quando uma enorme quantidade de sangue emanou da fenda, fluindo quente por entre seus dedos.

Mordeu os lábios, mantendo a cabeça abaixada. Rafael não poderia fazer aquilo por mal, ela quis acreditar nisso, mas algo no fundo da mente insinuava que se arrependeria de confiar nele.

As Doze Luas - Filhos do AlvorecerWhere stories live. Discover now