ANDANDO POR terras diferentes, vendo arvores com frutos que não pareciam ser comestíveis pensando em coisas que ainda não tinha pensado sentou-se numa pedra e disse para si mesma:
‘’Lembro-me de várias vezes, em que olhei no espelho e não vi eu mesmo, vi uma alma sem face, uma que não se descreve, que é pior que a água, só se sabe dizer que sou eu.
Sinto-me como as nuvens que não dependem do Sol para estarem no céu. Eu penso na vida e vejo que ela melhorou, eu agradeci, mas será que eu mereço isso?
Nem todas as histórias descrevem muito bem a vida, mas apenas tentam. ’’
Francisquinha derramou apenas uma lágrima, levantou e continuou a andar.
~~~~~~ ∙ ~~~~~~
Chegando a casa sua tia tinha lhe preparado água quente para tomar banho. A água escorria pelo seu corpo como se seu corpo fosse uma cachoeira de água doce que molha as pedras e ainda nos intriga a pensar de onde vem tanta água.
Mais uma vez pegava a água com a cuia e jogava no seu corpo quente e sentia o frescor e percebia que estava pura.
Encostou suas costas na parede gelada e por alguns instantes acreditou não estar onde estava.
Abraçou a si mesma e foi como um anjo acolhendo algum animal em apuros. Fechou os olhos.
Chorou.
E nem por isso foi pecado.
Enxugou-se, a fina toalha parecia mais um pano de seda de algum rei da Europa, passava as mãos nos objetos e sentia a poeira, levava ela ao nariz e logo após espirrava. Repetia isso num ciclo vicioso como se isso a tornasse viva, mas era só para passar o tempo.
Enquanto colocava a roupa o papel caiu. Pegou ele, olhou, dobrou e escondeu dentro das mãos.
- Achei que não iria sair. A água estava tão boa assim? – a tia de Francisquinha disse de costas enquanto fazia alguma coisa que não dava para enxergar.
- A água de qualquer jeito é boa. – Francisquinha levou os braços às costas e disse enquanto olhava para o chão. – O que a senhora está fazendo? – a tia se virou, olhou para Francisquinha e disse:
- Ande, venha me ajudar. Corte essa cebola. – estendeu a mão e nela estava uma cebola pequenina e uma faca de serra que era duas vezes o tamanho da cebola. Francisquinha sentou-se à mesa e descascou,
- Sabe que eu odeio descascar cebolas.
- Sabe que eu odeio saber o que você odeia e acho que está na hora de você ir para a escola. Pegue pão no cesto e corra para não se atrasar.
Francisquinha levantou-se bruscamente e o papel foi ao chão. A tia olhou para ele e reconheceu a letra masculina. A letra que arrancava suspiros a cada carta que recebia. Continuou a olhar até que Francisquinha agachou e pegou do chão. Foi como se tivessem arrancado seu coração, apertado num quebra nozes e ainda conseguisse sentir todo o aparato, toda a dor, como se ainda estivesse dentro de si.
Francisquinha percebeu e ainda por cima notou que aquilo mexia muito com a sua tia.
~~~~~~ ∙ ~~~~~~
A casa em si trazia o cansaço. Era sozinha para cuidar dela e das meninas então quando o Sol dava aquele pequeno descanso se tornando mais fraco a tia de Francisquinha se sentava e descansava.
Ainda sentada encostou sua cabeça na parede e nisso relaxou seu corpo todo. Estava estirada de tal maneira impressionante que até beneficiava suas curvas e feições. O corpo um pouco magro, mas ainda saliente. O cabelo com alguns fios brancos em que ela escondia com o lenço. Os dedos cansados. Os pés rachados. Mas ainda era uma bela mulher.
Estava ainda sentada, descansando quando alguém bateu a porta.
- Petúnia, adotei uma criança.
![](https://img.wattpad.com/cover/16776164-288-k66308.jpg)
BINABASA MO ANG
Francisquinha
Non-FictionCom a morte da mãe, Francisca vai morar junto com a sua tia e primas na Bahia. Vive uma vida difícil regada de mentiras e segredos. No auge da sua caminhada uma descoberta e feita e isso muda todos os planos da menina simples do sertão. O livro Fran...