Nevasca

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15 anos antes:

***Luna

Eu estava voltando de uma das minhas poucas idas até o centro da cidade. Uma das mais severas nevascas que eu me lembrava, atingia a região naquela época do ano.

Meus pés afundavam na camada de neve fofa, que já havia se acumulado acima do solo. Estava cada vez mais difícil caminhar. Eu mal conseguia enxergar um palmo à frente do meu nariz.

O branco tomava conta de toda a paisagem. Tudo que eu queria, era chegar logo na segurança e no aconchego da minha simples cabana.

Nenhum humano à vista, nenhum de seus veículos... Só neve e mais neve...

Eu tentava me manter aquecida com os trajes que eu tinha. Minhas mãos já haviam começado a ficar dormentes, assim como todo o meu rosto.

Comecei a observar as coisas ao meu redor. Queria ter certeza de que não havia realmente ninguém me observando. Minha intenção, era encontrar uma árvore e me teleportar até meu carvalho... O carvalho que ficava no centro da minha cabana.

Estava totalmente focada no meu objetivo. Virava minha cabeça para todas as direções, tentando enxergar alguma coisa.

Concluí que, estava sozinha naquela imensidão gelada. Mordi meu lábio inferior, já não o sentia mais.

Apertei o passo para tocar uma árvore próxima, foi quando tropecei em algo e caí de joelhos. Amorteci minha queda usando minhas mãos como apoio.

Lentamente, me virei para olhar contra o que meus pés haviam se chocado. Parecia uma grande e rígida montanha de neve.

Me aproximei ainda mais para observar melhor. Estava difícil enxergar com toda aquela neve e ventania.

Engatinhei até "àquela montanha de neve". Com a mão direita, comecei a limpá-la...

Percebi que se tratava de uma silhueta humana. Um homem, para ser mais exata.

A primeiro instante, fiquei totalmente assustada. Não sabia o que fazer... Deixá-lo ali? Ele poderia morrer... Levá-lo comigo? E se ele ao acordar fizesse alguma maldade?

Dúvida cruel... Para alguém que estava acostumada a viver sozinha, essas perguntas eram cruciais.

Eu estava assustada e com medo. Queria ajudá-lo, mas temia que ao acordar, ele não entendesse meu estilo de vida, e isso acabasse causando alarde entre os outros humanos.

Levantei-me bruscamente... Comecei a caminhar de um lado para o outro, próximo ao corpo daquele homem.

Bastante inquieta, sussurrava para mim mesma:

E agora, Luna? O que você vai fazer???!!! Leva ele com você???!!!

Engoli em seco. Seja lá qual fosse a minha decisão a ser tomada, eu teria de fazer rápido... Talvez a vida daquele homem dependesse de mim.

— E então, Luna???!!! Leva ou não leva???!!! — Eu coloquei uma das mãos na boca, mordendo o meu dedo indicador sobre a grossa luva de lã.

Parei e fiquei fitando aquele corpo totalmente inanimado por mais alguns instantes. Dei um profundo suspiro, senti o ar gélido fazer com que minhas narinas ardessem, a seguir, soltei:

— Talvez eu possa me arrepender depois, mas não posso deixá-lo aqui...

A seguir, caminhei até o homem, arqueei meu corpo para a frente, segurei em seus braços, e comecei a arrastá-lo para perto da árvore mais próxima.

Enquanto eu executava tal ação, percebi que aquela pessoa era muito maior do que eu. Com certeza quando aquela figura estivesse de pé, me deixaria acuada...

Aquele era mais um motivo para eu temer. Estava levando para o meu refúgio, uma pessoa que tinha quase o dobro do meu tamanho... Se quisesse me fazer algum mal quando acordasse, eu não teria a menor chance.

Mas minha alma bondosa falava mais alto naquele momento. Eu não podia deixar uma vida se perder daquele jeito, no meio daquela imensidão gelada.

Consegui me aproximar da árvore arrastando o homem, com muita dificuldade. Em seguida, toquei o tronco da mesma, fechei os meus olhos, e então, sussurrei:

— Leve-nos para casa, por favor!

Quando voltei a abrir os meus olhos, eu já estava com a mão apoiada no troco do carvalho que ficava no centro da sala da minha cabana.

O ambiente era aconchegante e havia muitas plantas dispostas. Toda a mobília, assim como o teto, paredes e assoalho, era feita de madeira. Em um dos cantos daquela sala, ficava uma grande lareira que mantinha todo o cômodo aquecido... A primeira coisa que me passou pela cabeça, foi arrastar o homem até próximo da mesma.

Deixei-o ali... Percebi que a neve que o cobria, começou derreter.
Peguei um pano que havia pendurado no encosto de uma cadeira, me abaixei próximo a ele, e comecei a secá-lo.

Passei o pano pelos cabelos, depois pelo rosto... Quando, enfim, sua face ficou totalmente visível, pela primeira vez notei que se tratava de alguém jovem... Era um rapaz, muito bonito.

Consegui ter ainda mais noção do quão alto ele era. Seu corpo aparentava ser bem torneado. Ele usava uma camisa branca bem fina, que estava molhada e colada ao seu tórax. Era possível ver a protuberância de seus mamilos, seu peitoril largo, os "gomos" de sua barriga.

— Não me admira estar quase morto... Usando essas roupas neste frio! — Fiz uma careta voltando a olhar para seu rosto. — O que faz por estas bandas, hein, garoto?

A palidez do rapaz estava começando a me deixar preocupada. Comecei a pensar que ele estava morto. Peguei todos os edredons e mantas que eu tinha disponíveis, e dei um jeito de cobrí-lo.

Antes, eu tive que tirar toda a sua roupa molhada. O que foi constrangedor... Ver um total desconhecido nu. Não era algo do meu feitio. Pelo menos era o que eu imaginava.

Depois de todo o demorado e desajeitado processo, eu estendi suas roupas por cima da lareira para que secassem.

Só a cabeça do rapaz estava para fora daquele embrulho totalmente desajeitado que eu fiz. Eu torcia para que nada de ruim o acontecesse. Se eu tivesse que me livrar de um cadáver de um completo desconhecido, com certeza eu me sentiria muito mal... A pior das criaturas.

Sentei-me em uma cadeira próxima, inclinei o meu corpo para a frente, e fiquei observando aquele jovem que nem se mexia... Aquele rosto pálido, aquele cabelo quase tão branco quanto a neve... Aquele semblante misterioso...

O Belo e O Fera: Herdeiro do Mal; Batalha dos Imortais [Livro 4]Where stories live. Discover now