Incapaz

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***Rafael

Minhas batidas na porta eram urgentes. Já faziam alguns minutos que eu me encontrava de pé do lado de fora do quarto que Luna havia passado a noite. Com a explicação de Beatriz naquela manhã, eu não encontrei muita dificuldade para chegar até ali.

Minha amiga não respondia e continuava a deixar-me sem qualquer resposta. Confesso que, comecei a me preocupar. Luna nunca havia sido do tipo que dorme profundamente. Sempre teve um sono muito leve.

— Luna! — Berrei, enquanto continuava  a esmurrar, de forma bastante grosseira, a porta do quarto. — Está aí?! Consegue me ouvir?!

Silêncio. Nenhuma resposta vinha do outro lado da porta.

Afastei-me um pouco, passei as duas mãos sobre o rosto com certa força. Minha calma havia se esvaído, completamente, a algumas investidas atrás.

— Por que ela não responde?! Será que aconteceu alguma coisa?! — Resmunguei com a voz baixa.

Ouvi passos leves, vindos de uma das extremidades do corredor. Quando virei-me para averiguar de quem se tratava, avistei um homem já de meia idade, vindo naquela direção. Ele tinha alguns fios de cabelos grisalhos, pele alva e uma discreta barba por fazer emoldurando seu rosto redondo. Ele aparentava ter alguns centímetros a menos do que eu. Usava um sobretudo preto por cima de uma camisa branca de botões... Na parte de baixo, ele usava  e calça social... Seu andar era gracioso.

Assim que se aproximou da porta do alojamento, onde eu permanecia totalmente inquieto, ele me encarou com um olhar bastante preocupado e perguntou:

— Precisa de ajuda, rapaz? Notei que parece um tanto perdido... Inquieto, talvez?...

— Não estou perdido. — Balancei a cabeça negativamente, de forma frenética.

— Qual é o problema, então? — Ele parou bem próximo à porta, cruzando os braços logo em seguida.

— É que a minha amiga dormiu aí dentro... — Apontei para a entrada. — Mas estou tentando acordá-la já faz um tempo, e até agora não obtive resposta alguma. Estou preocupado que possa ter acontecido algo a ela!

O homem deu um meio sorriso. Revirou os olhos e disse, tranquilamente:

— O que pode ter acontecido de mal a ela dentro dessas paredes, meu jovem? Estamos em um local bastante seguro.

— Eu... — Hesitei a princípio. — Não sei! Só que é muito estranho ela não me responder! Ela não costuma ter sono pesado... Esse é o motivo de minha preocupação!

— Ah! — Ele deu-me as costas e mirou a porta. — Já que está tão preocupado com sua amiga, devo ajudar-lhe.

— Pode mesmo fazer alguma coisa para me ajudar?! — Perguntei, bastante ansioso.

— Mas é óbvio, meu caro... Sem problema algum!

Ao terminar de falar, ele apenas ergueu a mão direita em direção à porta e sussurrou alguma palavra que eu não consegui ouvir claramente. Imediatamente, pude ouvir um estalo e a mesma entreabriu.

Lentamente, o homem virou para a minha direção, deu uma piscadela e disse calmamente:

— Prontinho! Pode ir ver como está sua amiga... Se precisar de mais alguma coisa, é só me chamar. Estarei lá embaixo, tomando café da manhã.

— Muito obrigado, mesmo, cara! Tu não sabe como me ajudou! Eu já estava cogitando arrombar a porta! — Agradeci.

— Não foi nada! Disponha. — Com muita calma, ele começou a se afastar.

— Espere! — Gritei.

— Sim? — Ele parou, deu meia-volta e me encarou atentamente.

— Como se chama mesmo? Não me lembro de já ter te visto por aqui.

— Pode me chamar de Augustus. — Ele abriu um largo sorriso.

— Prazer em conhecê-lo, Augustus. Meu nome é Rafael.

O homem, apenas assentiu e se afastou lentamente, seguindo em direção ao fim do corredor, onde ficava a escada que dava acesso ao andar térreo.

Assim que o simpático e prestativo, porém misterioso e reservado desconhecido desapareceu de meu campo de visão, imediatamente empurrei a porta do quarto e adentrei o local com bastante pressa.

Notei que o ambiente ainda estava bastante escuro, por esta razão, acendi as luzes antes de fechar a porta atrás de mim.

Quando olhei para a cama, notei algo como um pacotinho delicado, envolto em um grande edredom de cor verde claro. Deduzi que minha amiga estava ali embaixo.

— Que estranho... — Sussurrei e caminhei, lentamente, até uma das bordas da cama.

Sentei na beirada do lado esquerdo do colchão, segurei a ponta do edredom que cobria totalmente a cabeça da minha pequena amiga, e puxei com bastante cuidado.

Confesso que foi quase que inevitável não ficar surpreso com aquela visão.

Luna, estava com a aparência menos humanóide. Seus cabelos, que sempre pareceram ter vida própria, se moviam de forma menos graciosa. Seus cílios, estavam muito mais longos do que eu me lembrava. Em sua testa, havia uma sombra estranha, algo novo para mim... Algo que eu nunca tinha visto antes.

Engoli em seco e arregalei os olhos. Mesmo após eu ter movido o edredom, Luna continuava em um estado de sono profundo. Sua respiração parecia estar pesada e lenta. Minha preocupação aumentou ainda mais.

— O que houve contigo, minha amiga?! — Sussurrei, já me pondo de pé.

Com bastante cuidado, comecei a puxar o restante do edredom que cobria o corpo da moça revelando-a, assim, por completo.

Luna usava um short de seda que ia até a metade da coxa. Foi impossível eu não notar como estavam suas pernas a partir do joelho até seus dedos dos pés... Era como se ela estivesse usando uma maquiagem muito realista, que dava um aspecto amadeirado a sua pele... Algo semelhante a um tronco de árvore, para ser mais objetivo.

Totalmente confuso, ajoelhei-me ao seu lado sobre o colchão e comecei a sacudí-la, na tentativa de lhe fazer acordar.

— Luna! Luna! — Eu ergui o tom da voz. — Está me ouvindo?! Acorda, Luna!!!

Novamente, não consegui qualquer resposta. O desespero começou a me invadir ainda mais, de uma forma avassaladora.

— Luna!!! Luna!!!

Eu estava totalmente desestabilizando. Não conseguia pensar em nada para ajudar a minha amiga. Tinha medo de pedir ajuda a qualquer outra pessoa desconhecida, e revelar a identidade de Luna para quem não devia. Eu estava paralisado pelo medo... Não queria arriscar colocar a segurança de alguém tão precioso para mim em risco... Eu não podia deixar que outras pessoas soubessem de seu segredo, antes que ela recuperasse suas memórias perdidas.

Me vi em um beco sem saída... O que eu poderia fazer sozinho para ajudá-la...? Como eu a tiraria daquele quarto, sem sermos notados? Eu precisava que Beatriz voltasse logo... Eu sabia que a Mor havia saído do castelo para resolver algum assunto urgente de última hora... Se nossa amiga demorasse muito mais, eu tinha medo que algo terrível pudesse acontecer à Luna.

Se algo de ruim acontecesse a minha pequena amiga, eu nunca conseguiria me perdoar por ser tão impotente... Impotente, era assim que eu estava me sentindo diante daquela situação tão inesperada. Eu sequer sabia, o que de fato estava acontecendo com Luna. Eu estava me sentindo um merda totalmente incapaz de ajudá-la.

O Belo e O Fera: Herdeiro do Mal; Batalha dos Imortais [Livro 4]Onde histórias criam vida. Descubra agora