O Sufocar

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***Luna

Após poucas horas, desde o início de tanto desespero, dor e agonia, enfim as coisas pareciam estar ficando menos conturbadas naquele lugar.

Eu havia abandonado o grande salão, precisava ficar a sós comigo mesma por algum tempo, pois havia muito no que pensar... Muito a digerir.

Perambulando pelas adjacências do castelo, me deparei com uma escadaria que dava acesso ao que parecia ser o subsolo. Como não havia ninguém por perto, segui caminho por ali, na esperança de encontrar um local mais isolado e longe de qualquer agitação.

Quando terminei de descer os degraus, me dei conta de que já havia estado ali antes. Se tratava da biblioteca onde, Rafa e eu, havíamos conversado com Beatriz pela primeira vez sobre minha verdadeira identidade... Foi ali onde toda a minha jornada em busca por respostas traumáticas, realmente, começou.

O ambiente entrava a meia luz. O silêncio era, de certa forma, desesperador para alguém que tinha tantos pensamentos perturbadores em mente. Assim que avistei uma poltrona, minha primeira reação foi acomodar-me nela. Uma avalanche de lembranças me soterrou... Me sufocou.

Só quem passa por uma experiência traumática de abuso sabe como é. Você se sente sujo, violado, culpado... Sim. A vítima nunca tem culpa pelo que lhe acontece, mas acreditem: nós nos culpamos sim, de certa forma.

Muitos sentimentos são diferentes uns dos outros. Cada pessoa reage de uma forma totalmente distinta, porém, todos os caminhos levam à traumas sufocantes.

No meu caso, eu me sentia culpada por ter sido tão vulnerável e frágil... Me sentia culpada por não conseguir me defender... Isso era o que mais estava me causando tanta dor e agonia.

Ânsia de vômito...

Sei que nem todo mundo consegue suportar, e por essa razão, acaba tirando a própria vida ou até mesmo adquirindo problemas psicológicos de leves a graves... O medo de contar para alguém e ser visto como errado ou errada da história assombra um minuto após o outro.

Sim. Há pessoas que julgam-nos das piores formas possíveis. Isso vai nos matando por dentro cada vez mais.

Apoio de pessoas próximas, com quem você possa confiar incondicionalmente, é essencial. Mesmo que seja difícil, é preciso ter voz... Coragem.

Comecei a entender que... Eu ter perdido minhas lembranças, havia sido uma coisa boa. Eu não lembrar daquilo tudo era bom, de certo modo. Eu não estaria isolada, na biblioteca, sendo sufocada por lembranças dolorosas se eu não tivesse lembrado de tudo.

Eu sei que algumas dores e lutas são inevitáveis, mas se eu pudesse... Optaria por esquecer eternamente os danos que Pavel me causou no passado. Tal dor, eu não desejaria nem para o pior inimigo. Essa angústia insistiria em me perseguir até o meu fim... Disso, eu tinha total certeza.

Senti a angústia em meu peito só aumentar cada vez mais. Era como se um animal vivo, estivesse tentando abrir minha caixa torácica com a intenção de pular para fora. Meu coração acelerou. Não consegui conter as lágrimas, que rolaram fartas pelo meu rosto.

Inclinei o meu corpo para a frente, apoiei os meus cotovelos sobre os joelhos e cobri meu rosto com as mãos. Me rendi àquele choro sentido, amargurado, doloroso e carregado por traumas que eu sentia que jamais conseguiria superar. Naquele instante, abominei ter uma vida tão longa.

***

Ouvi passos.

Acho que chorei tanto, que acabei me rendendo ao sono por algum tempo. Quando abri os meus olhos, notei que os mesmos estavam pesados demais. Era impossível não sentir uma sensação de inchaço nos mesmos.

O Belo e O Fera: Herdeiro do Mal; Batalha dos Imortais [Livro 4]Where stories live. Discover now