43. Feliz Natal

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Rio de Janeiro, Brasil21 de dezembro de 2020, 4:00PM

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Rio de Janeiro, Brasil
21 de dezembro de 2020, 4:00PM

— Dengo, vai me deixar no estúdio e vai pra casa dos seus pais?

Perguntei descendo as escadas de casa. Ele estava deitado no sofá jogando videogame e fez isso o dia todinho e eu nem interferi ou reclamei. Depois do que aconteceu ontem durante o jogo ele tem ficado assim, não fala com ninguém, não atende o telefone ou se quer responde as mensagens de whatsapp, eu passei o dia todo tentando fazer ele falar ou comer, tentei conversar com ele sobre o assunto mas não me falou e ver ele assim me machuca demais. Eu preciso do meu noivo de volta, do meu sorriso, do meu abraço, eu preciso do meu melhor amigo.

Passei o dia todinho respondendo o whatsapp dele, atendendo as ligações de advogados, dele, meus e do Flamengo, falando com assessoria de imprensa dele e com os nossos amigos. Livia e Will eram sem dúvidas as mais preocupadas, a cada uma hora elas mandavam mensagens perguntando como estava tudo por aqui e a minha única resposta era: silêncio. A minha casa se encontrava em um enorme silêncio nunca visto por aqui.

Se eu pudesse sentir toda a dor dele eu passaria pra mim, eu não sinto a dor que ele sente. Eu nunca sofri racismo, eu nunca fui olhada dos pés à cabeça quando entrava em algum estabelecimento, nunca desconfiaram de mim em algum ambiente ou muito menos me tiraram de algum lugar pela minha cor de pele. Mas ele sim. Mesmo depois que ficou rico isso ainda vem acontecendo e eu sei que a luta dele é pela Giovanna, pelos sobrinhos, pelos nossos filhos que mesmo com uma situação financeira muito boa podem sofrer qualquer tipo de racismo. E essa luta não é só dele, é minha também. Eu quero e eu preciso dar um mundo melhor para os meus filhos, um mundo onde haja mais amor e menor ódio, um mundo onde finalmente todos percebam que a cor da pele não faz ninguém inferior.

Eu pensei em todas as formas de fazer ele se animar hoje, desmarquei tudo que eu podia da minha agenda mas acabei deixando a tatuagem e depois de uma longa conversa com os meus sogros no telefone eles inventaram um churrasco que ele finalmente topou.

Percebi que ele não me deu um pingo de atenção então eu fui buscar a minha bolsa, calcei o tênis e quando estava oficialmente pronta parei em frente à televisão.

— Vamos?

— Vamo, amor. Deixa só eu terminar essa partida aqui, dá licença aí.

Foi preciso mais uns dez minutos esperando ele terminar a tal partida do jogo, isso me irritava mas me confortava saber que na casa nova só seria permitido jogar na sala de jogos e sem gritos. Regras.

Assim que o jogo terminou ele voltou a prestar atenção em mim. Mas nem foi preciso dizer alguma coisa ele só pegou uma camisa e a carteira e em menos de dez minutos nós já estávamos no meu carro no mesmo silêncio de casa, pelo menos agora ele cantava a música que eu tinha escolhido enquanto eu mexia no cordão dele.

MEU ABRIGO | GERSON SANTOSWhere stories live. Discover now