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Coringa🎭

Um mês depois e eu comecei a ter o que metade do pessoal ali tinha. Na manhã anterior eu tinha finalmente colocado o pé fora da cela e ganhado um tempinho no banho de sol.

Não deu pra muita coisa, mas pelo menos o tempo passou e eu acabei trocando papo com um pessoal que tava na mesma situação que a minha, e por outras vezes troquei olhares e recebi ameaças também mandando de volta.

Aquilo não foi suficiente pra mudar o mal humor que eu tava, mas quando lembrei que tinha o direito de escrever uma carta e no dia seguinte eu iria conversar com o Advogado, acabei sentindo a tranquilidade no meu coração.

Quando voltei pra cela, sem pensar demais comecei a escrever a carta e com certeza a primeira seria para a Lua.

Pô, com a saudade que eu tava nem demorei. Comecei a escrever o que tava guardado dentro do meu coração, falei o quanto tava com saudade dela e mesmo antes de terminar senti as lágrimas nos olhos e sem aguentar controlar deixei cair sabendo que aquilo era só o começo.

Eu tava a mó cota sem saber o que era dormir tranquilo, só conseguia fechar os olhos quando o bagulho começava a ficar automático.

De 16 e mais alguns meses que eu tinha recebido nas costas, um mês já era o suficiente para provar que eu não tava aguentando mais ficar ali.

Deitei na cama como uma opção que tinha ali e fechei os olhos tentando relaxar. Sinceramente comecei a pensar em maneiras de meter o pé dali e meu pensamento foi interrompido com o barulho no portão da cela.

Abri os olhos sabendo que se tratava da comida pelo cheiro enjoado e levantei pegando o prato. Sem vontade nenhuma de comer, passei a comida para o lado e voltei para o meu lugar.

•••

Pô, eu só sabia que tinha amanhecido por conta do barulho que o portão fazia quando começava a abrir as celas.

Naquele dia eu teria um encontro com o advogado, a rotina ali era curta. Dois ou três banhos por dia, café da manhã, almoço e um mingau de cachorro como janta.

Fui tomar banho, em seguida comendo um pão feio com metade de um copo de café, escovei o dente na pia quase quebrada que tinha ali e sentei por alguns minutos antes de abrirem a cela com a algema na mão.

Me levantei já dando as costas colocando as mãos para trás e fechei os olhos sentindo a algema apertar e o otário falar algo baixinho antes de dar uma risadinha me arrastando para fora.

Pô, na maioria das vezes eu ficava calado pra não complicar para o meu lado. Mas era só pisar o pé do lado de fora que o bagulho iria complicar para o lado do primeiro que eu encontrasse!

Na frente de uma salinha eu me senti aliviado ao olhar na cara do doutor Marcos.

Marcos: Senhor, Diogo Menezes da Silva.-sentei na frente dele.

Coringa: Coringa pô, cê já trabalhou pra mim. Tá ligado que pode agir na amizade.-passei a mão aonde a algema tava e senti doer.

Marcos: Tô ligadão.-se inclinou.-Mas de começo tem que agir no profissionalismo.-concordei.

Coringa: Como tá a minha situação? Vou poder receber visita quando?

Marcos: Sua situação tá complicada, 16 anos e mais cinco meses não é coisa boa. De início posso tentar tirar os meses, e ao decorrer dos anos vou tentando tirar um, dois..dos seus dezesseis.

Coringa: Pô, tô te pagando maior dinheiro. Tenho três filhos, família, mulher grávida, mãe..e a última coisa que eu quero na minha vida é ficar recebendo elas e as minhas crias nesse lugar que eu tô.-ele concordou.-Sei que cê tá fazendo o que pode, fiz muito bagulho e vai ser foda sair daqui.

Marcos: É pelo motivo de cê tá ciente de todo o seu prejuízo, que você tem que parar de pensar demais. Não sei metade do que você tá sentindo, como você mesmo disse, você tem pessoas lá fora que querem o seu bem, e eu como profissional reconheço a sua preocupação e vou fazer o que posso pra te tirar daqui.

Coringa: Pô, faz o que for possível. Pelo menos tenta liberar as visitas.

Marcos: Esse problema já é mais complicado, vou fazer o que eu posso mas fique ciente que não vai ser tão cedo. Daqui a um ano ou até mesmo mais que isso, depende muito do seu comportamente já que o martelo foi batido pra mais de dez.

Pô, quando ele falou aquilo eu nem tive mais ânimo pra responder. Abaixei a cabeça respirando fundo e ele foi falando mais algumas paradas enquanto a minha preocupação só tava na visita.

Esperar um ano ou mais pra falar com a Lua a não ser por cartas, seria foda.

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Meu DestinoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora