Capítulo 20 - Era uma vez humanidade

1.7K 112 10
                                    

- Tem certeza do que está fazendo? - Jacob perguntou pela milhonésima vez.

Revirei os olhos novamente.

- Jacob, eu sei que isso é contra tudo o que você é, então por favor, me deixe fazer sozinha. - Já havia dito aquilo antes de sairmos de casa, mas a teimosia dele era grande demais, então ele veio comigo.

- Não é totalmente contra... Ele não é um bom humano, então...

Olhei para ele com um risinho nos lábios.

- Pensei que seu dever era para com todos os humanos. - Antes que ele pudesse responder dei um salto para longe, caminhando com os saltos batendo auditivelmente no asfalto molhado. A noite encobria meus olhos ainda vermelhos da minha futura vítima. Observei novamente para ver se não haviam câmeras de segurança próximas, mas estava tudo limpo.

Era um homem grande, um pouco menor do que Jacob. Um foragido da polícia, acusado de matar três jovens bêbados na saída de um bar e de traficar algumas drogas. A polícia não tinha nem ideia do que ele havia feito além disso, mas eu poderia imaginar com facilidade.

Seus olhos focaram em mim ao ouvir minha aproximação pisando propositalmente nas pequenas poças de água que existiam no caminho até ele. Jogou o cigarro que estava tragando no chão enquanto tentava fazer uma pose sensual.  Deplorável. Segurei o riso e foquei no cheiro do seu sangue. Ainda era puro, não havia bebido hoje.

- Docinho, o que uma boneca faz aqui desse lado da cidade? - Perguntou.

- Preciso de algo, podemos ir a um lugar mais reservado? - Eu era nova em caçadas, mas torcia para dar tudo certo. - Siga-me.

Caminhei para um beco a poucos passos de distância, saindo da vista dos poucos carros que passavam pela rua. Ele me seguiu de perto sem nem titubear.

- Querida, se for o que eu estou pensando, podemos ir para minha casa e - Prendi seu corpo na parede e tapei sua boca com a minha mão.

- Não grite, docinho. - Sorri sentindo minha garganta arranhar. Cravei os dentes na sua jugular, deixando aquele precioso líquido invadir minha boca. Seu corpo tensionou pela dor e minha mão abafou seus gritos enquanto ele ia perdendo as forças, amolecendo nas minhas mãos, completamente drenado. Suspirei profundamente sentindo o sangue ser absorvido pelo meu corpo. Aquilo era como uma droga.

    Joguei seu corpo sobre o meu ombro para poder descartá-lo. Corri rapidamente para a proteção da floresta e fui até uma toca de urso pardo que eu havia descoberto no dia anterior, o urso não estava lá agora, mas ia adorar o presente.

Jacob estava ao meu lado novamente, a expressão triste.

- Renesmee, acho que precisamos conversar. - Gelei. Primeiro porque ele nunca falava meu nome completo, segundo porque a voz dele demonstrava toda a decepção que já estava estampada no meu rosto, e terceiro porque quando alguém fala "precisamos conversar", nada de bom vem a seguir. - Você está tão diferente, Nessie, as vezes eu não consigo mais ver aquela menina que cresceu debaixo do meu nariz.

Sentei numa pedra próxima dele e suspirei fundo.

- Jake, eu não sou mais aquela garotinha. Eu nem consigo mais sentir minha parte humana como eu sentia antes... Eu sei que de certa forma é minha culpa minha família e amigos estarem nessa situação com os Volturi novamente e eu precisei amadurecer de uma forma que eu não imaginava... Não posso deixar que eles continuem em perigo constante.

- Nessie, você não precisa fazer isso, não precisa deixar sua humanidade se perder para ser forte. Você tem pessoas ao seu lado que fazem tudo por você e - interrompi sua fala

- É exatamente isso Jacob! - Joguei as mãos para o alto, cansada, escorregando da pedra para ficar de pé - Todos fazem tudo por mim, o tempo inteiro! Eu já sou uma mulher Jake, preciso ser madura e autosuficiente, mas dessa forma nunca vou conseguir, não com a minha família ainda me tratando como uma criança. Essa viagem me mostrou o quanto eu preciso evoluir, o quanto eu preciso conhecer além das nossas casas e da proteção deles.

Jacob semicerrou os olhos, captando o que eu disse entrelinhas.

- O que você está tentando dizer com isso? - Havia mágoa e dor na sua voz, sentia mesmo de longe seus músculos retesados como se estivesse se preparando para receber um soco. Me senti horrível com isso.

Suspirei novamente e sustentei seu olhar como precisava fazer.

- Depois do encontro com os Volturi eu vou embora por um tempo. Meus pais ainda não sabem, eu mantive meus pensamentos tão encobertos que não consegui pensar muito sobre. - Contei.

- Mas Alice sabe. - Ele constatou.

- Agora que eu tomei minha decisão ela deve saber. - Concordei.

Ele ficou em silêncio por muito tempo, tentando compreender por completo. Quando ele me encarou novamente seus olhos estavam cheios de dor, a mais pura dor, e eu me odiei por estar causando isso a ele.

- Eu não estou incluso nos seus planos. - Sua voz era um sussurro inaudível para os ouvidos humanos.

- Jake, eu preciso estar sozinha. Eu preciso provar para mim mesma que eu sou capaz do que acho que sou. Preciso errar e acertar sendo minha própria responsabilidade e de mais ninguém. - Seus soluços altos quebraram cada parte do meu ser e eu corri para o seu lado, apertando nosso corpos o máximo possível, inspirando seu cheiro tão delicioso. - Eu não estou desistindo de nós Jake. Eu sei que vai doer em nós dois, mas eu preciso disso. Por favor, Jake, compreenda.

- Quanto tempo? - eu mal conseguia entender o que ele falava.

- Eu não sei. - Espero que o mínimo possível.

     A decisão de ir sem ele era dolorida e quase me abria um buraco. Mas quando ele começou a aceitar que eu fizesse coisas que iam contra tudo o que ele defendia e acreditava - quando ele me viu matando humanos e não se manifestou - quando eu me alimentei DELE e ele não se manifestou, isso acendeu um alerta enorme na minha cabeça. Será que o imprinting era isso? Ser conivente com as minhas atitudes mesmo que isso passasse por cima dos valores dele? Seria dessa forma, abaixando a cabeça para o que eu fizesse? Isso não era benção, isso não era saudável. Para nenhum de nós dois. Eu não quero que meu parceiro seja mais uma pessoa que o tempo todo irá passar a mão na minha cabeça como uma menina mimada, porque não é essa a mulher que eu quero ser.

    Mil pensamentos brigavam entre si na minha cabeça sobre esse assunto que eu tentei abafar para que meu pai não escutasse, Jasper não sentisse e Alice não pudesse prever decisões antes do momento correto.

As lágrimas de Jake inundaram minha camisa e logo eu estava chorando tanto quando ele. Eu queria tanto que ele entendesse, mas não sabia como explicar ser magoar ainda mais. Seus braços agarrados em mim desfizeram meu coque e ele inspirou profundamente meu cheiro.

- Eu não posso deixar você ir. - Me beijou com tanto fervor que ficamos sem ar - Eu não vou deixar, Nessie. - Minha blusa já estava no chão - Por favor, eu vou com você.

Nós nunca havíamos nos amado daquela maneira. Havia dor, perda, desespero, urgência e tanta paixão que eu me sentia a ponto de explodir. Quando terminamos e ele me sentou em seu colo eu chorava copiosamente como nunca antes havia chorado. Ele me ninava como uma criança, balançando nossos corpos para frente e para trás repetindo incansável que tudo ia dar certo, que ele estava ao meu lado, que me amava.

- Precisamos voltar, sua mãe deve estar preocupada. - Ele disse quando eu finalmente me acalmei e me aninhei em seu peito, tentando respirar seu cheiro amadeirado que eu tanto amava.

Assenti levemente e me levantei para me vestir. Meus movimentos eram lentos como se eu não tivesse forças para fazer isso. Tomar essa decisão havia me drenado e por mais que fosse necessário, doía.

    As roupas estavam quase em trapos, mas ainda conseguiam cobrir o básico. Corri de volta para casa com os olhos do lobo castanho avermelhado fixos em mim. Eu estava me esforçando para ser madura o suficiente e saber lidar com essa distância da melhor forma para nós dois.

Quando estávamos nos aproximando, Edward e Alice vieram correndo na nossa direção com as piores caras possíveis. Pelo menos minha mãe não estava com eles, então provavelmente ela não sabia da minha decisão.

- Se você está pensando que vai sair por aí sozinha, mocinha, está muito enganada. - Alice bateu o pé.

- Você realmente pensou em Jacob, Renesmee? - A voz do meu pai era fria, seca - É essa dor que você quer causar a quem abriu mão de tudo pra você?

     Não seja injusto, é certo com ele o imprinting fazê-lo abaixar a cabeça para tudo? Mesmo se eu estiver indo contra toda a natureza dele? Pensei para meu pai. Ele não ia concordar, nada que eu falasse ele concordaria mesmo tendo razão e ele sabe que eu tenho.

- Ele compreende, pai. Ele sabe que eu voltarei, eu não estou indo embora dizendo que nunca mais ele vai me ver, que vai ser como se nunca tivesse me conhecido. - Eu vi a dor nos seus olhos pelo que eu disse, mas ele não iria jogar as culpas dos seus atos em cima de mim.

Jacob colocou a mão no meu ombro. Ele conhecia essa história.

- Não precisa falar assim com seu pai, Nessie. - Ele sussurrou no meu ouvido, mesmo sabendo que todos ouviriam.

- Você pode falar o que quiser Renesmee, me lembrar de todos os erros que cometi, mas você. não. vai. sair. por. . sozinha. - A voz dele enfatizou cada palavra e eu dei um risinho que o fez tremer de raiva.

- Eu já saí, pai. Peço que entenda, pois vou sair novamente. - Continuei caminhando e ele pegou meu braço.

- Aonde pensa que vai, mocinha? Nossa conversa ainda não acabou.

- Eu sei que não. Acho mais justo que a mamãe também saiba das minhas decisões, não vou sair como uma fugitiva.

Ele suspirou e concordou.

Vai ser uma longa conversa.

RenesmeeOnde histórias criam vida. Descubra agora