No início.

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Jonas Bencke

Vez ou outra alguns pesadelos retornam. Barriga cheia e um chão frio ajudam com isso. Deitado no meu tubo de ventilação predileto com Natan, o cara que  está  aprendendo a ver pessoas lindas. Fechei os olhos para que o tempo passasse e eles não nos encontrassem . Não  sei se é noite ou dia, mas algumas horas de sono não seriam assim tao ruim. Durante o sono a minha mente lembra sozinha do que eu desejaria esquecer. 

Estou com 6 anos. Estou brincando com Phelipe. Felipe é meu primo. Sempre brincamos juntos. Brincamos pelas construções. Brincamos de polícia e ladrão. Brincamos de sodados. Correndo pelas pedras. Correndo pelas casas. 

Subúrbio. Ainda em expansão. Brincávamos de guerra. Guerra com pedaços de madeiras que em nossa mente eram armas. As armas da guerra que todos tanto falavam, mas eu não vivi. Já diziam que haveria outra. Outra grande guerra chegando. Eu e Phelipe tinhamos que nos preparar. Chegamos em uma das casas que serviam de base militar. Chegamos e já estava ocupada. Estranho! Esaa casa nunca está ocupada.

Três pessoas. Três. Dois homens e uma mulher. Nos viram. Pedimos desculpas, mas foi em vão. Eles nos pegaram. Pegaram e nos prenderam com cordas. Ainda tenho a marca de uma delas. 

Prenderam e continuaram fumando. Apagaram um cigarro na testa dele e outro em meus lábios. Cruéis. Eram cruéis! Queriam nos machucar. Gritamos por ajuda. Gritamos mas ninguém veio. A casa era longe demais.

Uni-duni-tê... O escolhido fui eu. Tinham um estilete. Ela segurou Phelipe. Segurou e lhe cortou. Cortou na barriga. Meu amigo. Meu amigo sangrou. Sangrou e eu gritei. Gritei o mais alto que pude. Gritei e tentei puxar o braço. Foi aí que me machuquei. As cordas me cortaram. Cortaram e eu sentia a dor.

A mulher de cabelo vermelho cortava meu amigo devagar.  Ele estava com um pano na boca para não gritar. Eu não. Eu berrava. Berrava por ajuda. Berrava para soltarem meu amigo. Não entendia porque queriam machucar a ele se o escolhido fui eu.

– CALE ESSA BOCA CRIANÇA IMPRESTÁVEL!! – Ela ficou com raiva e arrancou um pedaço grande da barriga dele. Arrancou e enfiou em minha boca para que eu parasse. Eu enjoei. Enjoei e quis vomitar aquele gosto horrível. Gosto de gente. Não conseguia. Não conseguia sair meu vômito. Saiu pelo nariz. Eles viram. Viram e riram. Riram de mim! Estava engasgado com ele. Engasgado com meu amigo. 

Pegaram Phelipe e arrastaram para perto de mim. Arrastaram meu amigo para cima de mim. Me deitou me prendeu para que não conseguisse levantar. Ela passou o canivete no pescoço dele. Ele sangrou. Sangrou em mim. Estava preso. Preso com Phelipe morto em cima de mim. Estou amarrado e não consigo sair. Não tenho força.

Eles foram embora. Foram e me deixaram preso. Deixaram para morrer. Deixaram. Dois dias. Fome. Fome e sede. Phelipe já fedia. Não consigo mais vomitar. A carne na minha boca estragou. Estragou mas eu estava com fome. Com fome e com sede. Estava chorando quando choveu. Chorando para sair dali. Choveu e eu bebi a água que escorria dele. Água com sangue. Não é tão ruim assim. Tem gosto de ferro. Água que mata a fome. Água doce. Água com gosto de sangue. Sangue. Sangue frio... Estava melhor quando era quente.

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