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O meu tempo está se esgotando, a minha normalidade forjada dos últimos dias está escapando por meus dedos. É muito óbvio que não estou lidando muito bem com os acontecimentos recentes, tem praticamente duas semanas que estou na casa do Cage e até agora continuo sem respostas.

A última semana de aula chegou rapidamente, mais rapidamente do que eu gostaria. Na segunda Esther estava estranhamente quieta e pensativa, não ligou o som naquela playlist péssima e fez caretas no caminho todo.

- Qual é o motivo da sua quietude? – finalmente pergunto enquanto caminhamos juntas pelo corredor da escola.

Ela vira a cabeça para mim antes de voltar a olhar para frente. Se ela não pretende falar eu não pretendo insistir então dou de ombros e continuo focada em não esbarrar em ninguém pelo caminho.

- O aniversário de Aron é nessa quarta, estava pensando em organizar uma comemoração e em dar um presente. – ela suspira – A comemoração eu já descartei enquanto que o presente é um problema, não sei o que dar.

- Uma pena que não possam comemorar e, tenho certeza que vai descobrir o que dar em breve.

Ela não tem a chance de acrescentar algo já que um furacão de cabelos loiros chega animadamente. As duas provas que iríamos fazer hoje entraram em pauta, eram as ultimas e eu estava calma, mas minhas amigas não pareciam pensar o mesmo que eu.

No dia seguinte eu me pergunto se devo desejar parabéns ou não enquanto espero em um banquinho da loja, mas não tenho tempo o bastante para questionar já que Esther saí do vestiário com outra roupa. Ela fica deslumbrante em todas e como não tenho mais elogios para despejar eu peço para que ela escolha um preferido de uma vez, já havia escolhido o meu.

O vestido que eu comprei é longo e liso com uma fenda na perna, sua cor é azul royal e o decote é até bem generoso. Esther prefere algo mais chamativo então seu busto tem algumas pedras e ele é verde esmeralda.

Confesso que com o baile de formatura assim tão perto eu consigo me animar um pouco com a comemoração, apenas festa com adolescentes dançando e sendo idiotas uma última vez.

Ao acordar na manhã de quarta eu decido desejar um parabéns educado a Aron, não somos íntimos e nem amigos. Ele já me ajudou algumas vezes, mas nunca se deu o trabalho de verdadeiramente falar comigo mesmo estando sob o mesmo teto que eu, portanto...

Fico um pouco surpresa ao voltar para casa neste dia e descobrir que ele saiu, só viu Esther por alguns minutos de manhã, então paro de pensar em felicitá-lo e começo a me preocupar com o fato de que terei muito tempo ocioso em breve. Subo degrau por degrau da casa com Esther ao meu encalço, confesso que sinto falta de ficar um pouco sozinha em casa.

***

As pessoas estão alegres e radiantes quando entramos na escola no dia seguinte. O baile vai acontecer aqui mesmo então o lugar já está decorado e as pessoas estão em êxtase, os corredores estão abarrotados de alunos conversando animadamente e eu custo a me espremer no caminho até ao meu armário. Bufo irritada quando finalmente consigo chegar a portinha e ao olhar para Esther percebo que está rindo. Mostro-lhe a língua antes de pegar um livro e segurar, fecho o armário logo em seguida e ela já está gargalhando. Chame-me de azeda, mas eu odeio lugares cheios demais.

Os professores fazem discursos e emocionam alguns dos alunos mais antigos do lugar. Embora a formatura seja só amanhã, hoje é o ultimo dia que eles iram nos ver em sala de aula.

A um mês atrás eu estaria feliz por finalmente ter acabado, mas agora eu gostaria de prolongar o meu tempo de estudante. Já aceitei que não vou para a faculdade, pelo ou menos não antes de me controlar por completo e ainda sim seria muito arriscado. Tentei argumentar com minha tia já que não estou em condições de falar com o pai, mas foi em vão.

Quase choro ao ouvir que o último horário acabou, mesmo que seja educação física e eu deteste. Caminho pelos corredores uma última vez para encontrar pessoas chorando e alguns alunos se despedindo de professores, também estou afetada com o fim das aulas, e não é pelo mesmo motivo que o deles. Já para minhas amigas a tristeza não se aplica, estão felizes com o fim o que me faz querer estar no meu carro sozinha.

As meninas me deixam na porta e saem com o carro novamente, a solidão que eu desejava acaba de me acolher. Ou era o que eu esperava.

Ao entrar não vejo sinal de outra pessoa em casa então subo e tomo um banho demorado pensando no futuro que eu não vou ter e no quanto eu queria ser normal. Tenho consciência de que pensar nisso é completamente inútil, mas eu queria uma faculdade, eu queria me estabilizar em um lugar e me manter nele por mais de seis meses.

Tenho pensado muito em como vai ser minha vida de agora em diante, em como provavelmente vou ter que continuar com minhas mudanças e medo. Mamãe viveu uma vida cheia de medo de seres humanos cruéis e eu, ao que tudo indica, estou destinada ao mesmo.

Não sei definir como me sinto enquanto coloco a roupa dentro do banheiro mesmo. Não sei se fico triste por não ter a chance de um futuro decente, ou se fico irritada por estar sendo privada disso... Ao sair de cabeça baixa e mente cheia eu dou de cara com alguma coisa, aliás, dou de cara com a mesma pessoa outra vez.

Levanto a cabeça e encontro os círculos verdes finos ao redor de sua pupila dilatada. Nossos olhares se prendem por alguns segundos infinitos e eu posso sentir uma paz ser passada por aquele olhar, mas desperto rapidamente. Sacudo a cabeça enquanto penso no que dizer e me lembro de seu aniversário.

- Parabéns, Aron. – não espero por uma resposta de sua parte, saio do corredor e entro no meu quarto.

Sinto-me atraída por ele, sinto-me assim desde a primeira vez se é que isso possa ter acontecido. Aquele garoto me transmite uma energia surrealmente boa, mas quando eu saio de perto dela e penso nela eu só desejo respostas novamente. Já deveria ter aceitado a estranheza dessa nova realidade, mas ela me é incômoda demais.

 Já deveria ter aceitado a estranheza dessa nova realidade, mas ela me é incômoda demais

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Esther na mídia.

SalemWhere stories live. Discover now