Capítulo 19

86 7 0
                                    


Em vez disso, despejou tudo o que estava sentindo, cada emoção que se agitava nele, na página. Deixou as palavras fluírem de seu coração por seus dedos, digitando rapidamente até preencher várias páginas.

As palavras, que haviam sido relutantes antes, fluíam como um rio agora. Anahí ficou atrás dele, por um longo tempo, observando-o escrever. Não tinha certeza de como interpretar isso, então... Não interpretou. Fez o que fazia melhor, ignorou as pessoas, enterrando-se no trabalho.

Ah, ela era uma idiota.

Duas vezes agora, pensara que Alfonso ia beijá-la. Dessa vez, ainda por cima, foi estúpida o bastante para fechar os olhos e esperar.

Então o que ele fez? Disse "obrigado pela ajuda" e sentou para escrever no computador.

Deu um tapa na própria testa. No que estava pensando? Que uma mulher com um bebê era alguma deusa do sexo, rainha do desejo pela qual um homem solteiro iria babar?

É claro...

Anahí tinha interpretado os sinais de modo completamente errado. Passou tanto tempo sem namorar que devia se inscrever num curso de "Namoro para Iniciantes". De qualquer jeito, isso não importava.

A última coisa da qual precisava agora era um relacionamento. Mal tinha tempo para cozinhar, imagine para homens.

Tudo bem, tinha feito um jantar caseiro esta semana. Mas só porque sentiu pena de Alfonso. De acordo com o que achara na geladeira dele, claramente estava ficando desnutrido.

Anahí fitou o relógio. Quinze talvez 20 minutos antes que Sabrina acordasse. Se fosse sensata, usaria esse tempo para trabalhar, não para se afligir com uma situação que complicaria sua vida.

Desceu as escadas e entrou na sala enorme, cheia de móveis de couro luxuosos, uma lareira massiva de gás e mesas de mogno. Tinha uma densidade de móveis masculina, mas o conforto de uma casa aconchegante. Quase podia sentir Alfonso ali, imaginá-lo sentado naqueles sofás, reclinando-se nas superfícies macias, assistindo ao futebol na quarta-feira à noite.

Lá ia ela novamente. Pensando num homem que nem estava interessado nela.

Realmente precisava parar de pensar nele.

Ligou para o trabalho e concentrou-se no chefe. Cinco minutos de conversa com Lincoln e esqueceria Alfonso.

— Anahí, isso não está funcionando. Você não pode ficar doente. Quando vai voltar? Está se sentindo melhor? Diga que sim. — A voz de Lincoln ficava mais alta a cada sílaba dita. — Já tivemos três reuniões está manhã. E não pude contar com sua ajuda. Foi um desastre.

— Três reuniões? — Só podia imaginar o quão frustrados todos no trabalho estavam. — Eu já mandei notas detalhadas por e-mail esta manhã, Lincoln. Não deveria ter nada faltando em sua programação.

— Ainda tínhamos algumas coisas para discutir. Você não tem ideia de como é estressante esse trabalho, de quantos detalhes temos que lembrar.

Lincoln e suas reuniões. O homem fazia reunião até para falar sobre a troca de papel higiênico do banheiro.

— Como o quê?

— O formato do programa, por exemplo. Não sei se gosto da ordem que fizemos. Talvez devêssemos encurtar a introdução em três segundos. Parece meio longa. E colocar o jogador de futebol depois daquela matéria sobre adoção.

— Lincoln, a introdução está boa. Trabalhamos nela umas cem vezes. E se você tirar três segundos, nós temos que reformular a letra toda. Sobre mover o jogador, isso tiraria o incentivo para as pessoas assistirem ao programa depois do comercial. Você quer que as pessoas assistam aos comerciais. Os patrocinadores que pagam nosso programa.

Lincoln suspirou, aliviado.

— Viu, é isso que eu precisava ouvir. Você está sempre certa, Anahí. Devia estar aqui, não em casa. Você está doente, não é?

Tossiu um pouco, sentindo-se mal por fingir estar doente, mas sabendo que, se contasse a verdade, que optara por um dia de folga para passar tempo com sua filha e ajudar Alfonso, Lincoln a faria voltar ao trabalho.

— Claro.

— Bom, amanhã, espero que você trabalhe duas horas a mais. Isso compensará por não estar aqui hoje. Podemos revisar os programas do restante do mês e...

— Lincoln, eu não posso ficar duas horas a mais. Tenho que encontrar uma babá e...

— Você vai ficar se quiser manter o emprego. Quando aceitou esse cargo, avisei que demandaria tempo, Anahí. — Soltou um risinho. — Quis dizer que eu demandaria tempo. Se quiser esse emprego, precisa ter esse tempo.

Ela precisava do emprego. Precisava do salário desesperadamente. Achar outro emprego levaria tempo para analisar os classificados, candidatar-se; ser entrevistada.

— Estarei aí, Linc.

— Obrigado, Anahí. Sabia que podia contar com você. — Ele desligou. Era um homem solteiro tão obcecado pelo trabalho que não compreendia que seus empregados poderiam ter uma vida pessoal fora do canal 77.

— É; esse é o problema — disse ao telefone, mudo. E a única grande coisa que queria mudar, mas não podia.

PAPAI POR ENCOMENDAWhere stories live. Discover now