Capítulo 26

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Eram palavras inocentes, ditas de brincadeira, sabia, mas, se entendidas de outra forma, implicavam um futuro. Dias, semanas, meses depois desse trabalho de babá.

Um futuro que costumava pensar em ter, antes de ter errado com Julia. Alfonso afastou esses pensamentos e parou na frente da cafeteira.

— Café?

— Claro. Descafeinado, por favor, senão ficarei acordada à noite. — Deu tapinhas no bumbum do bebê com uma das mãos e cobriu um bocejo com a outra. — Com ela, preciso de cada hora que conseguir. Especialmente depois dos últimos dias. Às vezes, parece que não consigo dormir o bastante.

— Descafeinado será. — Ocupou-se enchendo a xícara, enquanto Anahí se sentia em casa na cozinha dele, tirando pratos do armário e garfos da gaveta. Olhou-a de relance algumas vezes, notando quão natural era tê-la aqui, em tão poucos dias. Ela havia simplesmente virado parte de seu lar.

Logo do lar de Alfonso. Ele era o eremita que se isolava, se escondia no escritório e limitava sua interação social às pessoas que criava nos livros. Agora havia uma mulher com um bebê no colo em sua cozinha, e ele estava se acostumando a tê-las ali.

Não tinha certeza se isso era bom ou ruim, porque também significava se acostumar a participar desse trio familiar, e isso estava definitivamente fora de sua programação de vida.

Sabia que não devia tentar isso novamente.

Anahí colocou a louça na mesa, então apanhou uma faca fina e longa da gaveta central.

— O que é isso? — perguntou ele.

— Uma faca de bolo.

— Uma o quê?

Ela riu.

— Faca de bolo. Não sabia que você tinha uma?

— Não conheço metade das coisas nessa cozinha. Minha mãe e minhas irmãs me deram tudo, sentiram pena do "solteirão". Tirando a mortadela, é claro.

— O que você precisa é de uma mulher — disse ela, ruborizando. — Esqueça o que eu disse. — Balançou a cabeça e cobriu outro bocejo.

— Aqui, deixe que eu a seguro — falou ele, apanhando a criança. Não porque desejava incontrolavelmente segurá-la, mas porque queria mudar de assunto. — Parece que seu braço vai quebrar.

— Obrigada. Mas não a deixe dormir com você ou vou pagar o pato depois.

— Sem querer ser chato, mas você parece já estar caindo no sono. Está exausta. Sente no sofá. Deixe-me cuidar de você dessa vez. — Cortou duas fatias com a faca de bolo e colocou-as nos pratos.

— Não estou cansada. — Ela bocejou e riu. — Tudo bem, talvez esteja. Mas são ossos do ofício. Nem me lembro da última vez em que tive uma boa noite de sono.

— Então vá se sentar — disse ele, dando-lhe uma fatia de bolo. — Vou terminar o café e levo uma xícara.

— Tem certeza?

— Vá. — Gesticulou para a sala. — Antes que eu a expulse.

Ela riu quando saiu, mas aquela risada não tinha seu charme usual. Não estava brincando, realmente parecia exausta. Trabalhar, conciliar as demandas do bebê, voltar para casa é cuidar das tarefas caseiras, sem dúvida, exauria Anahí. Não podia imaginar conciliar tudo sozinho, como ela.

— Só nós agora, criança. Tudo bem para você? — Balançou o bebê suavemente nos braços, foi até o armário e apanhou duas canecas. Acostumara-se a segurar a criança nos últimos dias, o que mostrava por si só que estava se envolvendo demais, chegando perto demais.

Sabrina agarrou a camisa dele.

— Sem café para você. Desculpe.

Ao tocá-la, sentiu o tecido macio e felpudo do pijama branco e pêssego. Ela se aconchegou nele, como se aquele fosse seu lugar preferido.

Era... Bom. Quase como se ela lhe pertencesse. Começara a gostar mais dela, desse monte de cocô e vômito de quase 10 kg. Para uma criança, não era tão barulhenta e prestava atenção em tudo. Agora o observava, com olhos grandes e questionadores.

Observou-a também, pensando que nunca vira olhos tão azuis antes. Tinham um pouco do verde da mãe, o que ô fez imaginar se ficariam azuis mais tarde. De qualquer modo, ainda seriam bonitos.

— O que está olhando?

E ela continuava olhando, como se estivesse esperando que fizesse alguma coisa.

Queria tirá-la do colo. Colocá-la na cadeirinha, no cercado ou até no carpete, para engatinhar à vontade. Mas algo o fazia continuar segurando-a firme. Talvez fosse o jeito com que ela agarrara sua blusa ou como olhava para ele, como se quisesse...

Brincar.

Vasculhou a memória, tentando lembrar-se de algum jogo, que pudesse jogar com alguém daquele tamanho. Então se lembrou de um que sua mãe costumava jogar com as crianças. Apanhou um pano, colocou-o na frente do rosto e tirou rapidamente.

— Bu.

Repentinamente... A criança riu, com um som que se derramava dela, como bolhas estourando em pedras. Todo o corpinho chacoalhou, a barriga mexeu-se como gelatina.

Ficou impressionado. Observou-há por algum tempo, escutando o barulho.

— Você gostou? — Quem diria que ele, dentre todas as pessoas, faria uma criança rir assim? Sempre ficara longe das crianças. Fazia o mínimo e saía correndo. E agora, aí estava essa, rindo à beça. Levantou o pano novamente, segurando-o um pouco mais de tempo dessa vez. — Hum... Hum... Bu!

Uma explosão de risos e, ela pulou em seus braços, como se pedindo para que fizesse novamente.

PAPAI POR ENCOMENDAWhere stories live. Discover now