XLIII

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Ela nunca pensou muito no que seria a felicidade plena. Achava que tudo isso só seria alcançado com a coroa de Ártemis nas suas mãos, com o poder, o respeito de seu povo. Foi criada assim, exaltada e preparada com a bênção dos deuses. O céu estava perto dela o tempo todo.

A felicidade era a risada da sua família envolta da mesa. O sol batendo por entre o teto de mármore e folhas de louro. A mesa repleta de comida, massas, cordeiro e frutas.

Parte da corte de Aríccia que aceitou se mudar para Ártemis estava sendo recebida com esse banquete. Foram poucos os que quiseram vir, mas dava para ver no sorriso estampado no rosto que não se arrependiam. Ao fundo, os músicos entregavam o melhor de seu repertório e a vista para o mar era um charme a parte.

— Está tudo uma delícia, Majestade. — um dos convidados falou, levantando o cálice em um brinde. 

— Fico feliz, tudo que tem nessa mesa saiu dessa terra, Ártemis é bem autossuficiente. — Giovanna respondeu. 

Quando Myriad apareceu da cozinha, vinha com dois potes de geleia. Foi com muito esforço que conseguiram convencer a mulher a deixar Aríccia para reconstruir a vida em Ártemis. E de fato só conseguiram fazer isso depois de garantir que ela poderia fazer todos os anos o almoço de aniversário de Diana. 

— Geleias de morango! Myriad, suas mãos são uma benção. — Felíccia falou com um sorriso. 

Atlas, ao ver a avó curiosa com as geleias, se aproximou dela. Giovanna observava a interação com atenção. O menino estava muito mais leve longe das memórias de Aríccia e de todo o peso do mundo nos ombros. Ele era um menino como deveria ser. 

— Vó, eu posso provar? — ele perguntou curioso. 

— Claro, vamos passar nesse pão aqui... 

Alexandre ficou tenso no mesmo momento em que viu o menino colocar o pedaço de pão na boca. Giovanna percebeu e tocou o ombro dele. Os olhos escuros dele a encararam e ele deu um sorriso triste. 

— O que foi? — ela perguntou baixinho. 

— Eu sou alérgico a morangos. — ele falou no mesmo tom para não chamar atenção. — Começo a me coçar, meus olhos incham, fico cheio de bolinhas pelo corpo. 

Giovanna pensou um pouco, e logo que entendeu o que ele queria dizer. Joha e Karen amavam morango, Alexandre era alérgico. A depender da reação de Atlas, a paternidade seria confirmada naquele almoço banal como se nada fosse, todos estariam alheios a isso, menos os dois. Voltaram o olhar para Atlas, e quando ele sorriu com o gosto doce da geleia, Alexandre sentiu o corpo tremer, e lutou contra as lágrimas. 

Ela se inclinou e beijou o rosto dele com carinho, acariciando a nuca dele. Alexandre a olhou, forçou um sorriso. 

— Ele ainda é meu filho, não é? — ele reafirmou. 

— É claro que é, comilão do jeito que é, só pode ser seu. 

Mesmo com as reafirmações, o almoço estava arruinado para ele. Alexandre saiu da mesa algumas vezes para tomar um ar, e até pediu autorização para buscar Diana, que lhe foi negada por Giovanna, pedindo que ele se sentasse e se acalmasse. 

Foi nesse momento que Atlas se aproximou deles com lágrimas nos olhos. Os braços estavam vermelhos e coçavam, com elevações grandes na pele. Giovanna pegou o menino pelos ombros, o olhando por completo. 

— Mãe... não paro de coçar. — ele reclamou. 

Alexandre sentiu a alma sair do corpo. Ele começou a rir, começou a chorar, tudo ao mesmo tempo. Giovanna tentava acalmar o filho enquanto Nero se levantou da mesa, limpando o rosto. As pessoas olhavam confusas. 

Ouro de Ártemis Where stories live. Discover now