Capítulo Dezesseis.

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Maju narrando:

Fomos em silêncio por todo percusso, sentia algo em meu peito arder, um misto de felicidade e culpa. Aquela vida era algo que eu desconhecia, Luan sofreu muito e muitos ajudaram ele naquele momento, eu agora entendia o que ele queria dizer com ''protejo minha família, e a comunidade é a minha família...''. Família cuida uma da outra, e por isso eu não tinha uma família, quando precisei de meus pais eles me ignoraram e me viraram as costas. Por isso que eu disse, às vezes que tem pouco é mais feliz do que quem tem o mundo inteiro.

Luan jogou todas as sacolas no sofá e saiu sem dizer nada, era tanta bagunça que mal sabia por onde começar.

Depois que arrumei tudo tomei um banho e vesti um short lilás e uma blusa branca penteando os cabelos e saindo, tinha vontade de conhecer todo o morro, mas era muito grande e só sabia um caminho: ir pra casa da Priscila. Peguei meu celular e coloquei no bolso saindo daquele casarão e recebendo os olhares dos caras armados que faziam guarda bem ali na porta, eles cochicharam e sorriram, bufei rolando os olhos e descendo agora, entrava e saia pelos becos, quando dei por mim já estava perdida por completo, o lado bom era que eu estava com meu celular, saí do beco e avistei de longe vários homens na rua, eles carregavam armas enormes, havia também várias motos e todas rodavam uma casinha que ali se encontrava.

Ia saindo do beco mas senti meu braço ser puxado com força.

─ Tá fazendo o que por aqui? Tá doida? ─ ele sussurrou me jogando na parede.

─ Só tava andando por aí.

Fitei com intensidade os olhos de Luan, ele me pressionou na parede de dentro do beco e me encarou com severidade.

─ Tu não pode andar por aqui, essa área é próximo da boca.

─ Me solta! ─ falei quando notei muito sua proximidade de mim.

Ele me pressionou mais ficando bem colado do meu corpo, tentei empurra-lo mas era impossível, aquele cheiro dele me fez sentir uma dormência nas pernas e ficar imóvel, senti seu hálito quente em meu rosto, fitei seus olhos com as pálpebras cerradas, agora tão perto pude notar a beleza que eles possuíam.

Levantei minha mão pra acertar sua cara mas ela foi segurada.

Luan encostou seus lábios bem próximo da minha boca, os sentia úmidos em minha bochecha quente, minha respiração alterou-se repentinamente e o nervosismo me consumiu.

─ Para... ─ Sussurrei entregue por completo. Meus pulsos presos pelas mãos grandes e grossas de Luan me impossibilitavam de movimentar, sentia todo o corpo de Luan encostado no meu e o calor que ele transmitia me fazia sentir meu corpo dormente por completo.

Era como uma droga.

Luan beijou minha bochecha e folgou suas mãos de meus pulsos me libertando, só assim pude respirar ofegantemente, agradeci mentalmente por aquele otário não ter feito algo a mais comigo. Fui bater em sua cara de novo mas ele segurou minha mão agora selando nossos lábios rapidamente.

Idiota, otário, imbecil!

Desgrudei de seus lábios rapidamente e senti minhas bochechas enrubescerem, não acredito que havia beijado um traficante em meu estado normal...

─ Fica aqui que vou te levar pra casa.

─ Tenho pernas.

─ Não perguntei se tem pernas ou não ─ disse e saiu.

Fiquei parada imóvel naquele beco, ainda tentando assimilar aquele rápido selinho, queria enforcar Luan e bater na cara dele, fechei meus punhos sentindo muita raiva. Raiva de estar ali, raiva da cara de Luan, raiva da minha vida.

Mal percebi quando Luan estacionou uma moto enorme na minha frente e ofereceu a mão para eu subir, ele estava agora com um boné na cabeça e um olhar de lado com um sorrisinho de vitória, senti meu sangue subir e ferver. Subi naquela moto batendo o pé e fui segurar na calça de Luan mas o mesmo tirou minhas mãos de lá entrelaçando meus braços em volta de sua barriga e me fazendo abraça-lo, ia tirar mas ele acelerou dando partida e me fazendo quase cair da enorme moto.

Luan andava até devagar, mas de vez em quando ele tentava levantar a moto me fazendo gritar de medo.

Ele falava com todos por ali, com todo o pessoal que o cumprimentava, todos me olhavam encabulados e sorriam pra nós.

Percebi que Luan não estava indo em direção à sua casa, ele havia pegado outro rumo e agora subia o morro entrando e saindo rápido de becos, fechei meus olhos encostando minha cabeça nas costas de Luan com medo de cair por conta da ladeira que agora ele subia. Meus cabelos voavam no meu rosto e me faziam ter vontade de espirrar.

Só abri os olhos quando a moto parou e ele desceu me deixando sentada na moto.

Estávamos em um lugar alto, era o alto do morro, desci da moto de boca aberta e vislumbrei todo o lugar que era magnifico. A grama que cobria lá em cima era verdinha, e bem aparada, lá era silencioso demais e o único barulho ouvido era do vento que balançava as folhas de uma árvore grande que se encontrava ali. A vista era esplêndida e jamais havia visto algo assim em toda minha vida, não só dava pra ver uma parte da favela como na casa de Luan, dava pra ver toda a favela, e parecia que podíamos tocar o céu bem dali, dava pra ver não só a favela como um pouco do Rio, senti o vento bagunçando meus cabelos e sorri admirando a paisagem concedida.

─ Quando meus pais morreram, eu vinha todos os dias aqui pela noite, muitas vezes pensei em me jogar daqui mas eu tinha um propósito para viver, meu propósito era Gabriel, ele precisava de mim e eu não podia simplesmente abandonar ele ─ Luan confessou aproximando-se.

─ Nunca vi algo assim em minha vida.

─ Aqui é mais lindo de bonito pela noite, parece até que as estrelas estão do nosso lado.

Virei-me e vislumbrei o sorriso aberto de Luan bem de perto, em meio de tanta dificuldade, não sei como todos ali daquela favela conseguiam sorrir mesmo na pobreza... Mas não sabia que todos ali tinham motivos, o verdadeiro motivo da felicidade era a vida, não era ter dinheiro e esbanjar a riqueza que possuía, mas sim agradecer pelo pão e pelas conquistas de cada dia.

Acho que essa era a beleza que Neguinho desejava que eu aprendesse.

Luan me encarou e fechou seu branco sorriso agora apenas sorrindo sem mostrar os dentes, ele aproximou-se e passou sua mão ao redor do meu ombro agora fitando longe e suspirando.

Também encarei a paisagem soltando um suspiro pesado e pensando no que exatamente o futuro estava reservando para mim, pensando em meus pais, no bebê...

***

Era noite e já havia jantando e agora estava deitada na cama muito pensativa, meus pensamentos eram tão intensos, meu peito ardia e eu pensava em Luan, não sei exatamente porque pensava nele, mas esses pensamentos me fizeram chorar, peguei meu celular e fiquei vendo algumas fotos minhas com meus pais, com meus amigos, com meu irmão, meu peito apertou e a saudade chegou fazendo as lágrimas se intensificarem. Senti algo em minha barriga se remexer e não era meu estômago.

Aquilo durou alguns segundos e logo parou, passei minha mão sobre minha barriga e sorri fraco, o bebê estava mexendo, será que ele estava sentindo o que eu sentia naquele momento?

''...Ele te ama...''

As palavras do Doutor Robson invadiram minha cabeça e responderam minha pergunta.

Ouvi passos rápidos em direção ao quarto e então abriram a porta, era Luan, me levantei assustada e o fitei com pavor. Algo havia acontecido?!

─ Priscila perdeu o bebê...

Apenas um TraficanteWhere stories live. Discover now