4 - Reconciliação

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Foi real para mim

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Os habitantes de Little Hangleton continuavam a chamá-la “Casa dos Riddle”, ainda que já fizesse
muitos anos desde que a família Riddle morara ali. A casa ficava em um morro com vista para o
povoado, algumas janelas pregadas, telhas faltando e a hera se espalhando livremente pela fachada. Outrora uma bela casa senhorial, e, sem favor algum, a construção maior e mais imponente de toda a redondeza, a Casa dos Riddle agora estava úmida, em ruínas, e desocupada.
As pessoas do local concordavam que a velha casa dava arrepios. Meio século antes uma coisa
estranha e terrível acontecera ali, uma coisa que os antigos habitantes do povoado ainda gostavam de discutir quando faltava assunto para fofocas. A história fora requentada tantas vezes e enfeitada em tantos pontos, que ninguém mais sabia onde estava a verdade.

Todas as versões, porém, começavam no mesmo ponto: cinquenta anos antes, ao amanhecer de uma bela manhã de verão, quando a casa dos Riddle ainda era bem cuidada e imponente, uma empregada entrou na sala de estar e encontrou os três Riddle mortos.
A empregada saiu correndo morro abaixo, aos berros, até o povoado, e acordou o maior número possível de pessoas.

-Caídos na sala com os olhos abertos! Gelados! Ainda com a roupa do jantar!

A polícia foi chamada e Little Hangleton inteiro fervilhou de espanto, curiosidade e mal disfarçada excitação. Ninguém gastou fôlego em fingir tristeza com o que acontecera aos Riddle, porque eles eram muito impopulares. Os velhos Sr. e Sra. Riddle tinham sido ricos, esnobes e grosseiros, e seu filho adulto, Tom, era tudo isso em grau maior. A preocupação de todos que moravam em Little Hangleton era
a identidade do assassino – pois não havia dúvida de que três pessoas aparentemente saudáveis não poderiam ter morrido, na mesma noite, de causas naturais.
O Enforcado, o bar local, faturou sem parar aquela noite; os habitantes do povoado apareceram em peso para discutir a matança. Foram recompensados por terem deixado o conforto de sua lareira, quando a cozinheira dos Riddle apareceu teatralmente e anunciou para o bar, repentinamente silencioso, que um homem chamado Franco Bryce acabara de ser preso.

-Franco! -Exclamaram várias pessoas. -Nunca!

Franco Bryce era o jardineiro dos Riddle. Morava sozinho em uma casa malcuidada na propriedade
dos patrões. Voltara da guerra com uma perna dura e uma intensa aversão por ajuntamentos e barulhos, e, desde então, trabalhava para os Riddle. Houve um corre-corre geral para pagar bebidas para a cozinheira e ouvir maiores detalhes.

-Sempre achei que ele era esquisito. -Disse a mulher aos ouvintes ansiosos, depois do quarto xerez. -Assim, antipático. Tenho certeza de que não ofereci a ele só uma xícara de chá, ofereci bem umas cem. Nunca quis se misturar, nunca mesmo.

-Ah. -Disse uma mulher sentada ao balcão. -Mas ele passou muito sofrimento na guerra, o Franco, gosta de uma vida tranquila. Isso não é razão...

-Quem mais tinha a chave da porta dos fundos, então? -Vociferou a cozinheira. -Desde que me entendo por gente, sempre teve uma chave de reserva pendurada na casa do jardineiro! Ninguém forçou a porta ontem à noite! Não tem janelas quebradas! O Franco só precisou entrar escondido na casa grande
enquanto a gente dormia...

As pessoas trocaram olhares tenebrosos.

-Eu sempre achei que ele tinha um jeito ruim, e não me enganei. -Resmungou um homem junto ao
balcão.

-Foi a guerra que deixou ele esquisito, se querem saber a minha opinião. -Disse o dono do bar.

-Eu disse que não queria desagradar a Franco, não disse, Dot? -Falou uma mulher agitada a um canto.

OLÍVIA POTTER [4]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora