Capítulo 11 | Luz

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Filipe
Estaciono o carro no parque de estacionamento do meu prédio. Olho uma última vez para o banco ao meu lado e suspiro, lembrando a presença dela. Reparo que o meu casaco não está em lado nenhum. Ela levou-o.
Subo até ao 3° andar e entro em casa. Deixo a pasta no sofá e vou preparar alguma coisa para comer.
Enquanto como, aproveito para corrigir algumas teses que me faltavam entregar, não corrigi muito essa tarde. Por um bom motivo. Aproveitei a motivação para tentar fazer o máximo possível, mas assim que senti os olhos começarem a arder, fui tomar banho.
Pensei bastante, enquanto o fazia.

Beatriz
Hoje não houve aulas. Aparentemente, decidiram fazer greve á última da hora. Mais do que o facto de isso ter sido decidido ás três pancadas, supreendeu-me a grande aderência que houve - tanta que a escola nem abriu.
Para além disso, nenhum aluno foi avisado, ou seja, quase toda a gente (porque há quem não queira saber minimamente disto) foi á escola e bateu com o nariz na porta. Como esperado, todos começaram a gritar de felicidade, alguns com gritos bastante estranhos. É apenas um dia sem aulas, não um dia sem trabalho ou o fim da universidade...mas não julgo, na escola de que estamos a falar é raro haver dias destes.
Voltei a por os fones nos ouvidos e ao som de ABBA voltei para casa.
Peguei numa maçã da fruteira e subi até ao meu quarto. Tenho teste de Física daqui a exatas duas semanas, ou seja, altura de começar a estudar...ou deprimir. São praticamente sinónimos!

_ Beatriz? - ouço, muito baixinho. Repetiram o meu nome três vezes e senti uma mão no meu ombro. Esforço-me para abrir os olhos. Vejo um vulto que me é familiar, ainda que destorcido. - O que estás a fazer? - franzo o cenho, ainda com dificuldade em manter os olhos abertos por mais de 5 segundos. Quando finalmente consigo, espanto-me.
_ Estou a estudar física...tenho teste daqui a duas semanas. Temos. - respondo e ele baixa-se ao meu lado. Engulo em seco quando me segura as mãos e me ajuda a levantar da secretária, guiando-me para o centro do quarto. Que raio faz o meu professor na minha casa? No meu quarto? - O que é que estás a fazer?
_ Vim fazer-te uma visita, precisava de falar contigo. - diz e sorri. Levanto a sobrancelha, verdadeiramente intrigada. Podia falar comigo amanhã, certo?
_ Eu... - trava-se a si mesmo, deixando-me cada vez mais ansiosa. - Eu preocupo-me contigo, mas isso tu já sabes há algum tempo. Não gosto de te ver triste ou magoada, de qualquer maneira. Física ou emocionalmente. É como se eu sentisse a tua dor na minha própria pele. - respira fundo e eu começo a achar difícil manter-me em pé. - O que eu queria dizer é que eu realmente gosto de ti. - É óbvio que a minha primeira reação é arregalar os olhos, não esperava de todo por isso. De certa forma, esperava...sendo sincera. Mas não pode ser.
_ Eu também gosto de ti. És um bom amigo. - tento suavizar a situação.
_ Não, Beatriz. Eu realmente gosto de ti. No completo e verdadeiro sentido da palavra. E também acho que tu, de alguma forma, já sabias.
Puxo pelo ar. Quem é que eu queria enganar? A sua mão sobe até á maçã do meu rosto e os seus olhos iluminam-se quando eu sorrio, sem jeito. Ele inclina-se para a frente e sorri, permitindo-me sentir o seu hálito - hortelã. Os nossos lábios estão a milímetros e o meu coração quase explode dentro do peito.

Abro os olhos. Encaro o caderno aberto á minha frente, a única luz no quarto era a do candeeiro de mesa. A casa estava um silêncio absoluto e eu estava sozinha. Tudo não passou de um sonho.
Arrasto-me até á cama e apago, ainda atordoada com o ocorrido. Não deixa de ser real, só porque aconteceu na minha cabeça.

* bzzz bzzz*
Acordo com o telemóvel a vibrar. É excusado dizer que esta noite não dormi nada. Tudo aquilo ficou na minha cabeça, acima de tudo a possibilidade de ser verdade ou algo provável de acontecer. As minhas únicas motivações para ir para as aulas hoje são o facto de ter aula de literatura e amanhã ser fim de semana.
Tenho um certo medo de ir e encontrá-lo. Ou o meu namorado. Não o tenho visto, o que é estranho. Temo que ele esteja a fazer porcaria, a meter-se com as pessoas erradas. Apesar de tudo, não quero que ele tenha nenhuma recaída. Quando o nosso relacionamento começou ele estava a acabar a reabilitação, estava limpo novamente. Eu fiquei feliz, porque ele ia ser diferente, melhor. Fiquei assim porque já o tinha visto no seu pior, e nessa altura eu não imaginava o futuro. Não fazia a mínima ideia que aquele rapaz se ia tornar o meu melhor amigo, depois namorado e agora um estranho, quase. A verdade é que agora eu mal o reconheço. A pessoa que mais me fez sorrir, em tempos, é, ao mesmo tempo, a que já me fez sofrer mais. Quem me roubou a minha luz.
Apesar disso, nem tudo foi mau. "Conheci" alguém e pelo menos agora estava a recuperá-la.

Meu Querido ProfessorWhere stories live. Discover now