Capítulo 34 | The Day After

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Sempre me perguntei se algum dia viveria um grande amor, daqueles que se vê nos filmes, arrebatadores e poderosos. Daqueles que nos levam das lágrimas ao riso (e talvez de volta ás lágrimas) numa fração de segundo e nos cortam a respiração porque nos sentimos tão dentro da história quanto as personagens. Daqueles de que chegamos a sentir inveja - mas não aquela em que pensamos logo, aquela pontada de desgosto que sentimos quando nos ocorre que na vida real isso não existe. Não. Esta inveja a que me estou a referir é agradável. É aquela sensação de borboletas no estômago quando vemos um primeiro beijo ou uma confissão inesperada e que nos faz ficar a pensar durante horas sobre o que vimos.
Sempre me questionei se algum dia teria essa oportunidade tão rara.
Durante uma boa parte da minha curta vida senti que não, senti aquele primeiro tipo de inveja que referi há pouco, mas não agora. Agora tenho algo.
Pode não parecer grande coisa para os outros, pode parecer enfadonho ou ilusório. Por Deus, podem até dizer que estou louca.
Mas eu, simplesmente, não. Quero. Saber.

É isto que tenho, o Filipe, e, para mim, é tudo.
***
Acordo com a impressão de luz a bater-me na cara de forma intensa, o que me faz ter dificuldade em abrir os olhos e principalmente a perceber onde estou. Olhando em meu redor, percebo que estou num quarto e não o meu. Entro levemente em pânico. Pensa, Beatriz, pensa!
Sento-me na cama e ponho as mãos á cabeça, olhando freneticamente em meu redor procurando alguma coisa que me dê uma pista. Calma, estás nervosa demais, respira fundo e pensa. Fecho os olhos e esforço-me por ordenar as minhas ideias. Estive com o Filipe ontem, passamos uma excelente tarde, vimos alguns filmes e...não me lembro de mais nada.
_ Merda...filho da mãe de armário! - ouço o barulho de algo a chocar contra outra coisa seguido da voz dele e o alívio que sinto neste momento é quase palpável de tanto. Baixo-me e deixo-me cair novamente no colchão macio com um sorriso parvo estampado no rosto. Pego no telemóvel para verificar que horas são e acabo por me assustar com a quantidade de notificações que encontro.

9:34
15 chamadas não atendidas de Mãe 🤍
10 chamadas não atendidas de Luana
- Bea?! Estás bem? (Luana - ontem - 20:02)
- Oláaa?? ( Luana, ontem - 20:24)
- PERDESTE-TE EM PARIS?? (Luana, ontem - 21:56)
- Beatriz?????? SE NÃO ME RESPONDERES VOU ARROMBAR A PORTA DA TUA CASA OU NÃO, MELHOR, VOU POR A POLÍCIA EM BUSCAS POR TI. (Luana, ontem - 23:30)
- Hello? Já regressaste á Terra? (Luana - 08:34)

É, posso dizer que estou ligeiramente lixada. Desbloqueio o telemóvel e abro o chat com a minha melhor amiga.

- Bom diiia flor! Não há necessidade de recorrer á violência, prometo que te ligo mais tarde para explicar tudo. (9:36)

De seguida, retorno uma das chamadas da minha mãe. Atendeu-me ao segundo toque.
_ Beatriz? Filha? Estás bem?
_ Sim, mãe, estou bem. Desculpe, eu ia avisá-la, mas foi tudo tão rápido...eu...acabei por ficar com a Luana, dormi em casa dela. - digo a primeira coisa que me vem á mente. Agora é esperar que ela alinhe na minha história.
_ Agora eu percebo, mas nunca mais me faças isso, Bea! Queres matar-me de preocupação? - repreende-me com toda a razão, enquanto esfrego com força os olhos. Odeio preocupar a minha mãe, raramente o faço, mas neste caso foi mais forte que eu. Quer dizer, não adormeci nos braços dele com intenção de ficar aqui, mas estava demasiado confortável.
_ Não mãe, desculpe, a sério. A mãe sabe que não gosto quando faço asneira e se zanga comigo. Desculpa-me? Por favor?
Ela suspira do outro lado.
_ Oh filha, desculpo. Mas NUNCA MAIS faças isso, mesmo. - sorrio, porque o seu tom de voz é mais calmo. Continua tensa, mas já não tanto.
_ Bo...- o Filipe entra no quarto e faço-lhe sinal para que se cale no mesmo instante. O meu coração aquece-se ao ver que ele traz uma bandeja.
_ Sim senhora, prometo!
_ Ai rapariga...- diz e ri-se - Diz-me uma coisa: vais ficar com ela aí hoje?
Olho para o homem agora encostado á ombreira da porta, de braços cruzados e um sorriso de lado nos lábios, entretido com a situação. Ele está a usar calças de fato-de-treino cinzentas e uma sweatshirt azul-escura de Harvard com as letras já meio gastas. Acho que nunca o vi tão descontraído - e também por isso acho que nunca me pareceu tão atraente.
_ Bea? - ouço-a novamente.
_ Sim, estou aqui! Eu...acho que sim. - pauso. - Sim, ela disse-me que tem planos, provavelmente vamos ás compras. A mãe sabe como é que ela é...Posso ficar? - pergunto e percebo que o sorriso do Filipe passa a mostrar os seus dentes, enquanto ele olha para mim, diretamente para mim, na expectativa que eu encerre a chamada.
_ Vá, pronto...fica. Divirtam-se. - acaba por ceder. Bem tento manter-me inexpressiva, mas falho.
_ Obrigada mãe!! Adoro-te!
_ Eu também, meu amor. - sorrio. - Beijinhos para vocês.
_ Beijos! - desligo a chamada e pulo da cama quase que diretamente para os braços dele. Sou acolhida num abraço caloroso, o melhor início de manhã que já tive. Ele prendeu os braços á volta da minha cintura e eu lancei os braços ao seu pescoço.
_ Se soubesse que a minha manhã ia "começar" assim, já te tinha trazido cá há mais tempo. - diz contra o meu pescoço e solta uma risada nasal que me arrepia por inteiro.
_ Parvo...- digo baixo antes de me afastar dele a rir e beijo-o. Quando nos separamos, o sorriso no rosto dele é ainda mais evidente.
_ Tens noção que acabaste de dar-me um argumento de reforço á minha ideia, certo?
Acabo por rir-me também, revirando os olhos e esticando-me de seguida para o beijar, mas desta vez não muito intensamente. Viro-me de costas para ele e olho para a mesa de cabeceira, onde ele pousou a bandeja com o pequeno-almoço: frutas, sumo de laranja e dois croissants com queijo. Sinto os seus braços á volta da minha cintura novamente, cingindo-me contra ele e sorrio.
_ Então? Gostas? - pergunta.
_ Acho que nem preciso de responder-te...nunca me fizeram algo assim, Filipe. Obrigada, a sério. - volto-me para ele, sorrindo-lhe antes de pegar na comida e colocá-la na cama. Sentamo-nos um de frente para o outro e fizemos uma refeição bastante agradável.
***
Passamos o resto do dia em casa dele, até agora não saímos e já são 16:22. Não que ele more perto da escola nem haja muitos colegas meus ou dele na zona, mas, ainda assim, preferimos não arriscar.
Depois de comermos e de algumas tentativas falhadas minhas de lavar a pouca louça que sujamos e de arrumar a cozinha, ele convenceu-me a voltar para o quarto, para vermos algum filme. Como o Natal está a chegar, há filmes do género a passar em mais canais que não na FOXLife, então acabamos por ver o clássico Sozinho em Casa.
_ Ahh, adoro este filme! - digo quando os letreiros começam a subir. - Espera...ainda não decoraste a tua casa. Porquê?
Assim que a pergunta sai dos meus lábios, arrependo-me, o medo de estar a pisar terreno instável é grande.
_ Sinceramente? - anuo, ansiosa pela sua resposta. - Pura preguiça. Está tudo na arrecadação e geralmente é a Beca que traz tudo para cima e me ajuda a deixar tudo bonito. Por outras palavras, ela decora tudo, porque infelizmente decoração não é um dos meus infindáveis dotes.
Rio-me da expressão que faz, como sempre, convencido, ao mesmo tempo que faço que "não" com a cabeça até me ocorrer uma ideia.
_ E se nós decorarmos a casa? Seria giro...
_ A sério? - questiona, com um sorriso crescente no rosto.
_ Claro! - respondo sem precisar de pensar. A mera ideia de criar esta memória tão especial com ele dá me vontade de chorar de emoção. Quando ele me abraça, invertendo as nossas posições na cama e ficando por cima de mim, o meu coração dispara. Quando me enche o rosto de beijos e nos rimos os dois porque ele está a fazer-me cócegas, as borboletas na minha barriga ganham vida.
E, quando finalmente os seus lábios encontram os meus, sinto fogos de artifício no peito.
Sinto-me a rapariga mais feliz do mundo.

Meu Querido ProfessorWhere stories live. Discover now