Capítulo 32 | Sinais

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Beatriz
Apenas no momento em que os nossos lábios se separaram percebo aquilo que fiz. E percebo que não foi tão mau quanto eu esperava. Não, percebo que não esperava que fosse mau. Nunca na minha vida pensaria que beijá-lo, Filipe Gomes, fosse uma coisa má.                                                 
_ Fica comigo, esta tarde. Por favor. - pede-me, os seus olhos nos meus, vendo-me por completo. Algo que só ele consegue fazer.                                                                                  
Agradada pela ideia, baixo-me para pegar na minha mala e tirar o telemóvel de lá. Como o excelentíssimo senhor - realmente excelente homem - á minha frente decidiu encurralar-me entre os seus braços e a parede, consigo perceber a sua testa franzida perante o meu movimento. A sua expressão fez-me rir.                                                 
_ O que é que estás a fazer? - pergunta, confuso, fazendo-me levantar os olhos do ecrã. Sorrio-lhe e deixo um beijo nos seus lábios antes de me voltar a concentrar no que estava a fazer.       
_ Vou mandar uma mensagem á Luana. Era suposto neste momento eu estar a falar com o professor de Educação Física para ele nos dar dispensa e podermos ir ás compras mais cedo. Tudo ideias dela, mas como boa amiga que sou... Então vou cancelar os planos com ela já que outros surgiram. - volto a olhar para ele, para lhe piscar o olho. Em troca deu-me um beijo na cabeça. - Acho que ela vai perceber se eu o disser com carinho.          
_ Não, minha querida...não por mim. Vai, aproveita. - profere, levantando o meu queixo para que olhasse para ele, como que reassegurando que não havia problema.         
Para ele não.                                            
Mas eu não ia perder esta oportunidade. Não vou.                                                                                   
_ Sim. Principalmente por ti. Já passou muito tempo, demasiado! É que com ela eu passei literalmente os últimos dois meses, e digo isto com todo o carinho por ela. Mas eu já não tinha isto - pego na sua mão e coloco-a do lado esquerdo do meu peito para que sinta os meus batimentos e como são rápidos. -  aos mesmos dois meses. Não vês? Não achas que tenho razão?                                   
Os seus olhos tomam o tom mais bonito que já vi na minha vida. O verde da parte de fora da íris fundiu-se com o castanho-claro do centro e aquela cor passou a ser a minha preferida. Perder-me aqui seria a morte perfeita.                                                                           
 _ De certeza que ela não se vai importar? De certeza que preferes vir comigo? - pergunta novamente e agora sei que não está a perguntar por perguntar. Quer que eu diga que o escolho. 
_ SIM, de certeza! A não ser que queiras tu que eu realmente vá com ela... - resolvo brincar com ele. De qualquer forma, o jogo estava a virar. Muito, muito lentamente. Tudo o que fiz foi acelerar o processo. Então dou lentos passos até á porta, pegando, inclusive, na mala, que tinha ficado na primeira mesa. Quando estou a centímetros da saída, sinto os seus braços á volta da minha cintura puxando-me novamente para dentro. Com uma mão voltou a empurrar a porta, que ao fechar fez muito mais barulho que o esperado. Ainda presa, viro um pouco a cabeça apenas para ver que ele sorri perante a situação, e isso é o suficiente para que eu não comente o que acabou de se passar. Agora resta rezar para que ninguém decida vir averiguar a situação.               
_ Isso é que não. Nem. Penses. - a sua voz baixa e grave para além de levemente rouca no meu ouvido provoca-me arrepios por todo o corpo. E ele parece perceber, porque sorri satifeito depois de me deixar um beijo leve como um sopro no pescoço.                                  
Depois de uns minutos para nos recompormos, saímos da sala. O corredor estava vazio e silencioso ao contrário dos restantes dois, então pensamos que seria melhor (para nós) e menos óbvio para terceiros o que se estava a passar, se saíssemos da escola com alguma distância. A cada passo dado senti a falta do calor que me era transmitido pela sua mão nas minhas costas.                                       
_ Olá! - digo assim que entro no carro.               
_ Olá, minha querida. Pronta? - volta a cumprimentar-me com um sorriso e um beijo no rosto. Acho que foi dos seus gestos mais queridos. 

***
_ Bem-vinda a minha casa! - diz abrindo a porta e deixando que eu entre primeiro, como um verdadeiro cavalheiro.
É tão acolhedor...é um apartamento grande mas bem decorado. Os móveis parecem ter sido feitos á medida para lá, está tudo perfeitamente posicionado. A porta de entrada dá diretamente para a sala de estar, portanto os meus olhos recaíram instantaneamente no sofá e fui assolada por uma grande vontade de correr para lá e passar o resto da minha vida ali, deitada com ele. - E...o que achas?
_ É incrível, Filipe...não te cansas de me surpreender? 
_ Não, meu amor, nada em relação a ti é cansativo. Até pelo contrário... - o seu sorriso travesso volta em força. Meu Deus, o homem quer matar-me! Aproxima-se e põe as mãos na minha cintura com a maior naturalidade do mundo, puxando-me depois para mais perto. Os seus olhos passeiam pelo meu rosto como se fosse a primeira vez. Como se fôssemos apenas Filipe e Beatriz. Nada de relações profissionais.
Na mesma medida respondo ao por os meus braços á volta do seu pescoço, gesto ao qual ele responde com uma respiração profunda, soltando todo o ar pelo nariz. Novamente, este é um jogo que ambos sabemos jogar. Ele avança lentamente até aos meus lábios, testando a minha paciência. Isto é tortura - mas desta não deixo de gostar. Agora a meros milímetros de mim, a meros milímetros da perdição, o tom de toque do seu telemóvel ecoa pela casa.
Lábios encontram-se.
Ele ignora o som.
Sim, eu também posso fazê-lo.
Segundos depois volta a tocar. 
_ Filipe...- consigo dizer, separando-me um pouco dele, apenas o suficiente para conseguir olhá-lo nos olhos. - Filipe...dev... - ele interrompe-me com um beijo, agora leve, e volta a afastar-se.
_ Tens razão. - diz, e ainda que contrariado vai tirar o dispositivo de dentro da sua pasta. O seu semblante muda de chateado para feliz numa fração de segundo, ao ver quem é do outro lado. - É a minha irmã. 
Sorrio de alívio perante esta informação. Assim, ele impediu que a minha mente começasse a especular e a pôr hipóteses...que nem quero mencionar. A ideia dele a sorrir perante o nome de outra mulher dá-me voltas ao estômago.
Enquanto ele fala com ela, vou dar uma vista de olhos pela sala. Ele tem montes de livros, todos muito bem organizados numa estante que ladeia o móvel da televisão. Também há algumas molduras, e ele aparece em quase todas, já que na maioria são fotos de família, parece-me. Seguro entre as mãos uma em que ele aparece ao lado de um senhor que terá por volta de uns 50 e tal anos e ambos estão a sorrir. Observando-a melhor, percebo que têm traços parecidos. 
_ É o meu pai. - ouço a sua voz atrás de mim e quase atiro a fotografia pelo ar. Quando é que ele terminou a chamada? E quando raio é que chegou ao pé de mim?
_ Merda, Filipe, assustaste-me! - reclamo com ele, apesar de me rir, pousando o objeto no devido lugar enquanto ele me puxa para o sofá, também divertido com a minha reação. 
_ Desculpa, desculpa... - sento-me ao seu lado, com o cotovelo apoiado na parte de cima do móvel, de forma a poder olhar para ele. - Então...a minha irmã tencionava vir aqui almoçar comigo. Como ainda temos assuntos pendentes, disse-lhe educadamente que não. 
_ Oh, por mim não, Filipe. - imito as suas anteriores palavras e sou olhada com uma expressão de "a sério?". Esse olhar faz-me perceber que ele ainda não acabou de falar.
_ Sim senhora, e não adianta reclamar. Eu também vi muito a minha irmã nos últimos tempos. E não senti o que sinto agora nesse entretanto. - também me imita e não deixo de sorrir, de certa forma sem jeito. - A conclusão que tiro é que nós realmente combinamos, Beatriz. Rejeitamos duas pessoas por isto sem pensar duas vezes. Acho que é um sinal. 

Um sinal. 
Começo a achar que tudo até agora foram sinais.
Apenas não estava aberta a vê-los. 
Acho que realmente é o destino. 

Meu Querido ProfessorWhere stories live. Discover now