Capítulo 28 | Blind

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Beatriz
Nos últimos dias, mais precisamente na última semana, a escola parece mais vazia. Os corredores continuam cheios durante os intervalos, os professores continuam os mesmos e as funcionárias continuam nas mesmas posições, a chatear-nos as cabeças por coisas que nem sequer fazem sentido, mas há um vazio. Há um espaço, que até agora eu desconhecia ser assim tão grande, provocado pela ausência dele. Apesar de detestar admiti-lo, sinto a sua falta. Mais ainda, estou perdida. Sem saber dele, sinto-me assim e não gosto da sensação. Nem. Um. Pouco.
Nesse entretanto, a Luana tem sido uma grande ajuda. Tem praticamente vivido comigo, para minha alegria, e claro, da minha mãe. Chegamos ao fim de mais um dia, que passou surpreendentemente devagar. Atravessamos a rua para ir ao Subway buscar os nossos habituais latte's.
_ O que vai ser hoje, meninas? - a empregada de balcão pergunta a sorrir quando nos vê entrar, por já nos conhecer. Todas as terças-feiras era dia de café. Olho para a Luana, que me retribui o olhar com um sorriso a brincar-lhe também nos lábios.
_ São dois de Avelã, por favor. - peço.
_ E cookies para acompanhar! - pronuncia-se e ao perceber que olho para ela a rir e a abanar a cabeça, dá de ombros. - Nós merecemos, hoje o dia foi pesaaado.
A moça riu-se, acompanhando-me enquanto preparava as nossas bebidas e nós viramo-nos para a rua, não fosse algum jeitoso passar. Percebem, não?
_ Obrigada! - agradeço e seguro os copos enquanto a rapariga faz o pagamento.
Abro a porta, empurrando-a com as costas enquanto ela guarda a carteira na mochila e ajeita o cabelo revolto devido á pequena rajada de vento que acaba de entrar dentro do ambiente quente e acolhedor da loja.
_ Pronta? - pergunto, a brincar com ela e o olhar que me lança faz-me sorrir. Mas o sorriso desapareceu assim que vi um carro preto passar naquele exato momento. Melhor, assim que vi quem o conduzia. Não pode ser...
_ Wow, viste um fantasma ou quê?
_ O quê?
Ela coloca-se á minha frente e estala os dedos para me 'despertar'.
_ Estás bem? É tipo, a segunda ou terceira vez que ficas parada do nada, a olhar para sei lá onde. Parece que ficas em transe! - pergunta, tomando-me o seu copo das mãos.
_ Eu...sim, estou bem. Não é nada, a sério. Nem sei o que me deu. - solto uma risada fraca, tentando ao máximo tirar aquela ideia da cabeça. Felizmente, ela está demasiado distraída com as pepitas de chocolate amolecidas da bolacha para continuar a conversa naquele tópico.
Chegamos a casa e fomos diretamente para o meu quarto, onde liguei o telemóvel e claro, nenhuma notificação. De que é que eu estava sequer á espera? Que ele me ligasse? Nem tinha a certeza de que era ele no carro!
_ Então, as férias de Natal estão a chegar e eu estava a pensar: já que não...- cala-se e eu percebo o porquê. Ela ia dizer 'Já que já não estás com o Filipe'. Então, lanço-lhe um pequeno sorriso e encorajo-a a continuar. Apesar de aquilo doer, quero ouvir a ideia dela.- Estava a pensar que podíamos passá-las juntas. Eu, tu, e as nossas mães claro. Temos de ter uma fonte de rendimento. - pisca-me um olho ao terminar a última frase e mais uma vez, rio. É este o apoio que tenho recebido, o que me tem mantido na linha, digamos.
_ Claro, adorei a...- o som de 'Here Comes the Sun' - The Beatles, ecoa pelo quarto e ao olhar para o ecrã do meu telemóvel vejo as tais palavras. Pessoa Preferida. O meu coração põe o pé no travão.
_ Eu estou aqui, Beatriz, então quem raio te está a ligar agora?! - pergunta, desconcertada, confusa. Só então percebo que não alterei nada no meu telemóvel nem no meu coração.
_ É...ele. -  digo após desligar a chamada e ela levanta uma sobrancelha, precisando de mais detalhes. Relutante, depois de suspirar continuo - É o Filipe, ele fez isto no dia em que nos beijamos pela primeira vez e "saímos juntos". - faço mesmo as aspas falsas com os dedos e revivo tudo na minha cabeça. Já devo ter feito isto umas 30 vezes e é sempre um choque enorme.
_ Ah, eu não fazia ideia. Desc...
_ Não, não te desculpes, tu não tinhas como saber. - coloco uma mão no seu ombro, apesar de responder num tom de voz mais frio. Revê-lo mexeu comigo, que raiva! - Ainda não acredito no que vi, sabes? Realmente não sei, não consigo perceber como ele foi capaz. Ela estava praticamente em cima dele. Eu vi, Luana...e doeu. Ainda dói, merda! Porque é que só queremos aquilo que nos mata? Porque é que eu tive que me apaixonar por ele? Logo ele?! Que estúpida... - encolho os joelhos e prendo-os com os braços, enfiando depois a cabeça aí.
Percebo que se aproximou ao sentir o colchão afundar ao meu lado. As suas mãos afagam-me suavemente os ombros e vejo lhe no rosto aquela expressão de pena que já me é tão familiar. Ela já estava habituada áquela minha lamúria e sabia sempre o que dizer para me acalmar - na maioria das vezes, pelo menos. Por achar que aquela história estava mal contada, havia dias que o que me dizia não servia de muito para acalmar - até pelo contrário. Apesar disso sinto-me uma amiga de merda, parece que a única coisa que faço é ser dramática.
_ Eu sei que achas que tudo foi um erro, então, pela primeira vez, não te vou contrariar. Ok, foi um erro. Pode até ter sido um dos grandes. Mas isso não significa que haja algo de errado com isso. Está tudo bem em errar, em enganar-nos, porque é assim que aprendemos. E assim, talvez possas aprender a ouvir...a ouví-lo. - assim que estas últimas palavras deixam os seus lábios, reviro-lhe os olhos. Como sempre. - Eu já te disse, Bea, e volto a dizer. Isto não me cheira bem. Caramba, eu vi-vos juntos, vi a forma como se olhavam, a preocupação nos olhos dele inúmeras vezes quando se tratava de ti e de 'mau' na mesma frase. Por Deus, parecia que se tratava da própria vida! Ele não te iria fazer isto. Por favor, ouve a versão dele. Por mim. - olho-a com o típico não-podes-estar-a-falar-a-sério e ela exalta-se. - Tu nem o deixaste falar uma única vez! - É assim, estourada, mas eu sei que é tudo para me ver bem e feliz.  A raiva atinge-a.- Tudo por causa daquele estúpido do Pedro! Ele afetou-te mesmo, não foi? Tu nem sequer consegues aceitar que alguém te ame mesmo e não te traia!
Assim que a vejo passar as mãos pelos caracóis com força, endireito-me na cama. Ela só fazia isto quando estava realmente exaltada.
_ Luana... sabes de algo que eu não sei? - pergunto, desconfiada. De facto, ela fala como se soubesse algo bastante importante.
_ Sei, é claro que sei. Mas quero que descubras por ti própria. Quero que percebas que ele está tão miserável sem ti como tu estás sem ele. - arregalo os olhos, por não esperar ser atingida com tantas verdades ao mesmo tempo - A sério. Se achas que o teu registo de chamadas está muito cheio, espera até veres o meu, chèrie. Por favor, ouve-o.
O quê? Não! Sento-me com os pés para fora e encaro o chão enquanto processo tudo o que acabei de ouvir. Estive enganada este tempo todo? Estive assim tão cega pela raiva? Ou seria pelo...amor?
Tirem-me deste filme!

Meu Querido ProfessorOnde histórias criam vida. Descubra agora