Capítulo 57.

820 188 162
                                    

Quando ela se moveu, fechei os olhos por reflexo, esperando pelo golpe do bastão. Então, uma sensação muito pior do que a dor me atingiu quando ouvi os ganidos de Mei. Abri os olhos e amaldiçoei o vinho que tomei por ter prejudicado meu raciocínio a ponto de não me lembrar de trazer um facão. Ainda assim, preparei-me para lutar com Pantera como possível pela vida da minha cachorra.

Então, encontrei ela aos seus pés, lambendo a mão que tentava afastar seu focinho enquanto abanava o rabo sem parar, parecendo genuinamente feliz por ver a líder. A mulher tentava conter a alegria do Pastor, encarando a mim e Samuel com uma expressão definitivamente assustadora — mas um pouco prejudicada pelo fato de estar usando um roupão felpudo.

— E de qual de vocês dois foi essa ideia genial? — ela perguntou, os olhos de águia indo de mim até Samuel, então permaneceram nele. — Quer saber? Acho que eu não preciso de resposta.

Engoli em seco, nervosa com que tipo de consequência aquilo poderia ter para o meu amigo. Samuel, ao contrário, apenas cruzou os braços, parecendo quase desinteressado.

— Como você soube? — perguntou, como se não estivesse diante de uma mulher pronta para acertá-lo com um bastão.

Pantera ergueu uma sobrancelha e apontou para uma estante de madeira em uma das paredes do quarto, repleta de livros e decorações antigas que já estavam pegando poeira. Franzi as sobrancelhas, demorando a entender o que havia ali, até identificar um aparelho branco que eu só sabia dizer o que era por ter visto em filmes.

A babá eletrônica era um modelo antiquado que apenas transmitia som, mas foi o suficiente para nos denunciar à Pantera.

— Você deixou uma babá eletrônica aqui? — Samuel perguntou, confuso. Enquanto a simples presença daquela mulher (e do seu bastão) me fazia tremer de medo, meu amigo agia como se aquele confronto fosse só mais um dia corriqueiro.

— Sim, eu não posso levar Mei para dentro por causa do Lobo — justificou, colocando as mãos em punho na cintura. Seu roupão era largo e felpudo, com o mesmo tom de branco das tatuagens que enfeitavam seu rosto. — Botei aqui para saber se ela ficaria bem, mas foi melhor do que eu esperava conseguindo flagrar vocês dois. — Ela deu uma risada, então segurou o bastão com as duas mãos. — Eu pretendia usar isso se encontrasse alguém tentando me sabotar... então, vamos lá, me deem um bom motivo para não fazer isso.

— O acordo era que Rebeca poderia ver a Mei aos finais de semana, mas ela está praticamente presa naquele condomínio. — Samuel não perdeu tempo.

— Ela poderia ver a cachorra se colaborasse e Ana não acha que a atitude dela está digna desse direito.

Então, furiosa, falei sem pensar:

— Ana quer me fazer pagar por ter tomado uma surra minha na sua frente — respondi e aquelas palavras arrancaram um sorrisinho de Pantera. Então, desejei que Ana nunca soubesse sobre aquilo. — E... por ter quebrado o nariz de Igor.

— Já parou para pensar que eu concordo com a forma dela de lidar com as coisas? — Ela ergueu uma sobrancelha para mim, sem tirar aquele sorriso babaca do rosto.

Fechei as mãos em punho, desejando mais do que tudo poder acertá-la. Então dei um passo para frente e Samuel também se moveu, provavelmente querendo impedir que eu iniciasse uma briga, mas a minha intenção era apenas encará-la de perto.

— Então por que você não para com esse teatrinho de que só estou trabalhando para você e assume logo que sou uma refém, e você não tem qualquer intenção de me deixar ir embora?

Não sabia dizer se era o álcool que fazia meu sangue ferver e prejudicava o raciocínio, ou simplesmente atitude desinteressada de Samuel em frente à Pantera que me dava alguma segurança para erguer a voz com ela.

Em FúriaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora