Capitulo 4 - Magos e enigmas

25 4 0
                                    

Evangeline pensou em cada palavra dita pelo Corvo enquanto voltava para casa no Vilarejo Leste, especialmente quando ele a chamou de "humanazinha", como se ele estivesse além desse título. Como se não fosse humano.

O que ele era? Um feiticeiro, como o convidado de Lassun? A maneira como ele desaparecia e seu conhecimento sobre sua mãe, nascida em Silverglade, sugeriam isso. Mas os feiticeiros eram humanos que dominaram a magia, e o Corvo era... diferente.

Apesar do aparente rancor em relação à sua família, ele não se referiu à mãe da jovem da mesma forma que a Evangeline, chamando-a de humana ou algo parecido, apenas ao seu pai, chamando-o de humano de estimação de sua mãe.

O que ele estava insinuando com tudo isso?

Evangeline chutou uma pedra no caminho, frustrada. Ela foi em busca de respostas e voltou com mais perguntas. Agora, tinha feito um acordo com uma criatura maligna que, sem sombra de dúvida, viria cobrar sua dívida.

Ela precisava coletar mais informações, tudo o que pudesse, sobre o Corvo. Além disso, precisava conversar com seus tios sobre o pouco que descobrira. Mas não tinha certeza se era uma boa ideia contar a eles que havia feito um trato com um ser das trevas que a amarrasse a ele e a obrigasse a cumprir favores eventuais.

Se até ela queria dar socos na própria cara, tinha medo de como seus tios reagiriam a isso. Decidiu deixar isso de lado por enquanto e suspirou.

Após uma longa caminhada, finalmente avistou as casas no vilarejo começarem a surgir no horizonte.

Caminhando pelas ruas de paralelepípedos, o sol da tarde lançava longas sombras sobre as casas de pedra. A conversa com o Corvo ainda ressoava em seus pensamentos, as palavras "humanazinha" e "humano de estimação" martelando em sua mente. Ela precisava de respostas, e a figura do feiticeiro convidado por Lassun pairava em sua mente como uma possibilidade.

Ao chegar à praça central, seus olhos se fixaram em um homem alto e magro, com vestes negras adornadas com símbolos prateados. Seus olhos penetrantes a observavam com uma intensidade que a gelou por dentro. Era ele, o feiticeiro.

Por um momento rápido o suficiente, a necessidade de respostas falou mais alto que o medo de Evangeline daquele homem. Ela se aproximou do feiticeiro, que acompanhava cada passo seu em sua direção.

— Olá, soube que o senhor vem de Silverglade. — A jovem disse na tentativa de iniciar uma conversa, cheia de receio em sua voz delicada.

— Eu também soube de coisas sobre você. — Evangeline ergueu uma sobrancelha, curiosidade pairando em suas feições.

— O que, exatamente? — O velho de aparência magra e maquiavélica sorriu. Um sorriso que a perturbou mais do que qualquer sorriso perverso do Corvo.

— Algumas jovens da aldeia me perguntaram se você era uma bruxa. — Evangeline cerrou os dentes, uma raiva amarga tintindo em sua mente.

— Talvez eu deva transformá-las em sapos. — Seu tom de voz foi afiado, o que tirou outro sorriso perturbador do feiticeiro. — Mas não sou uma bruxa, sinto em dizer.

— Não, não é. — Seu tom de voz foi baixo, sinistro.

Céus, aquele homem a assustava.

Evangeline sempre pensou que sua mãe era uma feiticeira, dada à sua origem na terra dos magos. Isso poderia significar que, de alguma forma, ela poderia ter herdado o dom de manipular magia. Mas o feiticeiro afirmou com tanta certeza que ela não era uma bruxa que aquilo partiu um dos poucos fios de esperança que ela tinha.

— Minha mãe nasceu em Silverglade. Ela contava histórias interessantes de como é lá. — Evangeline precisava descobrir se aquele feiticeiro sabia algo que a ajudasse a encontrar seus pais.

— Diga-me, onde está sua mãe agora? — Ele perguntou com um interesse que a fez recuar.

Mentir não funcionaria. O feiticeiro logo descobriria que ela vivia com seus tios.

De repente, o sino da praça tocou, anunciando o fim da tarde.

Naquele momento, algo dentro dela a alertou que havia algo de errado. Evangeline não sabia dizer o quê, nem como sabia. Mas ela sabia. Mais que isso, ela sentia.

A garota olhou ao redor, buscando uma saída para aquela situação, arrependendo-se de falar com o homem.

— Desculpe, eu preciso ir. Estou atrasada para um compromisso. — Com isso, ela atravessou a praça o mais rápido que podia.

Ao olhar para trás, ela viu o feiticeiro observá-la com um olhar que a deixava gelada até os ossos.

Ao olhar para trás, ela viu o feiticeiro observá-la com um olhar que a deixava gelada até os ossos

Oops! This image does not follow our content guidelines. To continue publishing, please remove it or upload a different image.

Evangeline estava na cozinha com sua tia, cortando alguns legumes para o jantar. Myrian cantarolava uma canção enquanto se movia pelo ambiente. Aproveitando o bom humor da mulher, a jovem resolveu iniciar uma conversa.

— Conversei com o feiticeiro no caminho de casa. Ele é um homem... estranho. — Sua tia ergueu brevemente o olhar, uma mecha de seu cabelo castanho preso em um coque caindo solto em sua testa.

— Tome cuidado com quem conversa por aí, querida. Não tenho um bom pressentimento a respeito daquele homem. — Evangeline deu de ombros.

— Ele me disse que eu não sou uma bruxa... — Evangeline confessou, desanimada.

Não necessariamente porque ela queria ser uma bruxa, ela só queria ser parecida com sua mãe.

Sua mãe vivia aventuras, viajava entre reinos, conhecia pessoas novas e amores impossíveis, fugia de perseguidores e fazia tratos com criaturas sombrias. Ela nunca parecia ter medo.

— Sabe, Eve, nós não convivemos muito com sua mãe. Mas posso te dizer que você não precisa ser uma bruxa para se parecer com ela. A determinação dela está em seus olhos, a vontade de desbravar o mundo. E, além do mais, nunca soubemos se ela realmente era uma feiticeira. —Myrian disse pondo uma mão no ombro da sobrinha, sorrindo gentilmente.

Evangeline tensionou as sobrancelhas e seu lábio forçou um sorriso desconcertado. Em seguida, suspirou.

— Eu só queria saber mais sobre ela. Tudo o que ela me deixou foi um vestido e uma marca de Corvo no pulso. — Um suspiro também escapou dos lábios de sua tia.

— Sua mãe sempre foi um enigma para todos nós. Mas uma coisa que Varianth sempre deixou claro nas cartas que enviava a seu tio era o quanto amavam você. — Lágrimas brotaram nos olhos de Evangeline.

— Então por que nunca mais voltaram por mim? — Mágoa reluzia nos olhos marejados dela.

Myrian, olhando-a com compaixão, abraçou a sobrinha.

— Seja lá onde estejam ou o que quer que possa ter ocorrido, saiba que eles jamais se esqueceriam de você, Evangeline. — A jovem assentiu silenciosamente.

Quando se desvencilharam, ela voltou à cortar os legumes enquanto olhava para o céu através da janela.

Perguntando-se quando ela encontraria as respostas e a vida que ela sempre quis.

Lendas de amor e maldiçõesWhere stories live. Discover now