Parte III - Os Novos Estrangeiros - Capítulo 36 - "__Fale mais sobre isso."

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Rachel estava sentada confortavelmente em seu consultório em Paris:

__Fale mais sobre isso...

__Sei lá tia, a psicóloga aqui é você!

Uma garota de cabelos coloridos olhava para Rachel com desprezo, ela apresentava grande resistência terapêutica pensava a jovem psicóloga:

__Eu entendo o que você sente!

__Será que entende mesmo?

Rachel respirou fundo, parecia estar pagando tudo o que fizera para seus psicólogos durante a adolescência e agora do outro lado da mesa e com algumas rugas suaves visíveis no rosto, ela prosseguia tentando manter a calma e estabelecer uma resposta de reflexo:

__Tudo na vida tem as suas consequências...

__Vai me dar lição de moral, tia?

__Sim, sobrinha...

A menina sorriu encabulada e Rachel prosseguiu ajeitando os óculos de armações verdes:

__Somos livres para agir, mas não somos livres das consequências das nossas ações.

__Mas, essa frase é uma frase do hinduísmo, tia, você é hindu?

Rachel sorriu corando a face e respondeu:

__Gostei de você, sei que não poderia dizer isso, mas posso lhe contar uma coisa?

__Se demorar muito...

__Uma vez eu quase matei o meu A.T...

__Que dá hora, tia! O que você tentou fazer?

__Ele aceitou o convite para andarmos de carro e aí eu estava em depressão e queria me matar naquele dia, então acelerei minha Mercedez Benz até a velocidade limite e só freei o carro já perto de um cruzamento bem movimentado aqui mesmo em Paris.

__Nossa, que excitante! Você deveria ser bem louquinha nessa época...

Rachel sorriu de concordou gentilmente:

__Você nem imagina o quanto... Bem, mas sabe o que me fez parar o carro naquele dia?

__ Hum... Você estava apaixonada por ele?

O rosto pálido de Rachel ficou subitamente corado e ela respondeu:

__Bem, eu...

__Pela sua cara, estava...

__Tá bom, eu estava, mas eu parei também por que ele me disse uma coisa...

__Que poderia morrer por você? Que era um vampiro?

Rachel gargalhou de modo encantador:

__A realidade geralmente não é tão romântica, ele disse apenas que queria pilotar avião.

A adolescente olhava para Rachel decepcionada enquanto fazia uma bola de chiclete, e a psicóloga prosseguiu:

__Eu havia indagado sobre se ele teria ainda algum motivo para lutar, afinal ele já era "O Psicólogo", o cara que sabia tudo, entendia tudo da cabeça dos outros, da vida...

Ela continuava mascando chiclete e olhando com seus olhos esverdeados a íris castanha de Rachel:

__E eu me assustei com isso, ele ainda queria ser alguma coisa. Tinha ainda uma grande frustração para carregar na vida e mesmo assim era psicólogo ou tentava ser.

__E ele conseguiu pilotar avião?

Nesse momento os olhos de Rachel se tornaram pesados e ela se esforçou para conter uma lágrima no canto do olho:

__Sim, ele conseguiu, mas...

Uma lágrima deixou a lateral de seu olho direito salgada e ela concluiu com a voz enfraquecida:

__Ele morreu em um acidente aéreo com seu bimotor na Guiana Francesa há quatro anos.

__Que triste, hein tia!

Indagou a jovem, também contendo uma lágrima e indagou:

__E você superou a morte dele?

Rachel respondeu timidamente:

__Amores platônicos não morrem...

A jovem concordou entristecida e novamente desabafou:

__Tia; posso falar uma coisa?

__Sim, claro!

__Eu também tive um amor platônico... Bem menos trágico...

Rachel sorriu limpando o rosto com um guardanapo branco de pano, enquanto pensava que sem querer havia atingido a fase de respostas reflexas na Abordagem Centrada na Pessoa de Carl Rogers e prosseguiu com um ar bastante acolhedor:

__E como foi isso?

Os Novos EstrangeirosWhere stories live. Discover now