16- Bravateiro

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Alexia não estava preparada para o golpe que lhe atingiu o alto das costas. Como poderia? O ataque do elemental do ar à Amanda, bem diante de si, era um chamariz. Serviu apenas para tirar a atenção do verdadeiro perigo que rondava a retaguarda. Quando ela percebeu, era tarde demais.

Amanda não poderia ajudá-la, pois o maldito ser de ar fazia de tudo para tentar sufocá-la. Mas Alexia não se importou. Ao contrário, resignou-se; não havia muito o que fazer quando o oponente perfurava sua caixa torácica.

Esforçou-se para ao menos captar um relance de quem fizera aquilo. E é claro que não havia se enganado. Era um maldito vermelho.

Estavam bem na fronteira. Apenas o Desfiladeiro Deepness as separavam do território inimigo.

Ele havia pego as duas direitinho. Rubies faziam associações com entidades de qualquer elemento. Mas elementais de ar eram mestres da furtividade. Quando menos se esperava, já havia um retirando o ar de seus pulmões. Os vermelhos sempre tinham o elemento surpresa.

Por isso as coletoras treinavam o físico tão pesado. Para resistir à primeira investida e contra-atacar. No geral, os militares vermelhos não passavam por um treinamento físico tão intenso, pois aprendiam a utilizar-se dos poderes de seus parceiros de magia. A capacitação deles era mais focada nas ações em parceria.

Mas aquele vermelho era diferente. Sua força era incomparável. Só aquilo poderia explicar a ruptura em suas costas e os dedos dele remexendo suas entranhas. Mas como, sendo ele tão franzino?

Era como se procurasse algo. Mas o que? O que diabos ele estava fazendo?

Alexia soltou um gemido involuntário quando o assassino retirou a mão de dentro dela. Ato contínuo, foi como se ela tivesse ficado oca. Sentiu toda e qualquer magia se esvair de seu corpo, para sempre. Não percebia mais o fluxo de energia que a percorria e se concentrava no peito, como um pequeno sol.

Desabou no chão como uma avalanche e bateu o lado esquerdo do rosto. Quando começou a ofegar sabia que o fim estava próximo. Mas ainda não. Antes, precisava descobrir o que o maldito vermelho lhe tinha feito.

Fez esforço para virar e ficar com a barriga para cima. Parecia que o buraco em suas costas a puxava para uma escuridão sem fim.

Foi quando viu o brilho. Alguma coisa, um tipo de pedra preciosa em forma de órgão reluzia e tiritava na mão do vermelho. O sorriso cruel que ele estampava na face era quase tão ofuscante quanto a jóia.

Aquilo era... um Coração de Magia? Seu Coração de Magia?!

Mas o que ele poderia querer com aquilo?

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Esperei por dois longos dias. Mas ele não apareceu.

Brisa também não veio ao meu encontro.

Eu não devia estar preocupada. Talvez o assunto demandasse muito tempo. Talvez ele tivesse que ter ido a algum lugar bem distante em companhia do irmão. Mil e uma coisas completamente naturais poderiam ter acontecido.

Ainda assim eu me preocupava. Muito.

Podem chamar de intuição. Algo parecia errado. Só não sabia o que.

Embalei todos os meus pertences. A floresta estava silenciosa. Um tanto quieta demais até. Ignorei todos os meus alertas internos e segui ao ponto de encontro com Aman. Eu ainda tinha meus objetivos a cumprir. Depois eu pensaria em uma forma de encontrar Liam.

Uma angústia pressionava meu peito. A sufoquei. Não queria me sentir preocupada. Tinha que me concentrar no caminho.

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Bordas escuras cercavam a visão de Alexia. Ela sacudiu a cabeça e se arrependeu. O buraco nas costas lançou ondas de dor até o alto da cabeça. Mas conseguiu ver o vermelho guardando o Coração nas dobras da roupa. Ele sequer se preocupou com ela, passando ao largo com a maior tranquilidade, os lábios escancarados para cima. Era um sorriso largo, em uma boca exageradamente bonita, como se fosse desenhada. Não fosse o sorriso de um assassino talvez fosse agradável de se admirar. Os cabelos pretos e lisos lhe davam uma boa aparência.

Ele agora mirava sua próxima presa com olhos de ave de rapina. Amanda.

Esta estava ocupada impedindo que o elemental de ar lhe roubasse o oxigênio dos pulmões. Era perda de tempo lutar contra um elemental, toda coletora sabia disso. O ideal era se desvencilhar o mais rápido possível do ser e partir para cima de seu parceiro humano, destroçando o artefato elemental ou seu dono.

Toda vez que o silfo extraía o ar dela, Amanda fazia um gesto com a mão, que consistia em três movimentos rápidos. Isso causava um impacto no corpo oscilante do elemental e o afastava. Porém ela não conseguia se libertar dele. Sempre que tentava, ele sugava todo o ar para dentro de si, consequentemente arrastando-a para perto.

Amanda era uma coletora de contato. Sua especialidade era encher os braços de magia e descê-los em seus inimigos. Característica nada vantajosa contra uma entidade formada principalmente por vento. Alexia, em contrapartida, possuía muitos ataques baseados no poder do ar, e conseguia desmanchar um silfo com certa eficácia. Mas aquilo de nada adiantaria agora.

Amanda não conseguia ver com clareza, cada movimento demandava sua atenção, mas sua companheira parecia muito ferida. Não podia ficar ali enfrentando aquele elemental para sempre. Juntando toda sua energia e sentindo-a circular pelo peito, Amanda jogou ambas as palmas em direção ao chão, num movimento súbito e violento. A magia correu para obedecê-la, investindo contra o silfo e explodindo com toda a força. No mesmo instante ele foi lançado para trás, mas girou de forma quase impossível, estendendo o braço na direção de sua oponente. Amanda foi capturada em um vórtice de vento descomedido, arrancada do chão e atirada no vazio, dando várias voltas em torno do próprio corpo.

Caiu como um saco de batatas e uma pressão enorme concentrou-se em seu peito. Provavelmente tinha quebrado alguma costela.

Quando tentou se levantar, o mais rápido que podia, sentiu uma mão agarrar-lhe os cabelos. Quando foi forçada a olhar para cima, o vermelho estava sobre ela. Ele aproveitou para circundar seu pescoço com a outra mão.

— Queria que a sua aluninha estivesse aqui, vendo enquanto acabo com você. Que lindo isso seria.

Amanda ficou alarmada. Ele sabia sobre Adri? Encarou com firmeza os olhos dele, cor de âmbar como mel. Notou um prazer obsceno que escorria como veneno. Aquilo lhe produziu um ódio que subiu como bile e ela movimentou a mão para lhe dar um soco. Mas a dor no flanco foi muito forte. De qualquer forma ele notou sua intenção e apertou-lhe o pulso.

— Não importa que ela não esteja aqui. Logo ela encontrará seu cadáver. Seu Coração de Magia também será meu...

Ele ergueu pelo pescoço o corpo da adversária subjugada, de modo que tivesse livre acesso a seu peito. Largou a mão dela e logo puxou o braço para trás, para dar um golpe diretamente entre os seios.

Mas tal golpe nunca veio.

Em vez disso, uma pedra de bom tamanho é que explodiu bem na têmpora do vermelho, arrancando-lhe sangue aos borbotões.

— AMANDA! CORRA!

Com as últimas forças que lhe restavam, Alexia se aproveitou da distração do maldito e atacou da única forma que podia. Afinal, todos aqueles músculos tinham que servir para alguma coisa. E serviram. O vermelho cambaleou como um bêbado enquanto Amanda corria de qualquer jeito em direção ao desfiladeiro, tropeçando e caindo de cabeça barranco abaixo.

"Idiota! Eu não te salvei pra você se matar sozinha! Trate de sobreviver!" Alexia teve tempo de pensar.

— MALDITA! Você ia morrer logo mais, mas se prefere fazer isso com dor, atenderei ao seu desejo. — vociferou o vermelho, sacudindo a cabeça e soltando perdigotos.

A última coisa que cruzou o cérebro de Alexia foi de ter certeza de que aquele maldito não passava de um bravateiro. E ela se foi com um sorriso no rosto, antes mesmo que o vermelho pudesse alcançá-la.

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E agora, hein, gente? Quem será que fez isso com a Alexia e Aman..............?


Cenas para os próximos episódios... *_*

Dente de Leão -- Uma breve história anterior a Perna de MagiaWhere stories live. Discover now