28- Amor do Passado

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Amanda e Nicolas, o chefe das Forças Mágicas Armadas, cuidavam dos últimos trâmites. Liam finalmente estava livre para seguir o seu caminho, absolvido de qualquer acusação. Deveria deixar os domínios de Vila Arcana o mais cedo possível.

Não adiantou argumentar que Liam não tinha para onde voltar. Por mais que Nicolas entendesse a situação, nunca antes em nossa história um Rubie havia sido acolhido em nosso lar. E ele não poderia abrir exceção agora ou sua reputação estaria em jogo. Malditas tradições sem sentido! Não adianta usar a razão. Ela não penetra em convicções imutáveis, mesmo que absurdas.

A despeito disso, concederam a Liam dois dias para que pudesse se recompor antes de partir. É óbvio que ele ficaria em minha casa para se preparar. Meu pai não ficou totalmente contente com esta ideia. Não gostava muito de interagir com outras pessoas. E quando tal pessoa tratava-se de um Rubie, então, sua desconfiança triplicava. No dia em que Liam chegou, papai bem que tentou tomar alguns goles para se acalmar e aceitar melhor a presença de seu novo hóspede. Mas eu logo tomei as garrafas e as quebrei, despejando todo seu conteúdo na terra. Assim não haveria desculpas.

Não sei por que, mas acho que Liam estava gostando de me ver discutir com papai. Eu podia perceber um sorriso plácido em seu rosto enquanto brigava com meu velho por causa da bebida.

- Por que está com essa cara de bobo? - Perguntei depois que seu Raul cansou de se altercar comigo.

- Você e seu pai parecem ser bons amigos. É interessante de observar.

- Seríamos amigos ainda melhores se ele não bebesse tanto. É um hábito muito ruim.

- Não posso deixar de concordar, mas todos temos um defeito ou outro. Apesar disso, a relação de vocês é muito aberta, muito singela. Um cuida do outro. Gostaria que meu pai fosse assim também.

Imediatamente me senti mal. Eu não estava pensando na família de Liam, em como eles pouco pareciam se importar com os filhos.

- Me desculpe, Adri, não queria te fazer se sentir culpada. Não precisa fazer essa cara tristonha.

Então ele olhou por cima do meu ombro para ver se meu pai estava por perto. Não vendo sinal dele, capturou meus olhos com suas pupilas intensas, inclinou-se e me beijou suavemente.

Arrepios percorreram meu corpo e me fizeram esquecer tudo o que estávamos conversando antes.

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A chuva batia com violência em minha janela. Não que ela tenha me acordado, eu já não tinha conseguido dormir mesmo. Devia ser umas 3 da manhã. Minha cabeça estava distante, pensando em mil possibilidades, impossibilitando a chegada do sono. Logo mais, de manhã, Liam teria que partir. E levaria meu coração com ele. Eu pensava em como seria a vida depois de vê-lo partir. A mesma coisa de sempre, treinando e treinando. Virar uma coletora e continuar trabalhando. Como seria fazer tudo isso sem ter ao meu lado aquele a quem eu mais queria?

Angustiada e incapaz de ficar mais um minuto que fosse com meus próprios pensamentos, levantei. Agarrei o roupão que estava em cima da escrivaninha e o joguei por cima da camisola. Fui até a sala, onde Liam dormia no sofá. Me aproximei devagar, temendo incomodá-lo. Observei seu belo rosto simétrico e depois de um ou dois segundos, as pálpebras se levantaram.

- Ué... Você não estava dormindo?

- E estou. Tenho ataques de sonambulismo sempre que uma menina bonita se aproxima.

Sentei-me no chão em frente a ele, aplicando-lhe um soquinho no ombro. O temporal continuava a todo o vapor do lado de fora, o som que produzia ao atingir a vidraça como uma canção de ninar a embalar nossas respirações. Ficamos muito tempo só nos encarando, até que me inclinei e abracei sua cabeça desajeitadamente. Ele tirou um braço de sob as cobertas e retribuiu o gesto.

Dente de Leão -- Uma breve história anterior a Perna de MagiaWhere stories live. Discover now