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Nathan não quis conversar sobre o assunto na noite anterior, disse que me conhecia muito bem, e que eu não cumpriria a minha parte do acordo caso ele me contasse alguma antes. Então esperei, mesmo que tenha passado a noite inteira formulando as minhas perguntas.

Descemos do taxi em frente a um prédio moderno, as janelas eram espelhadas e refletiam o céu claro, não era um hospital como eu esperava, mas sim uma clinica sofisticada que prestava serviços privados na área de fisioterapia. Nem sei porquê aquilo me surpreendeu, obviamente Harry pagaria pelo melhor tratamento.

Quando entramos no prédio tive certeza que jamais poderia pagar por algo como aquilo, o lugar era muito sofisticado, sem sombra de duvidas muito caro. Eu e Nathan paramos na recepção e aguardamos em uma sala de carpete preto e cadeiras estofadas vermelhas. Todo mundo era muito simpático, sempre cumprimentando e sorrindo na nossa direção, e aquilo era assustador de mais para mim. Não estava acostumada a ter que ser simpática o tempo todo.

-Senhorita Mcgregor.- disse uma mulher loira, embalada em roupas esportivas e um sorriso plastificado. -Vamos nos trocar para começar a consulta?

Olhei insegura para Nathan, que apenas deu de ombros. Revirei os olhos e acompanhei a mulher por um pequeno corredor muito bem iluminado. Entramos em uma sala pequena onde ela me entregou uma muda de roupas, uma toalha e uma sacola com mais algumas coisas, que não me dei o trabalhe de descobrir o que era.
Assim que me vesti com a ajuda dela, o que foi muito constrangedor, voltamos para o mesmo corredor de antes. Ela parou, me obrigando a fazer o mesmo, quando chegamos à terceira porta depois do vestiário, onde se encontrava a placa "Treinador esportivo".

A mulher deu dois toques na porta antes de abrir, e me dar espaço para que eu entrasse com as muletas. Sim, eu ainda usava aquelas porcarias.

-Boa tarde senhorita Mcgregor.- disse um homem bonito e jovem, atrás de uma mesa sofisticada de vidro fumê.

O homem aparentava ter não muito mais idade que eu, usava uma camisa esportiva de corrida, e calças de moletom. Seu cabelo era negro e seus olhos levemente puxados nos cantos. Ótimo, um asiático ia ser responsável pela minha reabilitação. Todo mundo dizia que os asiáticos sempre fazem as coisas melhor do que qualquer um, esperava que ele fizesse um milagre com o meu tornozelo em poucos meses.

Passei uma das muletas para a minha outra mão, e me equilibrei em apenas um pé, para poder apertar a mão que o homem estendia na minha direção.

-Eu sou o Dr.Young, sou o fisiatra esportista da clinica. Vou cuidar pessoalmente do seu caso a pedido do Collins.- tentei não revirar os olhos, quando ele se referiu a Harry. Que ótimo, pela forma como ele estava falando os dois deviam ser amigos.- Gostaria de ouvir sua história primeiro, depois podemos começar o tratamento.

Ele gesticulou para que eu sentasse na poltrona a sua frente, de uma forma carismática que já estava me irritando. Apoiei as muletas ao meu lado, e sentei com cuidado, sentar ainda era uma tarefa difícil para mim, muito tempo com o gesso tinha deixado a minha perna rígida.

-Eu estava participando de um campeonato, a garota cruzou os pés por cima do meu pé, até que ele quebrasse.- disse de forma resumida, enquanto aqueles olhos pequenos me encaravam.

-Isso deve ter doido muito.- disse ele. Depois ele ligou a tela do monitor a sua frente, onde meus raio x, apareceram. Como ele tinha aquilo, eu não fazia ideia.- Pelo que eu posso ver aqui, foi uma lesão muito grave. Você ainda sente dores fortes?

Balancei a cabeça de forma negativa rápido de mais, não era preciso me conhecer muito bem para saber que eu estava mentindo.

-Preciso que você seja sincera comigo, estou aqui para te ajudar a recuperar seus movimentos o mais rápido possível, mas para isso preciso que você se abra comigo. Okay?- o homem me olhava com aquele olhar de quem espera mais, mas se ele soubesse como era difícil aceitar algo de Harry, entenderia porque era tão difícil aceitar aquilo tão fácil.

Me inclinei para frente, para que ele me ouvisse melhor, não queria ter de repetir aquilo caso minha voz falhasse.

-Harry deve ter te dito que eu não sou uma pessoa muito fácil, estou tentando fazer isso aqui funcionar, mas você precisa ter paciência comigo. Quero mais do que tudo melhorar, ou melhor, preciso melhorar o quanto antes, minha vida depende disso.

Ele concordou com um gesto de cabeça, depois voltou a olhar para a tela.

-Entendo, então não me veja apenas como seu médico, mas sim, seu amigo.- ele voltou a olhar para mim.- Vamos passar muito tempo juntos esse mês, então vamos deixar os problemas que te incomodam lá fora e vamos nos focar aqui. Tudo bem?

-Sim.- concordei.

Pela primeira vez alguém me explicou realmente sobre a dimensão do meu ferimento. Eu não fazia ideia do quão grave tinha sido, e pela primeira vez temi que nunca mais conseguisse voltar a minha vida normal.

Young era positivo, dizendo o tempo todo que a minha recuperação dependia só de mim, mas eu não tive muita certeza daquilo assim que coloquei, de verdade, meu pé pela primeira vez no chão. A sensação era estranha, e movimentar o pé parecia impossível.
Assim que examinou a limitação dos meus movimentos Young me levou para uma sala ampla, branca e cheia de instrumentos de fisioterapia, que era acessada pela porta ao fundo do seu consultório. Havia bolas enormes, cordas, anilhas, pesos e diversos objetos suspensos e adaptados nas paredes e em barras de ferro fixas ao teto. Um carpete que imitava grama cobria o chão, e uma pista de corrida contornava a sala, que tivemos que tirar os sapatos para entrar.

-Passaremos todas as tardes aqui dentro, quero que você se familiarize bem com esse lugar. É aqui que vamos recuperar completamente seus movimentos.- disse ele me olhando.

Olhei para o homem, depois encarei aquela sala, parecia uma sala de funcional aquilo, o que significava que ia ser puxado e cansativo meus dias ali. Era daquilo que eu precisava.

-Sempre que você entrar aqui, vai deixar as muletas lá fora. Okay?- disse ele.

Imediatamente olhei para ele, eu não conseguia caminhar sem elas, era bem mais fácil me movimentar sem o gesso, mas era impossível sem auxilio das minhas pernas emprestadas.

-Mas eu não consigo caminhar sem elas.- protestei.

Ele sorriu, depois deu um passo para frente, para que ficasse bem na minha linha de visão.

-Você não precisa delas aqui dentro, só da sua determinação e de mim.- ele estendeu a mão na minha direção.

Fiquei um pouco insegura, mas deixei as muletas ao lado da porta e subi no tapete com um pulo. Me senti animada quando ele sorriu para meu movimento, achando engraçado me ver pular em uma perna só.

-Você vai descobrir, que eu, sou a pessoa mais determinada que existe, quando eu quero.- disse sorrindo para ele.

Fomos até o centro da sala, eu dava pulos ao lado do homem que andava vagarosamente ao meu lado. Ele segurava a minha mão, e elogiava o equilíbrio que eu tinha sempre que o meu pé bom encostava no chão. Meia hora depois minha blusa estava coberta de suor, meus braços doloridos e minha perna boa bamba.
Young tinha me feito repetir exercícios de equilíbrio, assim como me fez colocar o peso na perna lesionada gradativamente. O conhecimento dele era vasto, ele me explicava cada movimento e para quê tudo aquilo servia, e como aquilo iria me ajudar. A intenção do médico era não só fazer minha perna ficar completamente boa, mas ao final me ver com meu funcionamento físico em dia. E aquilo era muito melhor do que eu poderia esperar. Quando eu voltasse aos tatames não só ia estar caminhando, como também preparada para voltar com tudo.

Depois que terminamos a atividade física que durou cerca de três horas, ele me colocou em uma banheira enorme de gelo, para que meus músculos relaxassem completamente. Quase morri congelada dentro daquele tanque, mas a sensação que senti após uma chuveirada foi libertadora.
O tratamento era sim de primeira linha, depois de tudo aquilo eu ainda tive uma sessão de uma hora de repouso com fios ligados aos músculos da minha perna. Correntes elétricas emitiam vibrações nos meus músculos, me fazendo sentir até mesmo as partes que estavam adormecidas na minha perna. A sensação era boa, e quando ele me ofereceu fones de ouvido tudo ficou perfeito.
Young me deixou em uma sala escura, com fones de ouvido e um aparelho digital, para que eu criasse uma playlist de musicas para meus dias ali. Fiquei por mais uma hora ouvido ótimas musicas e curtindo aquela massagem elétrica.
Aquele foi o único momento da minha vida, em que amei Harry, sem peso nenhum na minha consciência.

Quase, sem quererWhere stories live. Discover now