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Harry estava de mãos vazias, mas só pela forma que me olhava, eu podia ver o quanto seu coração estava aberto. Ele não disse nada, apenas arrastou a outra banqueta para dentro da cozinha, a posicionando para ficar sentado bem a minha frente.
Depois nos serviu em silencio, sem nem mesmo olhar para mim, o que não queria dizer que ele estava tranquilo. Seus olhos verdes pareciam cansados, e seu sorriso arrogante tinha sido deixado em casa.
Ele terminou de servir nossos pratos, e depois sentou a minha frente. Quando finalmente seu olhar se encontrou com o meu, pude ver o quanto ele estava inseguro e ao mesmo tempo ansioso na minha presença.

-Tudo bem, eu vou começar.- ele disse, depois suspirou e encarou o próprio prato.- Você tinha razão, eu era um monstro. Mas não sou mais, e isso graças a você.- ele voltou a olhar para mim.- Eu sempre fui o tipo de cara que não acreditava em nada, que via o pior nas pessoas, inclusive em mim mesmo. Até o dia em que eu te conheci, você me fez mudar o modo de ver as coisas. De todas as pessoas, você era a única que não queria nada em troca, além do seu lugar ao sol. Me apaixonei por você no segundo em que te vi responder audaciosa para a professora de artes na nossa primeira aula juntos. Você tinha razão, se você não sabia desenhar bem não era justo ganhar aquela nota pelo desenho que fez, horrível diga-se de passagem.

Fui arremessada para aquela lembrança, naquele tempo eu nem conhecia Harry, mal tinha falado com ele. Mas lembrava daquela aula em especifico, do dia que me senti coagida por estar entrando em uma escola de bilionários, que eram tratados como reis, e nunca julgados pelos seus atos falhos.
Meu desenho era péssimo, mesmo que tivesse sido pedido algo abstrato e criado. Eu jamais mereceria um dez por aquilo. Então educadamente questionei a professora sobre a minha nota, e quando ele respondeu com a mesma cordialidade, que o que estava sendo avaliado era à força de vontade e não a perfeição, agradeci por sua conduta.
Mesmo que possa não parecer, sempre admirei as pessoas inteligentes e educadas.

-Você não era igual a ninguém que eu conhecia, você era justa.- Harry continuou.- Mas então eu estraguei tudo, me deixei levar pelo meu próprio ego e aceitei o maior erro que já cometi. Eu e Austin fizemos uma aposta, ele disse que eu não conseguiria conquistar você, se ele fizesse isso primeiro.- ele baixou os olhos, completamente envergonhado.- Eu sempre me dei bem com as garotas, e para mim aquilo seria só mais uma aposta idiota que faríamos, mas ai ele envolveu você e as coisas saíram de controle. A cada dia que eu via você com ele sentia ódio, de você e de mim mesmo, por não fazer nada. Eu sabia que ele estava te usando, e nem assim fui capaz de fazer nada. E você, que eu julgava tão esperta, caia naquela historia de "juntos para sempre", me deixando louco. Mas então quando a sua mãe ficou doente, e eu implorei para ela te contar, tudo mudou para mim...

Levantei a mão, o interrompendo pela primeira vez.

-Espera um pouco, do que você esta falando?- perguntei confusa.

Ele suspirou, depois voltou a olhar para mim.

-Eu fui o primeiro a descobrir da sua mãe. "O medico ruim" da sua mãe era meu tio, e acredite ele nunca ignorou as dores de cabeça dela. Ela só não estava pronta para contar ainda, então eu passei a me encontrar com ela no consultório do meu tio, para ajuda-la a lidar com aquilo.- meus olhos se encheram de lagrimas ao ouvir aquilo, jamais imaginei que poderia ouvir algo como aquilo sair da boca de Harry.- Ela estava com medo Anne, não queria deixar você e nem seu pai. Sentia que o seu dever ainda não estava cumprido, e que você se perderia sem ela. Exatamente como você fez.

Imediatamente lagrimas rolaram pelo meu rosto, então ele segurou a minha mão que estava em cima da bancada.

-Eu estava no hospital o dia que ela morreu, eu vi pelo vidro da UTI você segurar a mão dela até que tudo chegasse ao fim. E não há um santo dia que eu não pense naquele segundo, quando eu soube que viveria para te fazer sorrir outra vez.- ele apertou a minha mão, me consolando sem precisar de uma palavra se quer.

Quase, sem quererWhere stories live. Discover now