L

438 71 6
                                    

    De alguma forma, Mariana conseguiu acabar o jantar e passar o resto da noite, mas, quando, finalmente, o jogo de cartas foi interrompido e Giorgina acabou de tocar piano, sentia-se um verdadeiro trapo, pron­ta para ir para a cama

Oops! This image does not follow our content guidelines. To continue publishing, please remove it or upload a different image.

    De alguma forma, Mariana conseguiu acabar o jantar e passar o resto da noite, mas, quando, finalmente, o jogo de cartas foi interrompido e Giorgina acabou de tocar piano, sentia-se um verdadeiro trapo, pron­ta para ir para a cama.

O acontecimento mais memorável da noite fora o fato de a mãe não tê-la repreendido. Mas também não era difícil adivinhar a cau­sa do silêncio de dona Amélia. Cada vez que sua atitude sugeria que estava prestes a repreender a filha, Fernando lançava-lhe um olhar tão duro que ela não ousava abrir a boca. A cara que a mãe fazia por ter de controlar um comportamento habitual lhe dera muita von­tade de rir, mas Mariana não ousara fazê-lo. O amigo não estaria sempre por perto para protegê-la.

Depoisde fechar a porta do quarto, ela sentou-se à penteadeira e retirou as presilhas de seu cabelo. Odiava-as. Preferia seu cabelo solto, mas a mãe jamais permitia. Passou os dedos entre os cachos e sentiu a cabeça dolorida. Aquelas presilhas eram torturantes. Deixando a escova de lado, levantou-se, pegou o penhoar no armário e dirigiu-se até as por­tas francesas que se abriam para o penhasco, desaferrolhou-as e saiu para a pequena varanda. 

Aspirou aquele ar livre da atmosfera opressiva da sala de visitas,  A noite estava linda. O mar, cor de ametista, estendia-se até o horizonte, sob o céu estrelado. As ondas iam e vinham marcando um ritmo próprio. A crista das ondas, à luz da lua, parecia feita de renda. A brisa salgada estava quente. Mariana começou a duvidar da precisão do tio Joaquim. Fechou os olhos e ofereceu o rosto para ser acariciado pelo luar.

-"Quanta suavidade! Que luz brilha mais além, na janela?"
Surpreendida pela bela voz grave de Fernando vinda de entre as flores do jardim e recitando versos de Shakespeare, ela sorriu. Inclinou-se depois sobre a grade da varanda e recitou também, com ar trágico:

- "Oh, Romeu, Romeu! Onde estás, Romeu?"

- "Estou a leste e Julieta é o meu sol!" - continuou Fernando, saindo de entre os arbustos para que ela pudesse vê-lo.

Estava com a mesma aparência do primeiro dia em que tinham se encontrado. Sem casaco, nem gravata, nem colete, com a camisa um pouco aberta na altura do pescoço. Fazendo uma pose teatral, a mão espal­mada sobre o coração e a outra levantada acima da cabeça, recitou:

- "Levante-se, belo sol, e mate a lua invejosa, que já definha

por saber que esta linda jovem é mais bela do que ela!"

- Oh, tu declamas tão bem! - exclamou Mariana, batendo palmas, maravilhada. - Deveria estar nos palcos ingleses!

- Não tenho essa pretenção. Mesmo porque não o conseguiria nem se tentasse! -  respondeu ele. - Mas, desça aqui, Mariana, estou com vontade de conversar contigo!

Era uma vez... Os Alencar (FINALIZADO)Where stories live. Discover now