Periódico do Komainu, Muralha Contumax (Honra e Equilíbrio)

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Antes que o primeiro apito das aves ressoasse por todos os cantos da ilha, ao contrário de seus subordinados, que seguiam por entre as árvores de maneira sigilosa, os líderes marchavam de peito aberto pelo caminho principal da ilha: uma trilha única e extensa, sem qualquer desvio para a floresta. Decerto Pieri, em primeira instância, pareceu inquieta sobre essa escolha; oras, não era uma pirata de invasões suicidas e, a depender dela, os princípios de honra sempre eram os primeiros a serem descartados em alto mar, ainda mais na Grand Line. Contudo, exatamente por não compreender esse sentimento de devoção que ela decidiu por aliar-se (temporariamente) com piratas que preferiam morrer honrados a simplesmente viver sem dar a mínima. Em comparação aos Gatos, aquele bando era límpido como um riacho, e ela precisava desse pilar oposto para balancear suas escolhas: entre se importar demais e se importar de menos, ela preferia estar exatamente no centro, guiando seus próprios piratas às águas neutras de uma vida confortável. (Fora que também era uma baita chance de entrar explodindo tudo, o que seria incrível, mas esse assunto preferiu deixar de lado).

No fim das contas, seguiam os três, Hanzo, Pieri e Kristian, seu imediato, carregando sobre seus ombros uma atmosfera pesada que pairava como a premonição de uma tragédia, assombrando suas almas à medida que viam uma civilização dar as caras pelo mato alto do recuo. O capitão dos cães, em particular, ao olhar para tamanha devastação, parecia absorto em seus próprios pensamentos, caminhando lento atrás dos dois pierrôs enquanto sentia o cheiro inebriante da fumaça vinda do centro da ilha — mesmo ali, há quilômetros de distância da incubadora, era possível observar o sistema de aquecimento destilando dióxido de carbono na atmosfera, sujando o horizonte tanto quanto sujava as vidas de quem, algum dia, teve a infeliz sorte de cruzar seu caminho. O tempo não fora o suficiente para dar cabo daquela entidade.

Muito pelo contrário, aquele bando era como um parasita que, sem dúvida alguma, só havia se fortalecido enquanto ninguém o olhava. Era responsável por um céu acinzentado, como a fumaça; as plantas silenciosamente gritavam por suas vidas, as folhagens amarelaram-se e os fungos consumiam os troncos que apodreciam sem chance alguma de lutar. A quanto tempo não viam a luz do sol em sua plenitude? Intoxicados dia após dia com os fragmentos de fuligem e com os nutrientes sugados, não sobreviveriam por muito mais tempo; mas nem por isso deixavam de lutar. Não importava. Ainda que ficassem com o bando naquele dia; ainda que ele ficasse com o bando naquele dia, faria o possível para que todo aquele ecossistema morresse cedo ou tarde — pois toda folha contaminada havia de ser podada antes que manchasse o resto e...

Hanzo se interrompeu, sentindo o gosto amargo da desforra rastejando por sua garganta. Desejou internamente parar o que quer que estava prestes a fazer, entretanto, não parou de caminhar. Tinha consciência de que não havia mérito em buscar vingança — o fazia baixo igual a eles e, acima disso, o colocava na mesma posição de alguém que se considera melhor que Deus —, contudo, ainda que ciente dos riscos e preparado para as consequências de seus atos, o capitão sabia que era tarde demais para voltar atrás. Diria a si mesmo que, se estivesse sozinho, talvez pensasse duas vezes antes de se tornar sujo de sangue, mas a verdade é que nem assim seria capaz de deixar seu instinto humano para trás. Queria matá-los um por um.

— Cuidado aí, cara! — a voz um tanto hostil do imediato tirou-o dos próprios pensamentos. Ele havia o parado antes que se chocassem.

— Desculpe-me! — respondeu-o rapidamente, logo notando que os dois pierrôs estavam parados no meio do caminho por algum motivo maior. Hanzo quis perguntar o porquê de terem interrompido a caminhada, mas um súbito soco no estômago lhe tirou qualquer palavra subsequente: afinal, estava certo em pensar que Pieri não pararia seu caminho por um motivo qualquer e, dessa vez, a causa não era nada mais, nada menos que uma terrível encruzilhada.

Prisão de GatoWhere stories live. Discover now