Grand Line, loja de armas e outras vigarices (Pulvereta)

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A brisa fria alcançou os corpos inertes, causando um pequeno desconforto na pele; ainda que o dia estivesse extremamente ensolarado, os ventos dos mares nunca eram gentis. Contudo, isto não pareceu atingir o cozinheiro, visto que havia uma perturbação sobre si imensamente maior do que um mísero ventinho. De primeiro momento, nada respondeu, esperou que a dita cuja mostrasse a face (e talvez presas) para si, uma vez que ainda se mantinha em suas costas. Respirou fundo, não poderia surtar, independente do gênero ou espécie do que viria a lhe perturbar, era uma das malditas situações onde não poderia contar com ninguém além de si mesmo e, sobretudo, ainda tinha uma pirralha sob seus cuidados.

— Quem é? Não reconheço sua voz. — respondeu sem virar o rosto, a voz imponente o quanto podia, gostaria de evitar o mal estar o quanto pudesse e, se fosse possível, afastar a sujeita antes que ela resolvesse fazer algo pior. Já era de praxe, sempre empurrava com a barriga, até mesmo as urgências que estapeavam a face.

— Vejo que carrega uma bela arma! — a pressão que antes estava em seus ombros passou para o armamento, sentindo o peso aumentar em seus ombros e um imenso aperto na região do abdômen em decorrência do estresse e ansiedade. Os músculos do homem travaram e, ainda que fosse impossível, sentiu-se mais rígido que uma rocha: se a estranha cogitou segurar a besta em suas próprias mãos, desistiu no mesmo instante que ele tensionou seus músculos. — Vejo diversas marcas e imagino quantas histórias este belo armamento não vivenciou. As pontas das flechas gastas e com a aparência de que foram polidas inúmeras vezes, sinto que ela chegou já gasta em suas mãos, como um presente... ou uma maldição-fiyu. Ao menos é o que os espíritos sussurram para mim.

O súbito embrulho no estômago, antes fraco e suportável, se transformou em uma inexplicável vontade de golfar no mar. Estas histórias de espíritos e divindades não lhe atingiam normalmente, não tinha mais vinte anos para ser enganado por um trambiqueiro qualquer, entretanto, por mais que todos os seus instintos gritassem para ignorar aquela mulher, não olhá-la e apenas seguir viagem, algo em si parecia pressentir uma aura de caos em volta dela e, tomado pelo instinto de sobrevivência, resolveu repetir sua pergunta:

— Quem é você? — questionou, com a voz dura e sem qualquer vacilação, para então virar-se de frente ao inimigo. Não pôde deixar de sentir um ar de familiaridade e estranheza ao encarar a mulher esguia a sua frente, no entanto, não havia tempo para julgamento e, de toda forma, ele não estava em posição de julgar a aparência de ninguém: estava inteiro, mas sua face continuava completamente fodida devido ao chute de Bertruska.

— Irrelevante. — ela diz jocosa, olhando-o através dos olhos. Seu único olho era azul vívido, como um infindável mar de mistérios que Flint não estava nem um pouco a fim de desvendar. — Há quanto tempo tem sua arma?

— Uns sete anos, comprei de um vigarista antes de sair em jornada. E agora, qual o seu nome? — insistiu.

— Vejo que é insistente-fiyu! Me chamo Autumn, satisfeito? — respondeu entre risos, parecendo se divertir com a clara frustração do cozinheiro. — Me dirá o seu e de sua acompanhante?

O homem tinha uma das sobrancelhas arqueadas, ainda era preciso uma apresentação formal? Era evidente que aquela maluca já sabia sua identidade. Entretanto, por mais que se sentisse tentado a perguntar de onde se conheciam, uma informação lhe chamava mais atenção no momento: como ela sabia que viajava junto de Poyo? Quer dizer, ela poderia tê-la visto antes de embarcarem, ou então sentados juntos na balsa, mas não mudava o fato de que mal haviam conversado desde então — a menininha havia saído para caçar algo o que fazer já tinha algum tempo e, para todos os efeitos, eram no máximo conhecidos de momento.

— Não tem nenhum doce nessa carniça, Flinny... — a voz estridente da capitã alcançou seus ouvidos, se arrastando no apelido como forma de birra. Por que infernos essa imbecil precisa chegar justo agora?, ele pensou consigo mesmo, sentindo uma veia de estresse pulsar em sua testa. Se dissesse um nome qualquer a garotinha iria o interromper, berrando aos quatro ventos que era a capitã Poyo, desbravadora dos mares e não somente estaria nas mãos da maluca, como também deixaria a fachada de civis aos frangalhos. Só havia espaço para perdas. Finalmente, a capitãzinha para no lugar, olhando a estranha: — Quem é a mocreia? — perguntou.

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