Grand Line, Carniça (Casa de Banho)

8 4 0
                                    

Bertruska correu até o cozinheiro a fim de ampará-lo, mas não levou um segundo para que notasse o que havia ocasionado sua queda de pressão e, igualmente, sentiu seu coração disparar. A cerca de uma milha náutica de distância, o galeão marinheiro estava pousado intacto sobre as águas, ignorando a chuva fina que ainda caía sobre ambas embarcações. Sem ter o que dizer, os dois piratas apenas ficaram ali, completamente atônitos, até que Merin colocasse a mão sobre seus ombros, dando-lhes um terrível susto.

— Eu atravessei a porta — ela explicou, como se o problema das caras pálidas fosse o fato de não se justificar, não a situação como um todo. Depois disso, foram mais alguns segundos sem conseguirem se comunicar.

— Merin... — resmungou a ex-marinheira, quase sem voz.

— Ouvi isso se aproximando. Achei que estavam em nossa direção, por isso eu atirei...

E não estão vindo mais agora? — perguntou Flint, num sopro aturdido, interrompendo-a sem olhar para trás ou tirar as mãos do parapeito em que se apoiava; ele pouco se importava com o motivo de sua fuga para o andar debaixo alguns segundos antes.

Por sua vez, nem Merin e nem Bertruska precisavam olhá-lo para saber que estava pálido como papel, mas sua voz continuava firme e dirigente; nem mesmo o filete de bile que escorria pelo canto de seu lábio e as mãos tremelicando eram o bastante para tirar sua autoridade naquela situação.

— Eu... Eu não sei — confessou, abaixando a cabeça.

Então, sem ter como respondê-la, o cozinheiro apenas tombou a cabeça sobre a palma direita, massageando o entorno de seus olhos como se, de alguma forma, aquilo pudesse aliviar a enorme pontada no crânio que se alastrava. Precisava que Morgan lhe desse algo para enxaqueca, pensou consigo mesmo, suspirando pesadamente. Precisava que Morgan lhe medicasse e o filho da puta nunca estava disponível quando precisava, amaldiçoou. 

Por fim, antes que pudesse dizer qualquer outra coisa, um clarão súbito se fez presente por todo navio, seguido quase que imediatamente por um estouro ensurdecedor e um forte tremor que desestabilizou todo o convés, catapultando-os para a frente do barco.

Um raio. Flint viu o teto preto e, ao atingir o chão outra vez, quase vomitou.

— Fogo! — gritou Poyo, ao longe e abafada pela cabine.

Mesmo com o grito, sua cabeça pesou para levantar e ele não a olhou. Perdido ao alento, Flint tinha a visão turva, tanto pela tontura, quanto pela força que as águas agitavam todo o barco, mas pior do que isso era a água salgada que respingava forte em sua face, impedindo-o de puxar o ar para se recuperar. A tempestade e ondas haviam voltado com tudo e estavam invadindo a embarcação; não havia nada além de chão e fumaça escura. Pouco distante de si, a silhueta trêmula de Bertruska tentava se levantar, porém foi impiedosamente sobrepujada pela força do oceano que teimava em os amaldiçoar. Talvez tivesse batido a cabeça forte demais, pensou consigo mesmo, sentindo mais bile subir a garganta. Sem noção espacial, Flint tateou o chão, erguendo somente o tronco e reparando, por fim, a figura de Merin recostada a amurada, inconsciente. Tinha que tirá-la dali ou...

Mais uma vez, o mar invadiu o navio, atingindo-o na face e o acordando de prontidão: os estalos secos da gávea e o som sufocado dos trovões pareciam estar do seu lado, da mesma forma que o cheiro forte de queimado que penetrava suas narinas era mais real do que nunca. Torceu os pulsos para se pôr de pé. Em sua visão periférica, notou Poyo grudada na escotilha da porta e a visão terrível do céu cinza escuro, quase tão sombrio quanto o vulto que se aproximava em alta velocidade, um pouco acima do nível do mar. Tecnologia da Marinha, pensou, levantando-se o mais rápido que conseguiu. Agora tinha certeza de que aquele galeão era mesmo o que pensava e que estava vindo em sua direção.

Prisão de GatoOnde histórias criam vida. Descubra agora