Capítulo IX

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Enquanto andava pelos corredores do hospital em direção à sala dos atendentes, na intenção de se trocar, Carol refletia. Com a máxima atenção sobre os últimos quinze dias de serviço.

A médica mais velha, nas primeiras semanas de trabalho no Dr. José Guimarães, achava engraçado o comportamento quase que bipolar da catarinense. Achava graça na facilidade que era, para qualquer um, deixar Rosamaria irritada; ou ainda como ela torcia o nariz ao menor sinal de elogio vindo dela. Achava suas reações muitíssimo divertidas e fazia de tudo para provocá-las, com o único e singelo intuito de rir. Mas esse sentimento mudou. E como mudou.

Ainda achava engraçado, é claro, porém ela, agora, era dominada por outra coisa – a curiosidade.

Carol estava irrevogávelmente curiosa.

Como que, literalmente, de uma hora para outra, no mesmo dia, alguém consegue passar da total arrogância para ser incrivelmente gentil com uma criança – uma criança que nunca viu na vida! –? Como pode alguém abrir um sorriso enorme, com direito a olhos brilhando e tudo, por causa de um simples penteado, mas fechar a cara quando recebe um elogio? Será que Rosamaria não gostava de ser elogiada por ela, ou era algo generalizado? Ela sorria daquela maneira só para as crianças ou acontecia mais vezes?

Deus, que desperdício se for só pra crianças! Carol pensou, enquanto se questionava.

E, ainda, como alguém que te diz, sem problema algum, que só te suporta pode dizer as palavras certas, no momento certo, e que fazem sua cabeça girar e entrar nos eixos?

O episódio de dez dias atrás só inflou a curiosidade de Carol. Suas implicâncias agora tinham outra motivação – ela queria entender, de uma vez por todas, quem era Rosamaria. Queria testemunhar – e, portanto, provar – a dualidade das Rosas, já pontuada por Sheilla.

Perdida nesses e outros pensamentos, Carol se assustou quando viu Rosamaria sentada em uma maca vazia, que se encontrava encostada do lado de fora de um quarto que ela reconheceu como sendo de um de seus pacientes. Gattaz olhou, surpresa, para a mulher à sua frente.

— O quê cê' tá' fazendo aqui? — perguntou. Rosamaria levantou uma sobrancelha. Ao contrário da outra mulher, ela não se assustou; pois conseguiu ver seus pés por cima da tela do aparelho que segurava.

— Trabalhando? — respondeu ironicamente. Carol revirou os olhos.

— Vou reformular — falou — O que você está fazendo aqui?

— Ué — Rosamaria exclamou — Trabalhando.

— Caiu da cama, foi? — Gattaz provocou. O canto da boca de Rosa se retorceu.

— Quase isso — respondeu.

Às quatro e quarenta da manhã, Rosamaria já estava de pé. Seus sonhos foram muito atribulados e envolvendo pessoas aleatórias – gente totalmente nada a ver, ela pensou –, o que fez com que ela acordasse e não conseguisse mais ficar na cama. E, como não havia muito o que fazer em casa, decidiu começar o dia de trabalho mais cedo. Ela entrou pelas portas do hospital antes do relógio marcar as seis e meia da manhã.

— Tudo bem, então — Carol deu de ombros — Te encontro daqui a pouco pra a gente ir ver a Isabela — concluiu. A residente assentiu rápidamente com a cabeça antes de se levantar e seguir pelo caminho que Carol havia acabado de traçar. Ela não viu, mas Carol sorriu de lado enquanto voltava a andar.

Rosamaria quase caiu de cara no chão, quando chegou na recepção principal e tropeçou em Gabriela. A morena segurava dois copos de café, que não caíram por um triz.

The brain's heartWhere stories live. Discover now