Capítulo XXIII

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Sexta-feira.

Normalmente, Rosamaria arrumaria qualquer coisa para fazer acompanhada – com seus amigos ou com seus rolos por aí –, mesmo que fosse assistir um filme.

Mas não era normalmente. Era uma sexta, sim. Mas era a sexta que antecedia o final de semana mais importante da sua vida. No sábado ela teria que enfrentar a prova escrita e no domingo, logo em seguida, a prova oral.

Ela não conseguia escolher algo para fazer e ocupar sua mente, pois estava tentando decidir qual das duas provas era a pior. Andando de um lado para o outro na sala dos residentes, Rosa concluiu que na prova escrita pelo menos o objeto de avaliação é somente um (a resposta) e haveria o tempo para pensar. Provas orais não permitem isso. Além das respostas, são avaliados a postura, o tom de voz, a velocidade, o olhar, o raciocínio e muitas outras coisas que deixam a situação mais difícil.

Então, no lugar de planos de fim de semana, Rosamaria imaginava todas as coisas que poderiam dar errado naqueles dois dias, principalmente no domingo. Engasgar com a própria saliva, rir de nervoso e não conseguir pronunciar corretamente alguma parte do corpo eram cenários que ela já havia visitado. Chuvas torrenciais e múltiplos acidentes de carro que parariam o trânsito e a impediriam de chegar no local de prova a tempo também foram explorados.

Fernanda já tinha ido até a sala para "expulsar" os residentes dali, mandando que eles fossem relaxar e se preparar para as avaliações. Mas ao mesmo tempo em que Rosa queria aproveitar cada canto daquele hospital enquanto ali ainda era o seu espaço, ela simplesmente não conseguia desacelerar seus batimentos olhando os atendentes trabalhando.

Por fim, e vendo como não estava sendo nada produtivo permanecer ali, a residente decidiu ir à casa. Tirou os pijamas cirúrgicos, trocando-os por uma calça jeans, uma blusa branca qualquer e um par de tênis. Arrumou sua bolsa com algumas de suas coisas (passando ou não nas provas, precisaria tirá-las de lá) e saiu da sala e foi em direção ao refeitório.

Lá, entrou na fila do pão de queijo que comeria acompanhado de um café. Enquanto esperava sua vez de fazer o pedido, Rosa pensou em passar no quarto de Gattaz antes de ir embora. Queria se certificar se ela ficaria bem durante o final de semana e, além disso, buscar uma palavra de apoio de alguém que já havia passado por tudo aquilo.

Pensou também que eram muitas emoções para um fim de ano. Um namoro, um acidente, duas provas e um futuro incerto. Seu planejamento tinha uma data limite que estouraria dali dois dias. Depois disso, ela não teria certeza de absolutamente nada.

Seus pensamentos sobre o que faria caso conseguisse a aprovação foram interrompidos pelo atendente avisando-a que chegara sua vez de pedir.

Com seu café da tarde em mãos, ela caminhou calmamente ao quarto que abrigava sua namorada há pouco mais de uma semana. Chegou à porta e bateu duas vezes. Quando abriu, porém, surpreendeu-se com Caroline com o braço direito esticado para fazer a mesma coisa.

Assim que viu quem era, a médica sorriu e deu espaço para que Rosa entrasse. Carol vestia uma calça azul escura e uma blusa vermelha, enquanto os pés calçavam meias pretas sem sapatos. Rosamaria franziu o cenho.

— Quié' que tu tá' fazendo?

— Boa tarde, Rosa. Como cê' tá'? Posso pegar um pãozinho desse aí? — Carol ignorou totalmente a pergunta da mais nova. Mecanicamente e sem entender o que estava acontecendo, ela esticou o saco de papel para que a outra mulher pegasse um dos pães.

— Boa tarde — cumprimentou de volta. — Mas por que tu tá' sem pijama e andando de meia no chão de um hospital?

— Porque — Carol começou, fazendo uma pausa para terminar de mastigar o pedaço que tinha na boca. — Eu tive alta hoje.

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