The brain's heart

Capítulo XXXIX

Maio costuma ser um bom mês para Caroline. Tem o dia das mães que ela passa com sua família e com seus afilhados, além de mais algumas comemorações de aniversários entre parentes e amigos. Normalmente o quinto mês do ano tem uma boa energia.

Normalmente.

Dessa vez, maio estava sendo nada menos do que caótico para a neurocirurgiã. Dois artigos que ela precisava revisar e publicar dentro do prazo, além dos pacientes constantes e todas as cirurgias esporádicas faziam ela trabalhar muito mais do que o ritmo normal desde que conquistou seu lugar como profissional. Não que ela fosse arrogante ao ponto de achar que não deveria estar trabalhando desse jeito, longe disso. Pelo contrário, ela até gostava de quando as coisas ficavam um pouco mais agitadas; gostava de preencher sua agenda com medicina. O problema era que, dessa vez, a rotina repleta de prazos e linhas vermelhas no calendário estavam fazendo com que Gattaz tivesse deixando de lado a parte mais gostosa de sua vida naquele momento - seu relacionamento.

Mesmo que as coisas estivessem difíceis, e até meio estranhas por conta dos acontecidos do mês de abril, seu namoro com Rosamaria era, sem dúvidas, uma de suas coisas preferidas. As chamadas de vídeo à noite, antes de dormir ou na hora do jantar, sempre deixavam ela feliz e muitas vezes voltavam em sua mente em forma de sonho. Também era costume que elas conversassem pela manhã antes de sair de casa para o trabalho em suas respectivas cidades. Mas isso não aconteceu muito no mês de maio. Rosa também estava com muitos projetos em fases importantes de desenvolvimento e ela precisava se concentrar em fazer um excelente ano de especialização (o que, ainda que se tenha alguma perspectiva para os próximos anos, era crucial para sua carreira a longo prazo), e essa combinação de fatores resultava em uma frequência muito menor de contato entre as duas mulheres.  Na última semana elas não passaram de algumas mensagens trocadas por aplicativo, só para checar se estavam bem e fora de grandes perigos.

Essa distância – que dessa vez não tem nada a ver com os milhares de quilômetros entre elas – levou Carol a pensar se as coisas entre as duas mudariam, ou se esse era o momento em que tudo ficava sem graça e uma delas desistia do relacionamento. Mas essa ideia logo passou quando, no meio de uma madrugada aleatória ela acordou com uma ligação de Rosamaria, que havia tido um pesadelo e ligou para verificar de que era, de fato, só um pesadelo. A cara de sono e os olhos assustados de uma catarinense preocupada – que vestia uma camisa de Carol para dormir naquele dia – não deixaram espaço para que aquela nuvem da incerteza permanecesse. Era só um momento conturbado. O mês já estava no final e elas achariam o seu ritmo novamente, isso estava claro para as duas. Mas a saudade estava meio implacável.

Quando tudo começou, Caroline achava que seria só mais um dos seus romances de verão. Lá no fundo ela tinha essa sensação esquisita, principalmente porque elas não se conheceram de uma forma exatamente amigável. Mas aí veio o acidente. E Rosamaria ficou. Com um dia de namoro, ela ficou mesmo assim. Foi mais ou menos por aí que a médica começou a entender que estava vivendo algo totalmente desconhecido. E ela encontrou esse sentimento de não saber o que fazer em seguida várias vezes, inclusive agora. Era incrível como mesmo depois de tantos relacionamentos, uns mais duradouros que outros, estar com Rosamaria parecia a primeira vez. O que fazia ela se sentir meio estranha por isso. A primeira vez que ela admitiu isso em voz alta foi com Priscila.

— Amiga — Pri começou. — Para de bobeira.

Carol fez um biquinho e meneou a cabeça. Ela não tinha problemas em admitir que estava com saudades, não mesmo. A questão estava em lembrar da namorada nos momentos mais inimagináveis e sentir um aperto ridiculamente forte em seu peito toda vez. Aconteceu na última sexta-feira, quando ela viu um casal discutindo no supermercado sobre qual bebida levariam para fazer as caipirinhas da festa que estavam indo.