Capítulo 21

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Saio da casa de Catarina já anoitecendo. O pai dela se ofereceu para me trazer pra casa e eu aceitei, apesar de não ser muito longe, já que morávamos na mesma região, perto da escola.

Chegando em casa, tiro a roupa assim que fecho a porta. Estava morrendo de calor com aquela blusa comprida. 

Jogo em qualquer lugar do sofá, e fico nua andando pela casa até tomar coragem e entrar no chuveiro para um banho. 

Eu gostava disso, me dava certa sensação de liberdade, seria meio constrangedor se alguém soubesse, mas eu estava sozinha. 

Meus pais viajavam quase todos os finais de semana. Dave, meu irmão, morava numa cidade do interior e meus pais sempre iam vê-lo, o que também era uma desculpa para encherem a cara e colocar músicas chatas na maior altura, já que a casa dele era um sítio em um condomínio e podia fazer uma barulhada. Ele tinha se formado em Direito e ganhou a vaga de delegado nessa cidadezinha, então ele teve que se mudar. Ele era o orgulho dos meus pais, bem resolvido financeiramente e amorosamente. Ele tinha uma namorada, Helena. Conheceu na faculdade, e quando ela soube que meu irmão ia morar em outra cidade, não demorou para eles planejarem o futuro todo. Hoje eles moram juntos, e ela tem um pequeno escritório no centro da cidade. 

Ufa, isso me cansa, eles me cansam. Eles são tão perfeitos com suas vidas perfeitas que me dava raiva. Eu não sabia nem se ia passar de ano, que dirá o que fazer na faculdade para me sustentar...

Tipo, eu gosto de música, mas note que eu disse que preciso me sustentar. Sempre que meus pais perguntavam o que eu ia fazer eu dava de ombros e dizia que estava pensando, então eles me davam um puxão de orelha, porque eu já ia fazer o ENEM ano que vem. Era muita pressão. Como eles esperam que eu decida o que fazer com 17/18 anos? É loucura.

Enfim, sai do banho frio. Eu nunca me sentia totalmente limpa sem um banho frio.

Vesti a roupa mais confortável que eu poderia ter, ou seja a mais rasgada. Me joguei na cama e olhei o celular. Algumas mensagens dos meus pais perguntando se eu estava bem e grupos inúteis falando coisas inúteis, mas que eu nunca saia por motivos de não sei.

E me peguei indo ao perfil de Thomas e olhando a foto dele. De lado, sem mostrar o rosto, só o cabelo liso preto, mais curto na época da foto tirada e uma jaqueta. A foto estava em preto e branco. Me perguntei quem tirara essa foto, e já comecei com minhas paranoias.

Respiro fundo.

Pensei em mandar uma mensagem, mas mudo de ideia rapidamente. Beijei o cara hoje e já mando mensagem... Não quero que ele pense que estou na mão dele. Mas tô sim. Tô muito.

Resolvi me distrair. 

Tentei ver séries ou ler livros, no entanto me pegava distraída lembrando do beijo. Era impossível não sorrir, estava quase saindo lágrimas dos meus olhos de tanto sorrir. Tive que enfiar minha cara nos cobertores e travesseiros para ver se parava. 

Não parei.

O toque das mãos dele, parecia tão fresco, que ainda fazia meu coração acelerar.

"Que grande merda, hein Lilian! O cara te deu um beijo, e dai? Ele provavelmente já beijou muitas outras."  Falei para mim mesma.

O meu problema é que eu só tinha dois extremos de sentimentos nessa situação: A) me colocar para baixo, dizendo que eu estava sendo trouxa, e me fazer acreditar que eu não merecia aquilo e abaixando minha guarda. B) ficar extremamente feliz, e não saber controlar meus pensamentos a ponto de eu estar imaginando coisas que vão levar tempo para acontecer ou não vão acontecer e depois me decepcionar, ou seja, me iludindo legal.

Eu precisava comer. Eu sabia que ia descontar tudo que eu estava sentindo na comida, mas uma hora ou outra eu teria que me alimentar.

Como sempre, eu comi demais e me senti mal.

Tentei dormir. Não consegui. As imagens dessa manhã estavam gravadas na minha cabeça.

Comecei a mexer no celular e ver coisas aleatórias, mas eu sempre parava em algo relacionado ao Thomas.

Nesse ponto já era umas 3h da manhã e eu sabia que não tinha mais jeito. Não conseguia tirar ele da minha cabeça, então resolvi parar de resistir.

Pensei em tudo, fiquei feliz, me permiti sentir aquilo. 

Pensei muito em Thomas. Pensei em cada detalhe. Nos olhos pretos dele tão profundos, no cabelo dele, no qual eu queria pôr minhas mãos o tempo todo, o caminho da nuca ao pescoço, na curva da clavícula, e as veias em seus pulsos. Eu queria tudo aquilo. Eu queria beijar todo o corpo dele.

Me vi excitada pensando em todas aquelas coisas. Comecei a rolar pela cama pensando "não vou fazer, não vou fazer."  Mas eu fiz. Me toquei pensando nele. 

E foi tão bom, e eu pensei que eu queria tanto que ele me tocasse, que nós ficássemos tão próximos, fisicamente mas também, mentalmente. Caramba, eu fui longe.

Logo depois me senti um lixo, uma pessoa horrível. Eu sentia nojo de mim mesma. Como eu posso transformar um sentimento que parece tão puro em algo assim? É uma merda ser tão carente, ter tantos hormônios e pensamentos tão embaralhados.

Em algum momento eu devo ter cochilado, acordei assustada. Era 5h da manhã. Logo ia fazer 24hrs que aconteceu...

Calma. Respira. Perdi o sono.

Me levanto. Faço café. Tomo ele sem açúcar. Vou para o terraço e fumo um dos cigarros que furtei dos meus pais. Logo me acalmo e vejo a cidade amanhecer. O nascer do sol. 

O que fazer num domingo de manhã, no qual você poderia/deveria dormir até tarde?

Eu não tinha nada para fazer. Exceto lavar louça e dever de casa, mas são coisas chatas que eu quase nunca faço.

Visto uma legging, uma camiseta larga e tênis. Faço um rabo de cabelo, pego meu celular e fones. Saio de casa.

Coloco a música e começo a correr. 

Corro como se todos os pensamentos ruins e acelerados demais pudessem sair da minha mente. Corro até meus pulmões e pernas arderem. Apenas corro sem rumo.

Chega um momento, no ápice da música "R.I.P. to My Youth" do The Neighbourhood que eu quero gritar, então eu grito. Não tão alto quanto eu gostaria, mas o suficiente para a vizinhança acordar e fazer perguntas.

Mudo minha rota e volto para casa. 

Uma hora se passou desde que eu sai. Estou exausta. Abro o portão de casa e me jogo no sofá. Lá adormeço.

***

Acordo num pulo. O barulho da campainha faz meu coração acelerar e de repente estou tremendo, não sei porque. Respiro fundo.

Poderia ser apenas mais um vizinho chato.

Abro a portão de casa e meu coração que estava acelerado, gela, e volta a bater ainda mais rápido. Na minha frente tem um par de olhos escuros que eu conheço e outro par de olhos mais claros e mais baixo que eu desconheço, mas que ambos são bem parecidos. Thomas e seu irmão, suponho.

- Bom dia! -Diz o garoto de olhos castanhos claros, baixinho, parecido com Thomas. -Você deve ser a garota que o Tom gosta. Prazer, eu sou o Tyler! 

O garotinho estendeu a mão animado, com um sorriso de orelha a orelha. Fiquei paralisada e olhei para Thomas. Ele estava todo corado e era bem visível, já que ele tinha um tom de pele bem claro. Tinha o olhar baixo e sua mãos no bolso.

- Desculpa, Lily. Eu juro que tentei te avisar, mas você não respondeu minhas mensagens. -Suas bochechas pareciam ficar cada vez mais vermelhas. -Esse é meu irmão, Ty.


Uma vida vazia [COMPLETO]Waar verhalen tot leven komen. Ontdek het nu