Capítulo 37

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Charles

O dia clareou e me levantei calmamente, observando as paredes escuras do meu quarto que, de alguma forma, junto ao calor do aquecedor, me traziam conforto.

Apesar de odiar viver no inferno, sempre fui encantado pelo ambiente escuro e quente onde cresci, mas nunca suportei estar rodeado por aqueles seres que, em sua maioria, eram desprezíveis e tornavam um belo mundo num lugar horrível.

Então, para não me sentir tão deslocado quando abandonei meu pseudo lar, tentei trazer um pouco do inferno para este quarto.

Não que eu seja um simpatizante aos humanos, na verdade, os considero patéticos, ainda sim, sempre preferi o mundo deles para viver. Por isso, num certo momento da minha vida, decidi abandonar o inferno e construir uma casa no mundo dos mortais. Uma casa isolada e distante o suficiente para que eu não precisasse conviver com nenhum mundano e, quando isso aconteceu, pela primeira vez na vida, eu me sentia em casa.

Observando agora, torna-se quase insuportável lembrar que eu nunca havia trago ninguém para essa residência por desejar que ela fosse exclusivamente minha. Me recusava, até mesmo, dividir a existência dela com medo que alguém estragasse de alguma forma a sensação boa que o ambiente me trazia.

E hoje, além de Blair, tenho que dividir meu lar com uma humana escandalosa e um maldito anjo.

Revirei os olhos.

...

Estava descendo as escadas, após um banho quente e relaxante, mas franzi o cenho ao chegar no último degrau e encontrar Blair e sua amiga na cozinha, preparando o café ao som de uma música alta e animada. As duas pulavam, dançavam e jogavam os cabelos como loucas. Se encontravam tão distraídas que nem me viram chegar.

Ouvi um ruído sútil e virei o rosto na direção do som. Era o anjo descendo a escada e parando ao meu lado.

Nos encaravamos com desgosto e eu sentia vontade de esfola-lo, mas as risadas vindas da cozinha roubaram nossa atenção e ambos olhamos para elas que continuavam dançando sem notar nossa presença.

Blair tinha uma vasilha e uma colher nas mãos, remexendo alguma coisa dentro do recipiente. Ela pulava sem parar, fazendo seu vestido amarelo rodar.

Ao lado, sua amiga loira cantava terrivelmente mal, fazendo um garfo de microfone com uma mão e gestos com a outra.

Foi impossível não sorrir e, após um longo tempo distraído com aquela animação incomum, ouvi a voz do anjo.

- Humanos são estranhos. - comentou. Encarei-o rapidamente, notando que também sorria, mas logo voltei meu olhar para Blair. - Porém, não há como negar que eles tem certa graça.

Eu não sabia responder se todos os humanos tinham graça dentro de si, inclusive, duvidava muito que fosse verdade. Mas Blair, definitivamente, tinha toda graça do universo nela.

- Talvez. - respondi sem conseguir tirar os olhos da minha humana.

Quase ao mesmo tempo, Blair olhou em nossa direção e nos viu, parando imediatamente a dança engraçada. Seu rosto ficou vermelho como um tomate e o sorriso cresceu no meu.

Ela tentou fazer sinais para que sua amiga parasse também, mas a loira não ouviu e continuou seu pequeno espetáculo com o garfo.

Cansei de ficar na escada e caminhei em direção a cozinha. O anjo acompanhou meus passos entre risos com o olhar vidrado na tal Serena.

Quando a musica terminou, a loira se virou com tudo, dando fim ao show e de cara com o anjo que a observava atentamente. Ela arregalou os olhos de uma forma hilária e digna de uma foto. Não aguentei presenciar toda aquela vergonha alheia e gargalhei involuntariamente. Serena se virou para mim com ódio no olhar.

IncubusOnde histórias criam vida. Descubra agora