nós pertencemos ao coração um do outro

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— Ei, ei — chamo sua atenção ao dar batidinhas nas suas costas. — Noah? Tá tudo bem, tudo bem, meu anjo... Calma, não precisa chorar...

Meu Deus, o que faço agora? Ele não para de chorar.

— Noah? — chamo de novo. — Tá doendo alguma coisa? Precisa de alguma coisa?

Ele finalmente me larga, mas está fungando sem parar. Eu odeio vê-lo chorar, embora faça parte do pacote de ter Noah na minha vida. Queria fazer algo para ajudar, mas não sei o que fazer. Estou perdido. Completamente perdido. Enxugo seu rosto com as minhas mãos, só que não adianta, porque ele continua a chorar. Por que ele está chorando, afinal? Era para estarmos rindo agora. Eu jurava que iríamos rir à beça hoje.

— O que foi? — olho-o diretamente nos olhos. — Hm? Me diz... Estou preocupado com você.

— Você já fez isso para alguém outra vez? — fala com tantas pausas em meio ao choro que eu demoro horrores para entender.

— Não... — nem tenho chance de acrescentar alguma informação, porque ele literalmente se senta nos próprios calcanhares e se curva sobre meu colo. — Jesus, Noah! Me diz o que houve, por favor!

Nada. Ele apenas está chorando no meu colo enquanto aperta minha coxa esquerda. É possível escutar seu choro, porém acho que está se segurando para não ser muito alto. Não para de fungar e receio que venha ter soluços. Acaricio sua nuca bombardeado de apreensão, estou perdido. Me inclino para beijar seu cabelo repetidas vezes, com o intuito de acalmá-lo mais. Eu não sei o que devo fazer. De repente, me agarra pela cintura e espreme o rosto contra meu abdômen.

— Obrigado, Josh! — exclama com fervor, ainda fungando. — Ninguém nunca me dedicou nada. Desculpa por isso, eu só...

— Meu bem, sério... — seguro seu rosto com delicadeza e faço-o olhar-me nos olhos. — Para de chorar, por favor.

— Desculpa, desculpa... Não teve muitas pessoas que fizeram coisas legais para mim na minha vida. Ninguém nunca me teve como inspiração, ninguém nunca me dedicou nada — sua voz está trêmula e falha, por isso me esforço em dobro para entender o que diz. — Eu sempre fui esquecido, não me sinto especial para quase ninguém. Por muito tempo senti que ninguém gostava de mim. Sabe como é isso? Sentir que ninguém, nem mesmo você, gosta de ti? E então você se sentir um ninguém? Sentir que, se morresse no dia seguinte, no máximo iriam cinco pessoas se despedir e prestar condolências? Desculpa por chorar assim, é que eu não consigo acreditar que realmente existem pessoas que realmente gostam de mim. Que você gosta de mim. Me desculpa, Josh, me desculpa...

— Ei, respira fundo... — tiro o cabelo da sua testa e lhe dou um beijo bem no meio. — Não pensa nessas coisas, tá bom? Sempre que isso passar na sua cabeça... Lembra disso, tá? — puxo suas mãos e as seguro firmemente sobre meu colo. — Eu tô aqui por você. Não precisa lembrar dessas coisas, tá bom? E pode acreditar, eu realmente gosto de você. Vou fazer qualquer coisa para cuidar de você. Sabe por quê? Porque nós pertencemos ao coração um do outro. Você está sempre ao meu lado, e eu quero estar sempre o seu lado também. Você não está sozinho, tem a mim e também tem seus amigos. Agora se levanta, vamos comer, você precisa saber quão gostoso é o prato...

— Obrigado, Joshinho — ainda fungando, ele se ergue e vem me abraçar. Um abraço longo e profundo. — De verdade, obrigado por tudo. Não faço a mínima ideia de como posso retribuir.

— Ame-se, cuide de você mesmo, faça bem a você mesmo. Essa é a maior retribuição que eu poderia ter. Pode fazer isso?

Ele concorda ao balançar a cabeça.

— Pronto, pronto... Passou — acaricio sua nuca com delicadeza. — Melhor?

— Sim, obrigado — me dá um beijo na bochecha. — Você é incrível.

— Você que é — enxugo seu rosto de novo e não sei se é errado pensar isso, mas até chorando ele fica bonito e fofo. — Vamos comer? Não chore mais, chega de chorar. Vamos comer.

Uma risadinha anasalada é tudo que sai dele, daí ergue-se e volta a se sentar do outro lado da mesa. Ele respira fundo, pega os talheres e não tira os olhos do prato.

— A apresentação está ruim? — questiono.

— Não, está ótimo — corta o filé com uma lentidão maçante.

Aperto minhas mãos uma na outra, aproximo do queixo e espero o momento em que ele irá comer. Espero. Inicialmente, come o frango, no instante seguinte ele come o bokki. Espero. Levemente e rapidamente ergue as sobrancelhas e pisca algumas vezes. Solto um suspiro ao vê-lo mastigar olhando o prato, as pálpebras ainda inchadas pelo choro de agora. Gosto de ver sua mandíbula trabalhar, assim como gosto de observar como seus olhinhos ficam grandes e brilhantes enquanto ele come. Amo vê-lo comer.

— O que achou? — questiono, para que acabe logo essa tortura.

— E eu preciso dizer algo? — ele ri ao cortar mais o frango. O queijo vai juntinho e eu digo com convicção de que essa é uma das melhores imagens que já vi. — Você é incrível!

— Jura?

— Está muito bom! E foi muito bem pensado, a propósito... Você tem as melhores ideias e as coloca em prática perfeitamente. É fenomenal! Te amo tanto, Josh... — sobre a mesa, captura minha mão e acaricia com zelo. — Te amo tanto, tanto mesmo... Você é uma pessoa incrível, incrível mesmo... Você... Poxa, eu nem sei como dizer...

— Está tudo bem — eu sorrio, daí me inclino para beijar a mão dele que segura a minha. — Sinto o mesmo em relação a você.

— Eu amo amar você. Sinto-me bem. Sinto que respirar é a melhor coisa do mundo. E que se eu morresse no dia seguinte, daria um jeito para passar nem que fosse um diazinho a mais com você.

— Eu fico tão sem graça quando você diz essas coisas, sabia? — conto com sinceridade. — Nunca sei o que responder.

— Não precisa responder. Eu só quero que você saiba.

Levemente inclino a cabeça e lhe dou um outro beijo na mão. Peço para que coma, e então ambos entramos num ritmo. Eu amo vê-lo comer, porque ele fica distraído demais. Eu estou amando isso daqui, essa luminosidade baixa, a musiquinha clássica que Joel colocou pra tocar antes de sair e que só agora me dei conta... Tudo está perfeito demais. Porém, levanto após lembrar que acabei esquecendo do vinho.

— Uh, Noah... Eu tenho um vinho feito na vinícola Domaine Dujac! — apresso-me para ir à adega pegar o vinho que eu queria muito que ele experimentasse.

— É um Morey-Saint-Denis? — me pergunta lá do salão.

Passo os olhos pelas garrafas de vinho, porém sei que deixei ele guardado lá no final. Ponho a mão na garrafa do qual eu acho que é e, após checar o rótulo, percebo que é ele mesmo. Acho que Noah vai amar.

— Não! — lhe respondo. — Mas, só pra você saber, sua pronúncia está perfeita.

Saio da adega com a garrafa e rapidamente apareço no salão do restaurante.

— É um Clos De La Roche Grand Cru — lhe conto, parando ao lado da mesa para servir ambas taças.

— Ano?

— 2005.

— Uh, estou animado... — esfrega as mãos com excitação.

— Eu sei — rio da sua expressão cheia de expectativas e me sento após servir.

Ambos seguramos nossas taças e brindamos a nós. E eu, que sempre achei jantares românticos uma das coisas mais bregas do mundo, de repente me desfaço e me remonto em meio às exclamações e comentários do quanto ele gosta de uvas pinot noir. Mas não mais que eu, ainda acrescenta. Não consegue gostar de nada com a mesma veemência que gosta de mim.

crises et chocolat  ✰  Nosh  ❖  Now UnitedWhere stories live. Discover now