1. Want it?

2.8K 207 317
                                    




Quando o alarme do celular dispara, eu levo um baita de um susto e o rímel que deveria focar somente na parte das pálpebras, se arrastam pelo resto da minha pele, transformando o meu rosto em uma obra de arte escura e abstrata. Abro a boca, uma, duas vezes ao ver minha cara toda manchada de preto.

– Não, não! – falo comigo mesma.

O som estridente que denunciou que meu tempo tinha acabado, arruinou todo o meu trabalho paciente e meticuloso em cobrir os pelos claros dos meus olhos com uma camada preta de máscara para cílios.

No meio da minha bagunça, saio desesperada atrás de uma toalha limpa, mas o que me resta é o papel higiênico. Enrolo uma grande quantidade na mão, batendo os dois pés no chão ao ver o tempo passando com mais velocidade que o normal. Deixo um pouco de água umedecer o papel e limpo todo meu rosto, que fica todo vermelho com a força que faço para tirar tudo rapidamente.

Ao colocar os meus óculos e conseguir enxergar melhor o horário no meu celular em cima da pia, a ansiedade toma conta de cada célula em meu corpo.

Atrasada.

Minha primeira meta no dia de hoje era ser mais pontual, mas, infelizmente, a tentativa foi fracassada.

Enfio a torrada que eu tinha deixado de lado para poder focar no rímel dentro da boca e desisto de tentar colocar a presilha no cabelo.

Meu cabelo está solto e selvagem, caindo em cachos dourados além da minha cintura, deu bastante trabalho para deixá-lo definido, mas meus esforços foram em vão porque um fio ou outro encaracolado saía do lugar.

Coloco os materiais dentro da mochila azul pastel em cima da cama e olho a minha própria roupa.

Um short largo, branco como o tênis e um suéter com listras claras de tecido fino da mesma cor que a mochila. Finalmente, uma oportunidade para usar todas as milhares de roupas que eu comprei pela internet, mas não tinha confiança em usá-las.

Apesar de ser tentador, não me olho no espelho de corpo inteiro antes de sair do quarto, porque tenho a absoluta certeza que iria me olhar, iria ver que não sou que nem as garotas magras que com certeza ficariam melhores nessa roupa do que eu, iria trocar e me enfiar em calças compridas e um moletom que escondesse todas as minhas dobras e meus braços que não são finos do jeito que eu sonhava que fossem.

Não dessa vez.

Estou em uma cidade nova, tenho a oportunidade de começar tudo do zero, do jeito certo. O ano perfeito para fazer com que as coisas fossem diferentes, fazer amizades, talvez conhecer garotos e minha maior ambição: tentar entrar para o grupo de líderes de torcida no ensino médio.

Será diferente dessa vez.

Esse ano será o meu ano.

Eu sinto isso... Ou talvez o meu otimismo estaria atrapalhando minha visão para a realidade. Mesmo que exista a grande probabilidade de estar me iludindo, vou fazer o meu melhor para sobressair nesse novo colégio, ser uma Lola diferente da Lola de Bordeaux.

Ouço o barulho do carro dando partida enquanto desço as infinitas escadas da casa nova e o desespero aumenta.

– Diane... – sussurro e meus neurônios conseguem fazer a ligação, saio gritando aos berros:– Diane! Diane!

Tarde demais.

Corro até a entrada da casa e o conversível prateado da minha irmã mais velha já tinha escapado do meu alcance, deixando, além de mim, poeira pra trás.

– Logo no meu primeiro dia! – choramingo vendo a bunda do carro dela desaparecer no horizonte.

Tento ligar para Diane, mas cai na caixa postal.

Teoria da Serendipidade [CONCLUÍDO]Where stories live. Discover now